“Não me escolhestes vós a mim...”

Sermão pelo Revmo. Bispo Peter Buss
“Não me escolhestes vós a mim, mas eu vos escolhi a vós, e vos nomeei, para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto em meu nome pedirdes ao Pai ele vo-lo conceda. Isto vos mando: Que vos ameis uns aos outros”.


João 15:16,17

O Senhor proferiu estas palavras aos Seus discípulos, que eram os primeiros ministros de Sua Igreja Cristã.  Eles levantaram o assunto da “ordenação” – indicar pessoas para uma tarefa especial e prepará-las para ela.  Nesta manhã, um homem foi ordenado no primeiro grau do sacerdócio. Ele não escolheu esta obra. O Senhor o escolheu, indicou e preparou, para que ele possa dar frutos em sua obra para a Igreja do Senhor.
Mas estas palavras se aplicam a todos nós. Nenhum de nós escolhe o Senhor.  Ele nos chama. Ele organiza nossas mentes – e isto é “ordenação” – para que possamos dar fruto em nossas vidas de uma maneira especial, para que possamos conhecer nosso Pai celestial.
Estas palavras ocorrem no meio do discurso de despedida do Senhor dos discípulos, antes de Sua prisão e crucificação.  Foi um discurso longo, estendendo-se por quatro capítulos no evangelho de João.  O que talvez é mais notável é a freqüência – quase continuamente – com que Ele fala de Seu relacionamento com Seu Pai. Mais de quarenta vezes do capítulo 14 até ao 16 Ele menciona “o Pai”, e o capítulo 17 inteiro é uma oração ao Pai.
Na Nova Igreja, sabemos que o Pai não é separado do Filho de Deus. Jesus Cristo é Deus, e o que Ele chamava “Seu Pai” era Sua própria Alma – Seu infinito ser. Quando fala do Pai, Ele está Se referindo ao Divino amor. Quando fala de si mesmo na terra, ou o filho, Ele quer dizer a verdade que vem do amor.  No íntimo, a verdade e o amor são um, porque a verdade é a linguagem do amor. Mas nós as vemos separadamente.
Nesse discurso de despedida, por isso, ele queria deixar clara maneira segundo a qual a humanidade, dali em diante, iria encontrar seu Deus:  como encontramos Seu amor e sentimos o poder desse amor. Nós experimentamos esse amor somente através de Sua verdade – o Filho de Deus.
Ele começou dizendo que deixaria Seus discípulos. “Mesmo vós sabeis para onde vou, e conheceis o caminho”. Tomé lhe disse: “Senhor, nós não sabemos para onde vais; e como podemos saber o caminho?” Foi quando Jesus pronunciou estas palavras, tão bem conhecidas em todo o mundo: “Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim”
Ninguém conhecerá o verdadeiro amor no futuro, a não ser através desta verdade. Mesmo aqueles que não têm a Palavra. Mesmo aqueles que não possuem a palavra – milhões incontáveis de pessoas que não conhecem o cristianismo, pessoas que são boas e que entrarão no céu – finalmente chegam ao amor verdadeiro através do aprendizado desta verdade, no outro mundo.
Esta é a grande mensagem do Advento do Senhor. A raça humana perdeu seu rumo. Não conhece o amor. Precisa ser ensinada novamente a amar. A única maneira de voltar ao homem hoje é através da verdade que o Senhor nos dá. Somos convidados a olhar no interior desses livros e ouvir neles o Senhor dizendo:  “Este é o caminho. Esta é a Verdade. Esta é a verdadeira vida. Se quiseres algum dia amar, aqui está o caminho do amor”.
E, todavia, o que Filipe disse em resposta a Jesus: Ele disse: “Senhor, mostra-nos o Pai, e isto nos basta”. No sentido interno, ele está perguntando: “Onde está o amor? Não podemos sentir o amor. Mostra-nos o amor, e então seremos felizes”.
Não nos vemos, na Igreja, dizendo isto também? Se tão somente pudéssemos ter o amor – imaginamos – não teríamos de nos preocupar com a verdade. As coisas se ajeitariam por si mesmas.
O que Jesus respondeu? “Estou há tanto tempo convosco, e não me tendes conhecido, Filipe? Quem me vê a mim vê o Pai; e como dizes tu: Mostra-nos o Pai?”
A verdade é a linguagem do amor. Temos de admitir que nem sempre ensinamos desta maneira, mas na Palavra mesma, a verdade é a linguagem do amor. Se realmente a compreendermos, veremos o Pai – da mesma forma que, quando entendemos Jesus Cristo, vemo-Lo como nosso Deus, o Pai de eternidade, o Príncipe da Paz.
Três vezes nesse discurso o Senhor nos mandou amar uns aos outros. A terceira vez é em nosso texto básico. Mas, observemos as duas primeiras: “Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como Eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis. (João 13:34).  “O Meu mandamento é este: Que vos ameis uns aos outros, assim como Eu vos amei”  (João 15:12).  Será que as pessoas daquela época não sentiam que elas estavam amando umas às outras há muito tempo? Mas não estavam. Este era um mandamento novo, desconhecido antes de Ele lhes ter falado. Tinha-se perdido o amor. As pessoas apenas pensavam que amavam.  Ele veio à terra para lhes mostrar como amar. “Que vos ameis uns aos outros, assim como Eu vos amei”.
Algumas vezes nós também pensamos que sabemos amar. Mas o amor é uma arte perdida. Pode ser restaurada a cada um de nós somente através das verdades que há neste livro. “Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim”
Assim o Senhor nos convidou para que nos tornássemos seus amigos. O Senhor Deus do céu e da terra aprouve nos elevar da condição de servos à de amigos. Um servo apenas obedece, não sabendo o que o seu amo se propõe.. “Já vos não chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho feito conhecer”.
Este é o critério da amizade: Ele nos dirá Sua verdade – a verdade que Ele profere, proveniente do amor. Se ouvirmos e entendermos, conheceremos o que Deus tem como propósito. Seremos seus amigos, trabalhando juntos com Ele em prol de Seu intento, que é a felicidade para todos os Seus filhos. Mas se quisermos essa amizade, isto será por meio das verdades que falam do amor (AC 51; AE 409:10).
Isto nos traz de volta à ordenação:  “Eu vos escolhi a vós, e vos nomeei (ordenei)”. Cada um de nós é chamado para desempenhar usos especiais aqui na terra.
A grande romancista inglesa Jane Austen escreveu um livro intitulado “Mansfield Park”. Ela disse que o livro tratava da ordenação. De fato, o herói tornou-se um ministro, mas não era isto que ela queria dizer. O herói e a heroína eram dois jovens que tinham sido criados num lar em que seus sentimentos eram guiados por princípios cristãos e regras de ordem e retidão. Eles procuravam seguir aqueles princípios a despeito de quaisquer conseqüências. Algumas vezes isto era muito difícil para eles, assim como o é para todos nós. Aconteceu de entrar em suas vidas um irmão e uma irmã que eram atraentes, amigáveis e talentosos.  Tragicamente, porém, suas mentes não eram organizadas – ordenadas – por nenhum princípio. Por isso eles se viam jogados de um lado para outro entre sentimentos bons (que eles freqüentemente almejavam) e sentimentos egoísticos, e cada um desses sentimentos destruía uma felicidade muito real que poderia ter sido deles. Os sentimentos mais gritantes prevaleceram e o verdadeiro amor se perdeu. “Ninguém vem ao Pai a não ser por Mim” – através das verdades que falam do amor.
Como as verdades do Senhor ordenam a mente? Quando as aprendemos, há uma conexão perfeita e direta entre elas e o amor de Deus que lhes deu expressão. Foi esta conexão que o Senhor manifestou na terra: “Eu estou no Pai, e o Pai em Mim”, Ele disse. “As palavras que Eu vos digo não as digo de mim mesmo, mas o Pai, que está em mim, é Quem faz as obras”. O amor faz a obra, mas a verdade mostra o caminho.
Sempre que aprendemos uma verdade da Palavra, o amor do Senhor pode estar dentro dela. É este amor que, influindo, ordena as verdades que aprendemos, dispondo-as num lugar apropriado em nossas mentes. É este amor que, influindo, dá poder às verdades -  poder para apaziguar nossas emoções mais destrutivas, poder para colocar nossos sentimentos numa perspectiva, poder para sair e ajudar os outros. “Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço, e as fará maiores do que estas, porque eu vou para meu Pai”.
O desafio da Nova Igreja é voltar as vistas para os livros da Palavra e ver ali o amor falando: ver amor nos ensinamentos sobre o céu – ou sobre o inferno; ver amor nas leis da Divina Providência; ver amor nos muitos mandamentos e restrições que pertencem à lei Divina. Quando o Senhor diz: “Não farás” isso ou aquilo, é tal coisa não é amável para se fazer. Nosso desafio é compreender que não nos é possível inventar uma espécie de amor que o Senhor mesmo não descreve. “Ninguém vem ao Pai, senão por Mim”. “Que vos ameis uns aos outros, assim como Eu vos amei”.
Aqueles que, dentre nós, crêem na Palavra do Segundo advento do Senhor não escolheram crer. O Senhor escolhe nos dar a fé. Agora ele oferece a cada um de nós a ordenação – uma organização de nossas mentes pelas verdades da Palavra. Na Palavra Ele nos tem dito todas as coisas que pertencem ao amor, convidando-nos para sermos Seus amigos, tomando parte como amigos Seus nesta obre de edificar de novo Sua Igreja Cristã.
Aceitemos o desafio que o Senhor tem posto diante de nós, o da ordenação. Permitamos que Suas verdades entrem em nossas mentes, e então busquemos sentir o amor que elas expressam. Creiamos que nosso Pai Celestial está nelas, inspirando-as com vida, ordenando nossas mentes por meio deles. Algumas vezes nós também podemos dizer:  “Senhor, nós não sabemos para onde vais, e como podemos saber o caminho?” Ou podemos dizer: “Senhor, mostra-nos o Pai” – enche-nos de Teu amor sem essa fatigante verdade, e então ficaremos satisfeitos. Mas este não é o caminho hoje. Hoje devemos aprender a amar.
Devemos aprender a amar: primeiro, aprendendo a verdade; depois, fazendo o que a verdade ensina. Mas Ele nos pede para acreditarmos que Seu amor está em cada uma das verdades, preparando nossa vereda, ordenando nossas mentes, para que “tudo quanto pedirdes em Meu nome Eu o farei... Isto vos mando: Que vos ameis uns aos outros”. Amém.

Lições: João 14:1-15; João 15:7-17; AC 3704; AC 6674:2,3.