PALAVRAS DIVINAS E PALAVRAS HUMANAS

Sermão pelo Rev. J. Lopes Figueredo

Disse Jesus: As palavras que vos tenho dito são espírito e são vida


(João 6;63).

 

                        Para que possamos avaliar a importância das palavras, devemos considerar que há palavras Divinas assim como há palavras humanas e que há palavras nos céus assim como as há na terra.
A história da torre de Babel é o desenvolvimento negativo do uso de palavras neste mundo pelos integrantes da Primeira Igreja Antiga, levando-os a práticas funestas que os mergulharam no mal e na falsidade.
Para bem compreender isso, devemos procurar a interpretação dada ao episódio pelos Escritos da Nova Igreja. Que “ em toda a terra havia uma única linguagem” (1º versículo), significa que na Igreja Antiga havia apenas uma doutrina geral.
O fato de os integrantes daquela Igreja deixarem o oriente, onde há claridade do sol, para se radicarem na terra de Sinear, já demonstra a sua falta de obediência à única doutrina que lhes foi dada pelo Senhor.
Os versículos 2 a 4 desse capítulo 11 mostram claramente que houve total perversão daquela doutrina, de modo que já não havia sentido nas palavras pronunciadas pelos oficiantes do culto. Os ramos da Igreja Antiga (havia três ramos, segundo lemos nos Escritos) interpretavam a doutrina de maneira diferente, todos os ramos adulterando e falsificando a doutrina, de modo que os ensinamentos recebidos não coincidiam e perdiam toda sua autenticidade. A terra de Sinear, onde se estabeleceram os emigrantes e onde iniciaram a construção da torre, significa um culto externo profanado.
O fato de eles usarem tijolos em vez de pedras significa que eles substituíram as verdades, representadas pelas pedras, pelas falsidades significadas pelos tijolos. Também usaram em vez da argamassa o betume, o que significa que substituíram o bem do amor pelas cobiças do mal e pelas falsidades decorrentes. Há duas espécies de falsidades representadas pelos tijolos: a falsidade pela ignorância e a falsidade pela cobiça.
A falsidade pela ignorância não é tão perniciosa quanto a outra. A falsidade oriunda da ignorância deve-se à deficiência de instrução na infância, na adolescência ou mesmo à ausência completa de instrução sobre os comportamentos que devemos manter com Deus e com nossos semelhantes. Essa falsidade não é tão prejudicial como a proveniente das cobiças, desde que o homem não a confirme em sua vida.
Mas as falsidades das cobiças são oriundas do amor do eu e do amor do mundo. Elas são praticadas com o interesse de obter lucro ou glória pessoal, seja no exercício das funções que alguém executa, seja no comportamento mantido diante do Senhor e dos semelhantes. É o caso, por exemplo, de um sacerdote que transmita a doutrina apenas com o desejo de ser admirado. Isso se torna um culto profano, porque não tem o sentido de um culto ao Senhor; é um culto em proveito próprio. Este é que é o culto significado pela palavra Babel. O culto, porém, daqueles que estão na ignorância, mas que têm caridade e amor, esse culto é aceito pelo Senhor.
As palavras “ construamos uma cidade e uma torre, cujo topo esteja no céu” (versículo 4), significa construir uma doutrina (a cidade) e o culto de si mesmo (a torre). Quando a caridade para com o próximo abandona a Igreja, como no caso presente, o amor de si toma seu lugar, a doutrina da fé é toda voltada para o culto da própria personalidade, e nada é considerado santo senão o culto de si mesmo. Isto é o que é significado pela cidade e pela torre, isto é, pela falsa doutrina e pelo amor de si mesmo.
“ A torre ter o topo no céu” significa ter domínio sobre todas as coisas do céu e da terra. Esse é o desejo daqueles que amam a si mesmos mais do que ao Senhor e ao próximo. Desejam que todos se lhe submetam e tratam com rigor os que estão sob sua dependência. Os seus interesses estão acima de tudo. Todos os males resultantes desse exagerado amor de si, como ódios, vinganças, crueldades, adultérios são simbolizados por essa “torre cujo topo está no céu”.
“A confusão da linguagem” de que trata o versículo 7, se refere à falta da doutrina genuína. As pessoas que abandonaram a doutrina genuína ficaram perdidas na adoração de si próprias e das coisas do mundo. Os grupos se dispersaram e fundaram doutrinas diferentes, de que resultou que um não entendia a doutrina do outro. Como fundaram doutrinas religiosas concordantes com os interesses e os amores dominantes de cada grupo, é evidente que um grupo não podia compreender a linguagem de outro grupo, como lemos no referido versículo.
Finalmente, lemos no versículo 9, que a construção foi chamada “torre de Babel”. Já aludimos à significação dessas palavras. Elas significam o amor do eu e o amor do mundo. Do amor do eu, também chamado proprium do homem, fluem todos os males e, portanto, quando o amor do eu prevalece nas pessoas, os males estão nelas diversificados, pois concordam com as características do amor dominante em cada uma. As coisas sagradas contidas no culto ao Senhor, jamais se unem às coisas profanas do amor do eu. A afeição do bem e o reconhecimento das verdades vão abandonando o homem à proporção que nele progride o amor do eu e o amor do mundo. É por isso que não há culto ao Senhor nos homens que constroem a torre de Babel.
No livro Apocalipse Revelado, a Primeira Igreja Cristã é comparada à Babilônia ou Babel, por causa do amor da dominação e do amor das riquezas, que se desenvolveu através dos séculos. Mas, aqui, Babel significa o estado da Igreja Antiga ou Noética, cujo culto interno começou a perecer. Também os integrantes dessa Primeira Igreja Noética desejavam reinar sobre os outros ramos religiosos dela derivados e isso os levou a porem em execução o que disseram: “ Edifiquemos uma cidade e uma torre, cujo topo chegue até os céus, e tornemos célebre o nosso nome.”
Isso contribuiu decisivamente para a confusão da linguagem, isto é, confusão da doutrina dos integrantes dessa Primeira Igreja Noética e eles se tornaram, na maior parte, idólatras espalhados pela terra, por causa de seus falsos raciocínios.
Esses são os esclarecimentos, segundo os Escritos, sobre a significação do episódio relativo à torre de Babel, em que se verificam as situações prejudiciais a que somos levados quando fazemos mau uso das palavras, preferindo aplicar o seu lado negativo e, consequentemente, falsificando o seu sentido construtivo. Por isso o Senhor dispersou os construtores da torre de Babel.
Vejamos agora o outro lado da moeda, aquele que nos mostra o poder criador das palavras quando elas são empregadas com suas características positivas e que são, então, o instrumento do próprio Criador. Lemos no Evangelho de João: “ No princípio era o verbo (a palavra), e a palavra estava com Deus e a palavra era Deus. Todas as coisas foram feitas por seu intermédio e sem ela nada do que foi feito se fez.”. E, no mesmo Evangelho de João, encontramos as seguintes Palavras do Senhor: “ As palavras que vos tenho dito são espírito e são vida” (João 6;63).
As Sagradas Escrituras são constituídas pelas palavras pronunciadas pelo Senhor, quando esteve na terra, e por todos aqueles que foram Divinamente inspirados, desde Moisés até os discípulos. Sabemos que a Palavra contém a Divina Verdade do Senhor e que é por essa Divina Verdade que todas as coisas foram feitas. No versículo 14 do capítulo 3 do Apocalipse, lemos: “ Estas coisas diz o Amém, a Testemunha Fiel e Verdadeira, o Princípio da Criação de Deus”. O “Princípio da Criação de Deus” é também a Palavra, é a Divina Verdade, o que confirma que todas as coisas foram criadas por ela. (A.Rev. nº 200). A Palavra de Deus, em que está presente o Senhor, criou as galáxias, as estrelas, os planetas, os satélites e tudo o que neles se contém.
Quanto à criatura humana, a Divina Verdade esmerou-se, misericordiosamente, ao criá-la, dando-lhe instrumentos que a habilitam a reconhecer o Seu Criador e a amá-Lo. Deu ao homem o entendimento que lhe faculta compreender a verdade e deu-lhe a vontade para amar o bem.
O poder criador da palavra, dentro da nossa relatividade, foi transmitido pelo Senhor à criatura humana. Quando usamos palavras construtivas, sensatas e honestas e elas são recebidas fraternalmente pelos nossos associados em qualquer ramo de atividade, tais palavras possuem o poder criador de transformar idéias em ações e realizações.
Fomos criados para ser felizes, desde que pratiquemos o bem e vivamos de acordo com os ensinamentos da verdade. Mas, além disso, gozamos dos privilégios da racionalidade e da liberdade. Pela racionalidade e pela liberdade que nos foram outorgadas podemos transformar o bem em mal e a verdade em falsidade. Em vez de amarmos o Senhor sobre todas as coisas e de amarmos ao próximo como a nós mesmos, invertemos essa ordem e passamos a amar-nos sobre todas as coisas e a amar as coisas mundanas como a nós mesmos. Adulteramos as palavras do Senhor.
Julgamo-nos superiores e vamos então construir nossa torre de Babel, na qual prevelecerá o amor do eu, o amor pela superioridade de nossa própria inteligência. Assim, pois, a origem do mal está na racionalidade e na liberdade humanas mal aplicadas, ou aplicadas fora da ordem. E, de modo geral, a transformação do bem em mal e a transformação da verdade em falsidade são, atualmente, promovidas por intermédio dos meios de comunicação, isto é, por meio da palavra falada, da palavra escrita, por meio de códigos, de imagens televisadas, e por outros meios que a tecnologia de nossos dias vem oferecendo aos homens, mulheres e crianças.
Se, entretanto, desejarmos evitar essas influências negativas, se desejarmos aceitar as palavras de vida do Senhor, se pautarmos nosso comportamento pelas verdades que Ele nos transmite e pelos preceitos que Ele tão sistematicamente nos aconselha a seguir, se usarmos em nosso relacionamento com o Senhor e com o nosso próximo aquelas palavras construtivas que Ele nos ensina, então estaremos nos encaminhando para o destino que Ele nos reserva, estaremos caminhando para a felicidade eterna.

Amém.


Lições :
- Gênesis 11;1 a 9
- S.A. 240                 

*********************
S.A. 240
RACIONALIDADE E LIBERDADE NO HOMEM

                        Há no homem pelo Senhor duas faculdades pelas quais o homem é distinguido das bestas. Por uma dessas faculdades, ele pode compreender o que é verdadeiro e o que é bom; esta faculdade é chamada RACIONALIDADE e é a faculdade de seu entendimento. Pela outra faculdade ele pode praticar a verdade e o bem; esta faculdade é chamada LIBERDADE e é a faculdade de sua vontade. Pela RACIONALIDADE, com efeito, o homem pode pensar o que lhe agrada, tanto a favor como contra Deus, e pode pensar tanto a favor como contra o próximo. Pela LIBERDADE, ele pode querer e fazer tanto o bem como o mal, mas, por essa LIBERDADE ou por medo de punição, pode abster-se de fazê-los. Por estas duas faculdades, o homem é homem e se distingue das bestas. Estas duas faculdades no homem procedem continuamente do Senhor e não podem ser tiradas, porque, se fossem tiradas, seu humano pereceria. Nestas duas faculdades o Senhor está em todo homem, não somente no bom mas também no mau, elas são a morada do Senhor no gênero humano. O homem bom se aproxima do Senhor e o homem mau se afasta do Senhor, de acordo com a abertura de suas mentes.