A semente entre espinhos

Sermão pelo Rev.Elmo Acton

"E outra caiu entre espinhos, e os espinhos cresceram, e sufocaram-na. (...) É o que houve a palavra, mas os cuidados deste mundo, e a sedução das riquezas, sufocam a palavra, e fica infrutífera.

(Mateus 13:7,22).


O Senhor é o semeador, a semente é a verdade de Sua Palavra, e a terra é a mente humana. Nesta parábola, vimos que a primeira espécie de recepção foi demonstrada pelas sementes que caíram ao pé do caminho, e vieram as aves do céu e as comeram. São as pessoas que não têm afeição nenhuma pela verdade revelada e logo a rejeitam como coisa inútil. Elas se recusam a receber qualquer coisa que não possa ser demonstrada de forma a satisfazer o raciocínio dos sentidos, ou que possa dar algum resultado material concreto. De fato, elas recebem os conhecimentos da verdade na memória - representada pelo pé do caminho - mas sua razão, cheia de princípios individualistas, pervertem o conhecimento, isto é, as aves do céu o devoram.
A segunda espécie de recebedores reconhece e aprende a verdade, mas somente por alguma afeição natural por algum proveito próprio e, assim, quando perdem de vista esse proveito ou benefício imediato, falsificam e finalmente negam a verdade. As sementes da verdade caem em terrenos pedregosos, onde não há terra bastante e, por não terem raízes, secam-se. Com esta espécie existe apenas uma afeição natural pela verdade, quer dizer, eles recebem a verdade da Palavra por causa de algum propósito mundano e não para correção de suas vidas. Quando por isso surgem as tentações espirituais por causa da verdade, desistem delas e as falsificam em suas mentes. Deixam que o calor do sol do amor de si resseque e queime a vida dentro da semente da verdade.
A terceira espécie de recebedores, assunto de nosso sermão, recebe a verdade em seu pensamento e sua afeição externa, mas ao mesmo tempo não evitam os males e falsidades como pecados contra Deus, de modo que tais males e falsidades sufocam e matam os brotos tenros da verdade que começavam a despontar no homem externo. Os espinhos representam as falsidades que surgem dos males interiores.
A verdade repousa na mente da pessoa de acordo com as idéias, e as idéias da pessoa são ordenadas e arranjadas pelo amor que as inspira. Se, pois, a verdade é recebida e reconhecida pelo homem por causa de algum propósito mundano ou egoístico, as idéias que o homem formula a respeito da verdade irão gradativamente falsificar a verdade e destruir a vida ou bem dentro da verdade. O Senhor aqui exorta o homem para afastar as falsidades que provêm de seus amores pervertidos, se ele deseja preservar o bem da verdade começando a se desenvolver no homem externo, para que ela possa crescer, transformando-se em afeição espiritual da verdade e assim venha a dar o fruto da caridade espiritual.
Na parábola do semeador, a semente à beira do caminho representa a primeira recepção da verdade na memória - a recepção da verdade não por uma convicção individual, mas pela instrução e uma afeição por ela e uma confiança naquilo que ela ensina. Se alguém quiser fazer sua a verdade, deve ele mesmo adquirir a verdade pela leitura habitual e pela meditação, pois enquanto não fizer isso, a verdade não será dele; será apenas a fé de outro nele, chamada fé histórica.
Assim como a semente não cresce à beira do caminho, também a verdade nada produz se ficar apenas na memória. Precisa estar mais para dentro do terreno, precisa ser implantada no pensamento interior, por meio da reflexão e do estudo. O primeiro passo neste processo é elevar a verdade: da memória passá-la para o entendimento. E isto fazemos quando adquirimos idéias distintas, conclusões claras que apoiam o entendimento com a razão e a inteligência. Desta maneira, aquilo que é apenas do conhecimento torna-se um ponto de convicção intelectual em que a fé pode ser implantada; pois "ouvindo alguém a palavra do reino, e não a entendendo, vem o maligno e a arrebata de seu coração".
O segundo estado é descrito por aqueles em que as sementes caem em pedregais mas secam-se ao sol. Neste estado, a mente tem uma afeição externa ou natural da verdade que faz manifestar formas também externas de piedade e caridade, mas falta a afeição espiritual da verdade que a sustentará nos tempos de tribulação e tentação.
As pedras do terreno representam o entendimento do homem interno, endurecido demais pelos amores de si e do mundo, por isso impróprio para a recepção das sementes da verdade. Num campo assim, a verdade não pode crescer para atingir a maturidade e produzir frutos de bem espiritual, pois quando os amores egoísticos do homem interior entram em atividade, ressecam o campo do bem natural e matam de aridez a afeição natural, fazendo a verdade mesma ficar inativa e estéril para produzir qualquer bem genuíno.
"E outra caiu entre espinhos, e os espinhos cresceram, e sufocaram-na". Espinhos são falsidades que nascem da vontade pervertida ou hereditária cujos amores são o de si e o do mundo. Onde esses amores governarem não haverá lugar para a verdade genuína, pois a verdade contiuamente testifica contra esses amores. Como mero conhecimento, a verdade pode residir na memória externa da uma mente que é assim governada por amores irregenerados, mas nunca poderá, apenas na memória, dar frutos. Como um conhecimento apenas, a verdade pode existir na mente de qualquer pessoa, seja boa ou má, mas a verdade em si, que está no seio do conhecimento, só pode frutificar no solo bom e fértil de um amor bom.
A verdade em si é a Palavra vista na luz do Sol do céu. A luz do céu é a faculdade que o homem tem de ver a verdade, mas a luz precisa refletir em alguma coisa para ser vista. Ela precisa, por isso, dos conhecimentos da verdade, para fazê-los brilhar na mente do homem. Mas a simples presença desses conhecimentos na memória não quer dizer que a mente esteja na verdade. Os males e falsidades precisam ser removidos para que haja o influxo da verdade, a ação do Sol do céu, que faz sair a vida do interior da semente, vida que se manifesta em grãos e frutos dos usos espirituais.
Quando a verdade foi implantada na memória e dali foi elevada ao entendimento e, pela afeição natural, produz frutos de boas obras e atos de piedade, então os males e falsidades do homem interior precisam ser combatidos como pecados contra Deus.
O texto descreve em particular as pessoas que recebem a verdade, entendem-na e vivem por uma afeição natural. Mas em seguida, interrompem o processo, pois não permitem que a luz da verdade brilhe sobre os males e falsidades de seus pensamentos e afeições interiores. A verdade não pode, então, exercer o julgamento sobre tais males e falsidades e não os combate. Por isso, esses males e falsos provindo do homem interior crescem e sufocam as semente da verdade, fazendo-a infrutífera.
É dito que a pessoa negligencia o exame e o julgamento do mal por causa dos cuidados do mundo e a sedução das riquezas. O estado da mente descrito aqui não é de uma oposição às verdades, mas sim uma indiferença quanto às implicações e aplicações dessas verdades. Por causa dos cuidados do mundo e de uma absorção desordenada pelas coisas da vida externa, a pessoa deixa de prestar atenção à sua vida espiritual, negligenciando o exame e o julgamento dos males e falsidades em si, e estes crescem e sufocam sua vida espiritual. Pois quando o homem se acomoda com as coisas dos sentidos e do mundo ele se torna obtuso e estúpido nas coisas espirituais. Pode, ainda, manter uma vida externa de caridade e piedade, pode manter um aparente prazer pela doutrina espiritual, mas, por dentro, gerados e nutridos pelos maus amores, os espinhos da falsidade da vontade má crescem e, cedo ou tarde, destroem o bem da verdade.
A sedução das riquezas representa a busca dos bens mundanos como fins em si mesmos, ao invés de serem buscados por causa de algum uso bom e sábio. As riquezas do mundo seduzem e são enganosas porque aquele que as busca e as alcança pensa que foi abençoado pela Providência, e não compreende que seus males interiores estão devorando sua vida espiritual, e devorando até as bênçãos materiais que um dia irão para o túmulo juntamente com seu corpo.
Há pessoas que se convencem de que as bênçãos que o Senhor quer dar são as riquezas deste mundo e que a felicidade que Deus promete está na posse dessas coisas materiais. Elas acabam por não enxergar coisa alguma da vida espiritual, pois não combate os males como pecados contra Deus. Não sabem que a felicidade reside no interior do homem, e não nas coisas que estão fora dele. Não sabem que a verdadeira felicidade consiste em confiar na Providência do Senhor que proverá tudo o que for necessário, tanto espiritual quanto naturalmente. Não sabem que a paz e o contentamento só podem ser dados na medida em que a pessoa se afasta dos males interiores que bloqueiam o influxo da tranqüilidade da paz que vem do Senhor através dos céus. Estão realmente enganados, pois quando suas almas forem convocadas à existência eterna, para quem ficarão as coisas que ajuntaram?
A afeição espiritual da verdade é o único solo em que as sementes da verdade podem dar os frutos da genuína vida espiritual. E o texto da parábola ensina que a afeição espiritual da verdade é uma dádiva do Senhor. O homem não pode se constranger a ter afeição pela verdade. Todavia, na proporção em que evita os males como pecados contra Deus, o Senhor estabelece nele essa afeição espiritual, esse desejo por conhecer a verdade, o amor do bem da verdade, o deleite, a satisfação, as bênçãos e a felicidade que é percebida numa vida despojada de qualquer propósito egoístico e mundano, quando então as sementes da verdade nascem e geram frutos para a vida eterna.

Amém.


Lições: Mateus 13:1-17; Arcanos Celestes 5828.