A Santa Ceia

Sermão pelo Rev.Karl R.Alden

"Na verdade, na verdade vos digo que, se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o Seu sangue, não tereis vida em vós mesmos"


(João 6:53).


No decorrer do tempo, os cristãos deixaram de compreender o sentido genuíno das palavras do Senhor na última ceia. Os católicos ensinam que, quando o ministro pronuncia as santas palavras de consagração, ocorre um misterioso processo de transubstanciação do pão, que se torna realmente a carne de Cristo, e do vinho, que se torna o sangue derramado na cruz pelas chagas em Suas mãos e em Seu lado.
Martinho Lutero era um sacerdote católico e muitas vezes celebrou a comunhão da missa, como a Santa Ceia é chamada naquela igreja; ele não acreditava que o pão e o vinho, ao serem consagrados, sofressem qualquer mudança física. Tanto quanto ele podia saber, não havia qualquer transubstanciação: pão e vinho, continuavam com o mesmo sabor e a mesma aparência, não havendo qualquer mudança nesses elementos antes ou depois da bênção. Por isso, quando Lutero, num gesto de grande coragem, rompeu com a Igreja Católica e começou a reforma, ele o fez acreditando que o pão representava a carne, e o vinho representava o sangue, e é assim que geralmente se crê nas Igrejas Evangélicas de hoje.
Em contraste com isto, lemos em VRC, no capítulo sobre a Santa Ceia, estas importantes palavras: "Sem algum conhecimento das correspondências das coisas naturais com as coisas espirituais, é impossível saber quais são os usos e os benefícios da Santa Ceia" (678).
Sem o conhecimento da correspondência não se pode conhecer os usos e os benefícios da Santa Ceia. Nem a transubstanciação ensinada pela Igreja Católica, nem a valor representativo ensinado pelas Igrejas Protestantes são verdadeiros, pois é pela correspondência das coisas espirituais com as naturais que se pode aprender a respeito da eficácia, do sentido, do valor e da necessidade da Santa Ceia.
Uma dos aspectos da Segunda Vinda do Senhor foi a revelação da ciência das correspondências. A Nova Igreja recebeu essa chave preciosa que, juntamente com o conhecimento da genuína doutrina da letra da Palavra, abrirá os mistérios do sentido interno.
O que são as correspondências, em termos simples? Talvez se possa obter alguma idéia da correspondência quando se sabe que: "As coisas espirituais fazem para a mente o que as naturais que as correspondem fazem para o corpo". Correspondência é uma relação entre coisas que estão em graus discretamente diferentes. Esses graus nunca se misturam, mas sempre se relacionam em todos os planos da vida. A água corresponde à verdade, porque a água faz para o corpo o que a verdade faz para a mente. A água lava o corpo, a verdade limpa a mente. "Conhecereis a verdade", diz o Senhor, "e a verdade vos libertará".
A água sacia a sede, e da mesma forma, no plano da mente, a verdade responde às questões levantadas por nossa curiosidade ou nossa sede mental. Quando dizemos que estamos satisfeitos com uma resposta que recebemos, estamos dizendo que ela saciou nossa sede mental.
O fogo corresponde ao amor. O que o fogo pode propiciar no plano material, o amor também propicia para a mente. Com o fogo se pode cozinhar o alimento, que assim se torna mais facilmente digerível; também o amor prepara a verdade que realmente edifica a mente. Todo professor sabe que, se ele conseguir que os alunos gostem do assunto que está sendo ensinado, o conhecimento será recebido, assentar-se-á em suas mentes e se tornará parte do pensamento.
Assim, a lei que governa a doutrina das correspondências e que pode nos fazer entender a correspondência da Santa Ceia, pode ser resumida desta forma: "O que as coisas naturais são para o corpo, assim as espirituais que lhes correspondem são para a mente". O capítulo seis do evangelho de João parece ter sido escrito especialmente para expor esta doutrina. A fome natural é o primeiro tema deste capítulo - a fome de cinco mil pessoas no deserto. Disse Jesus: "Onde compraremos pão, para estes comerem?" "Filipe respondeu-Lhe: Duzentos dinheiros de pão não lhes bastarão, para que cada um deles tome um pouco". E André disse: "Está aqui um rapaz que tem cinco pães de cevada e dois peixinhos: mas que é isto para tantos?" Mas o Senhor mandou que se assentassem e ali os alimentou, e os discípulos ainda recolheram doze cestos de pedaços.
Este milagre foi feito para que ficasse estabelecida a correspondência que há entre os Seus ensinamentos, que nutriam a mente, e os peixes e pães, que nutrem o corpo. Qualquer um pode compreender a verdade deste milagre quando eleva a mente para o plano espiritual. Um professor a compreende logo, pois uma verdade que ele ensina pode ser imensamente multiplicada nas mentes de tantas crianças quantas se lhe trouxerem. E por que o Senhor mandou que os discípulos juntassem os pedaços que sobraram? Porque Ele queria que todos aqueles que ensinam também soubessem que, após dividir os cinco pães de cevadas e os dois peixinhos de seu conhecimento, sempre obterão no final mais conhecimentos do que eles mesmos tinham antes de iniciar o ensino. Não só a pessoa que está aprendendo fica instruída, mas também a que ensina. E são doze cestos no lugar de cinco pequenos pães e dois peixinhos.
Na manhã seguinte, ao ser procurado pela multidão em Cafarnaum, Ele lhes ensinou o real propósito de Sua encarnação, dizendo: "Na verdade, na verdade vos digo que Me buscais, não pelos sinais que vistes, mas porque comestes pão e vos saciastes. Trabalhai, não pela comida que perece, mas pela comida que permanece para a vida eterna, a qual o Filho do Homem vos dará." "Vossos pais comeram o maná no deserto, e morreram." "Eu sou o pão vivo que desceu do céu; se alguém comer deste pão, viverá para sempre"; e o pão que Eu der é a Minha carne, que Eu darei pela vida do mundo. Disputavam pois os judeus entre si, dizendo: Como pode dar Este a Sua carne a comer? Jesus pois lhes disse: Na verdade, na verdade vos digo que, se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o Seu sangue, não tereis vida em vós mesmos".
O que, então, a carne corresponde? É óbvio pela instituição da Santa Ceia que o Senhor não estava Se referindo à Sua carne física que eles viam, pois Ele tomou o pão e disse: "Tomai e comei; esta é a Minha carne". O pão é o sustento da vida, e o pão pelo que se dá graças corresponde ao Divino Amor. O Divino Amor edifica o caráter do homem assim como o pão edifica seu corpo. O Divino amor é a própria substância que forma o universo; é dele que o Senhor criou todas as coisas. O homem só se apropria desse amor quando guarda os mandamentos do Senhor, que disse: "Quem Me ama guarda os Meus mandamentos".
O Senhor ilustrou isto quando, certa ocasião, falava com uma mulher samaritana do poço de Jacob. Quando os discípulos retornaram da cidade, Ele lhes disse: "Uma comida tenho para comer, que vós não conheceis. Então os discípulos diziam uns aos outros: Trouxe-lhe porventura alguém de comer? Jesus disse-lhes: A Minha comida é fazer a vontade d'Aquele que Me enviou, e realizar a Sua obra". Semelhantemente, nosso caráter é erigido quando fazemos a vontade de Deus. Isto é o que representa comer a Sua carne, no sentido espiritual mais profundo.
Qual é, então, o significado de se comer o pão na santa Ceia? "Tomai e comei, este é o Meu corpo". Nosso anseio é que, assim como o pão natural que comemos torna-se parte real de nosso corpo, também o pão espiritual, que é Sua carne, que é Seu Divino Amor, possa ser recebido por nós e fortalecer nossa firme disposição de guardar Seus mandamentos.
E quanto ao vinho? "Este cálice é a nova aliança no Meu sangue". Seu sangue é a Sua Divina verdade. A Divina Verdade é o sangue que leva a vida a todo o universo. Sai do Senhor como uma fonte poderosa de vida, procedendo do coração do Máximo Homem e irrigando tudo e todos no universo. Sai puro e rico, com o nutrimento necessário para as almas humanas e vai pelas artérias até aos minúsculos vasos capilares, alcançando cada célula individual. E as células do Máximo Homem são os anjos do céu e os homens da Igreja. Passando pelo frágil entendimento humano, o sangue retorna novamente a Deus, subindo como as orações e o culto dos santos, elevando a Deus as esperanças e os desejos humanos purificados pela Sabedoria Divina, e novamente descem com renovado vigor.
Este, então, é o significado de se participar da Santa Ceia, tomar o pão e o vinho. Sem esse Amor e sem essa Sabedoria não pode haver vida espiritual alguma em nós, conforme Ele mesmo disse, simbolicamente, em Cafarnaum: "Se não comerdes a carne do Filho do Homem, e não beberdes o Seu sangue, não tereis vida em vós mesmos".

Amém.


Lições: João 6:1-21; 30-59.
VRC 678-679 e partes de 680.
Adaptado por C.R.Nobre