Paciência

Sermão pelo Rev.Andrew James Heilman

 

"Na vossa paciência possuí as vossas almas"


Lucas 21:19.

Quantas vezes temos visto a necessidade de sermos pacientes -de não nos desgastarmos ou ficarmos preocupados a respeito de algo que está além de nosso controle... Nosso Pai celestial nos pede também a paciência, uma paciência espiritual que só podemos obter gradativamente, à medida que aumentarmos o entendimento do Senhor e a confiança nEle.
Vivemos no mundo do tempo. É fácil ser impaciente num mundo assim. Mas o Senhor é de eternidade a eternidade. Como Moisés escreveu em sua oração, mil anos à vista do Senhor são como o dia de ontem que passou. Por isso o Senhor é capaz de guardar a nossa saída e a nossa entrada, de hoje para todo o sempre. Em "Verdadeira Religião Cristã" os anjos explicaram esta natureza eternal do Senhor. Disseram eles que "Deus é Jesus Cristo, que é o Senhor JEHOVAH, de eternidade Criador, no tempo Redentor, e para a eternidade Regenerador; assim, Aquele que é, ao mesmo tempo, Pai, Filho e Espírito Santo; e este é o evangelho a ser pregado" (n.26).
Visto que nos cabe esperar pacientemente no Senhor, como Ele requer de nós, precisamos então saber donde Ele vem, onde Ele está em nossas vidas e para onde está nos conduzindo. As qualidades do Senhor -Criador desde a eternidade, Redentor no tempo, e Regenerador pela eternidade- devem estar unidas a fim de formarem uma visão singular e completa do Senhor Jesus Cristo, em Quem depositamos nossa confiança.
Primeiro, consideremos nosso relacionamento com o Senhor como o Pai e Criador desde a eternidade. Consideremos as pessoas que buscam felicidade no casamento. Elas devem visar ao Senhor e nEle confiar. Precisam ver que o verdadeiro amor do casamento vem do interior, do Senhor mesmo, pela vida de religião. Desce do céu como o casamento do que é bom e verdadeiro, e não se origina em valor, encanto, riqueza ou prazer naturais. Se não visarmos ao Senhor como a verdadeira fonte de amor e felicidade, estaremos fadados à frustração e à impaciência. O casamento envolve, evidentemente, duas pessoas, e ambas devem ter esta confiança e paciência no Senhor.
Consideremos o semeador que planta o grão, e como precisa ter paciência para esperar que o grão cresça até o tempo da ceifa. Na verdade, o Senhor compara o reino do céu a um homem que semeou a semente na terra, e, enquanto o homem dormia, a semente cresceu, primeiro produzindo a haste, depois a espiga e finalmente a espiga cheia de grãos. E, na parábola do semeador, o Senhor compara a boa terra àqueles que "ouvindo a Palavra, a conservam num coração honesto e bom, e dão fruto com paciência" (Lucas 8:15).
Quando vemos nosso Senhor como o Criador de tudo o que é bom, podemos, como o semeador, ter paciência em Seu poder infindo para prover nossas necessidades naturais e espirituais.
Isto não quer dizer que o Senhor proverá qualquer coisa que Lho pedirmos. De fato, a impaciência vem quando aplicamos nossos corações em algo que não é bom para nós mesmos ou para os outros. Como se lê no Salmo (37:7-9): "Descansa no Senhor, e espera nEle; não te indignes por causa daquele que prospera no seu caminho por causa do homem que executa astutos intentos. Deixa a ira, e abandona o furor; não te indignes para fazer o mal. Porque os malfeitores serão desarraigados, mas aqueles que esperam no Senhor herdarão a terra".
Se virmos que estamos ficando impacientes por não conseguirmos aquilo que desejamos, precisamos nos perguntar se isso que queremos concorda com o que nosso Pai e Criador quer prover. Pode-se conseguir coisas más, evidentemente. Até coisas boas podem ser alcançadas por meio de propósitos maus, mas, com o tempo, virão a dar em nada. Prosperidade e honra podem ser bênçãos, dadas àqueles que seguem ao Senhor e vivem um vida de uso. Mas se a prosperidade e a honra são tidas como fins em si mesmos, se pusermos nosso coração na riqueza e na fama, essas mesmas coisas irão se tornar maldições. Em Sua Providência, o Senhor às vezes nos deixa fracassar quando estamos lutando por metas mundanas ou pessoais, assim como se fosse um apelo a que busquemos coisas mais elevadas, mais espirituais em nossas vidas. A impaciência e a preocupação podem nos lembrar de que podemos bem estar voltados para a direção errada. Como nosso Criador, o Senhor influi com o bem; a semente crescerá, se tiver sido bem plantada e cuidada.
Precisamos esperar pacientemente em nosso Senhor como nosso Pai celeste e Criador desde a eternidade. Pois Ele nos fez, Ele conhece a nossa qualidade e sabe o que é bom para nós. A nós Ele proverá do Seu amor e sabedoria, e é nisto que todo anjo sente eterno contentamento.
Isto não quer dizer, porém, que devemos apenas sentar e ficar sem nada fazer, ou que devemos sorrir e mostrar uma face feliz diante de tudo o que acontece, dizendo que  tudo é a Providência de Deus. Lembremo-nos do semeador. Sim, ele confia em Deus. Sabe que é o Criador que provê o sol, a chuva e o a terra para fazer a planta crescer. Quanto a isto, ele pode esperar pacientemente no Senhor. Mas isto que dizer que nada mais faz, apenas senta e espera? Sua vida é cheia de trabalhos. Deve limpar a terra, cultivar o solo, plantar o grão, de vez em quando fertilizar e até irrigar o campo; e, na colheita, terá de trabalhar muitas e longas horas. É sua obra um sinal de impaciência? Não, muito pelo contrário: é em seu labor que vemos sua paciência.
No livro do Apocalipse é esta espécie de paciência que vemos descrita naqueles que serão da Nova Igreja do Senhor. João chama a si mesmo de nosso irmão e companheiro de tribulação, e no reino e paciência de Jesus Cristo. E ao anjo da Igreja de Éfeso foi escrito: "Eu sei as tuas obras, e o teu trabalho, e a tua paciência, e que não podes suportar os maus... E sofreste, e tens paciência, e trabalhaste pelo Meu nome, e não te cansaste".
Se tudo fosse bom, se todas as coisas fossem como nosso Criador as fez e planejou que fossem, não haveria necessidade de luta ou dessa paciência descrita aqui no Apocalipse. O homem não teria sido maldito, o lavrador não teria de trabalhar a terra pelo suor de sua fronte. Mas no Senhor há misericórdia, e nEle há plena redenção. Em relação à nossa espera em paz e contentamento por todos os bens que o Senhor nos concede, Ele é nosso Criador de eternidade.
Mas em relação à nossa paciência na luta e no trabalho árduo, o Senhor é nosso Redentor no tempo. Uma vez que o mal foi introduzido no mundo e em nossa natureza pela queda do homem, tornou-se essencial uma mudança para que haja a verdadeira felicidade e a vida eterna. Foi para este fim que o Senhor veio ao mundo e tomou o Humano. Ele Mesmo combateu os infernos e glorificou Seu Humano, e por este processo redimiu a raça humana. Sem tal intervenção Divina, não seria possível mudança alguma.
Consideremos também algo que está envolvido no casamento, a saber, que o casamento é muito mais do que apenas esperar pacientemente pelo Senhor para prover amor e felicidade. Há muito trabalho a ser feito, tanto antes quanto durante o casamento; trabalho de nos prepararmos para receber o amor genuíno, o que se faz evitando o orgulho da própria inteligência, o desejo de dominar e as cobiças e pensamentos lascivos. Também há que se nutrir e proteger a amizade íntima e a confiança, se se quiser que o casamento avance para a maturidade e produza as bênçãos do amor verdadeiramente conjugial. Nesta obra, precisamos ter paciência para enfrentar as lutas e tentações que teremos de suportar. E durante esse tempo o Senhor nosso Redentor estará presente conosco, dando-nos a força de que precisamos. O Senhor, como o Criador desde a eternidade, sempre poderia influir com o bem e a verdade, assim como o sol dá sua luz e calor a todas as plantas. Mas essa luz e calor do sol não podem modificar um solo rochoso, duro e infestado de espinhos para transformá-lo em solo fértil. É o lavrador, por um trabalho duro e paciente, que o pode.
Da mesma maneira, o Senhor teve de vir ao mundo e tomar o humano repleto de mal hereditário, e, com Seu próprio poder divino e paciência, expulsar esses males e glorificá-lo. Por semelhante processo Ele redime a raça humana. Isto levou tempo na vida do Senhor, e leva tempo também em nossas vidas. Na verdade, é por esta razão que nós, assim como Senhor, nascemos no mundo do tempo-e-espaço. Ainda que mil anos sejam como ontem à vista do Senhor, mesmo assim precisamos pedir a Ele que nos ensine a contar os nossos dias para que alcancemos corações sábios. Ainda que o Senhor seja nosso Criador desde a eternidade e nosso Regenerador para a eternidade, Ele é nosso Redentor no tempo -no tempo que Ele passou em nosso mundo, e no tempo que neste mundo também temos de passar.
Neste mundo há seis dias de trabalho e um de descanso. Grande parte de nossa vida passamos em lutas, em trabalho árduo, em tentações espirituais, mas isso pode ser suportado com paciência. Como o Senhor disse aos Seus discípulos:"Lançarão mão de vós e vos perseguirão... e serão odiados por todos por amor do Meu nome; mas não perecerá um único cabelo de vossa cabeça. Na vossa paciência possuís as vossas almas".
Na verdadeira paciência deve haver confiança na Providência do Senhor, a fim de que Ele, como nosso Criador de eternidade, possa prover o que realmente necessitamos. E para que haja, também, força para suportar os combates que temos de enfrentar nesta vida, a força que somente o Senhor pode nos dar. Pois Ele veio ao mundo e em Sua vida aqui foi vitorioso nos combates espirituais e assim redimiu da morte as nossas almas.
A paciência, porém, requer algo mais que confiança e força. Requer esperança. Também com esperança aguardamos pacientemente no Senhor, mas agora como nosso Salvador e Regenerador para a eternidade. Porque a paciência genuína e a esperança que traz consigo não visa o futuro próximo e nem mesmo o futuro distante. A preocupação indevida com o futuro gera ansiedade, mas a paciência genuína vê além, a vida eterna e a felicidade celeste, num reino sem tempo, sem infortúnios e sem tentações.
A maior parte dos que vão para o céu deixam este mundo num estado que os Escritos chamam de reforma, um estado de luta e combate, estado em que devemos nos constranger a seguir a verdade do Senhor. Mas os Escritos nos dizem que, se começamos o processo de reforma, isto é, se tivermos começado a mudar nossas vidas de acordo com a orientação do Senhor e nos conservarmos nesse novo caminho, seremos regenerados após a morte. Poderemos ter ainda de passar por algumas situações difíceis no mundo dos espíritos, mas, finalmente, nasceremos de novo como anjos do reino eterno do Senhor.
Consideremos, por exemplo, o marido e a esposa agindo juntos com a esperança e o anseio do amor conjugal. Grande parte de seu tempo passado juntos terá sido gasto somente para fazer coisas para a família e para outros por um sentido de obrigação, sem o sentimento da alegria interior que desejam. Haverá tempos de discordância, de tentação e até de frieza. Mas a promessa e a esperança do casamento eterno lhes dá a paciência para continuarem. Se se removesse a idéia de eternidade (do casamento), cada cônjuge cairia, infeliz, considerando o casamento com desânimo. No entanto, com o pensamento de que seu casamento continua após a morte, são reavivados pela esperança (ver Am.Con.216).
Ou consideremos o que aconteceria se o lavrador não visasse além (do trabalho) a colheita e a alegria quando esta chegasse, mas ficasse apenas pensando no seu trabalho, no árduo labor e nas tarefas a serem cumpridas. Facilmente ele perderia a esperança no que faz.
Se em nossas vidas pensamos apenas em fazer o trabalho e perseguimos o sucesso e o prazer terrenos, iremos notar que ficamos impacientes, com pouco sentido ou esperança na vida. Como um anjo declarou no livro do Apocalipse: "Aqui está a paciência dos santos; aqui os que guardam os mandamentos de Deus e a fé de Jesus".
A isto uma voz respondeu do céu: "Bem-aventurados os mortos que desde agora morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, para que descansem de seus trabalhos, e as obras os sigam".
Tendo sido redimida, a pessoa humana pode agora ser gerada de novo como filho de Deus. Cessam a angústia, o sofrimento da tentação, as dúvidas e os infortúnios. Os maus amores que pelejavam por dominar são postos de lado e tomam o seu lugar a paz e a felicidade. Este é o estado celeste que o Senhor nos promete se tivermos a paciência dos santos, observando os mandamento do Senhor e tendo fé em Sua Divindade, e se vivermos nossas vidas não para nossa própria glória mas para a glória do Senhor.
Mesmo se não viermos a receber este estado bem-aventurado neste mundo e tivermos de esperar por ele no porvir, nem assim devemos ser impacientes nem perder a esperança. Porque, embora devamos ser redimidos no tempo, combatendo contra males neste mundo, a regeneração e a salvação são para a eternidade.
Talvez a mais importante e mais consoladora das mensagens que nos são dadas nos Escritos é esta:
Há Alguém em Quem podemos pacientemente esperar pela salvação; que proverá nossas necessidades, fortalecer-nos-á em nossos labores e nos dá a esperança de uma felicidade eterna. É Jesus Cristo, o Criador desde a eternidade, o Redentor no tempo, e o Regenerador para a eternidade. E, como disse o anjo, este é o evangelho, as boas novas, que deve ser pregado.

Amém.


Salmo 37,40,130, AE 813
Também: Salmo 33 (oração); VRC 26; Am.Con., Lucas 21.
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Traduzido por C.R.Nobre