OS ALIADOS INVISÍVEIS DA IGREJA

Sermão pelo Rev. W. Cairns Henderson

“Eliseu respondeu (ao criado): Não temas, porque
mais são os que estão conosco do que os que estão com eles”


(L. Reis 6;16).

                        Nos dias de Jeorão, rei de Israel (853-843), o rei da Síria foi com um exército conquistar Israel, onde morava, naquele tempo, o profeta Eliseu, homem de Deus, que recebia a palavra de Deus.

                        O rei da Síria procurava vencer os exércitos de Israel pela surpresa, caindo sobre eles inesperadamente. Mas Eliseu, sabendo pelo Senhor os planos do inimigo, foi a Jeorão e disse-lhe: “Guarda-te de passares por tal lugar, porque os sírios estão descendo para ali”. E, assim, os israelitas ficaram prevenidos, e os sírios não puderam surpreendê-los.

                        Quando o rei da Síria soube disso, pensou que estava sendo traído por alguém de seu próprio exército, que soubesse o que o rei pretendia fazer e fosse contar aos israelitas. O rei, porém, foi informado de que não havia qualquer traidor em seu acampamento, bem como foi cientificado de que era Eliseu, um profeta de Deus, que revelava os segredos dos sírios aos israelitas.

                        O rei da Síria mandou, então, uma força com carros e cavalos, para efetuar a prisão do profeta. Essa força chegou, durante a noite, à cidade de Dotã, em que estava Eliseu que, juntamente com seu criado, foi cercado pelos carros e soldados inimigos. E seu criado, ao levantar-se ainda muito cedo, viu que o local estava inteiramente cercado pela tropa inimiga. Então, o criado exclamou: “Ai meu senhor! Que faremos?” Eliseu respondeu-lhe: “Não temas, porque mais são os que estão conosco do que os que estão com eles.” Em seguida orou e disse: “Senhor peço-Te que lhe abras os olhos para que veja”. O Senhor abriu os olhos do criado e ele viu que o monte onde se encontravam estava cheio de cavalos e carros de fogo em redor de Eliseu, para defendê-lo e ao criado.

                        Orou, ainda, Eliseu, e pediu ao Senhor: “Fere, peço-Te, esta gente de cegueira”. E os sírios foram feridos de cegueira e se extraviaram, permitindo que o profeta e o criado escapassem sem ser molestados.

                        Um incidente um pouco semelhante é relatado no capítulo 19 do Primeiro Livro de Reis (2ª lição). Esse incidente ocorreu cerca de vinte anos antes, no tempo do rei de Israel, Acabe (876-853 a.C.). Elias, profeta que precedeu a Eliseu, triunfou  sobre quatrocentos e cinquenta profetas de Baal no monte Carmelo. O culto a Baal havia sido introduzido em Israel por Jezabel, a cruel e impositiva esposa de Acabe, a qual se casara com o rei de Israel por motivos políticos.

                        Para salvar sua vida, Elias teve de fugir para Judá. mas chegou ali desanimado, de espírito abatido e refugiando-se no deserto, pediu a morte, dizendo: “Já basta, ó Senhor, toma agora a minha alma, porque não sou melhor que meus pais”.

                        Na solidão em que se encontrava, extravazou suas queixas ao Senhor: “Tenho sido um extremo zeloso pelo Senhor Deus dos Exércitos, porque os filhos de Israel deixaram a Tua aliança, derrubaram os Teus altares e mataram os Teus profetas à espada; e eu fiquei só e procuram tirar-me a vida. O Senhor, depois de ordenar-lhe que ungisse Hazael como rei da Síria, acrescentou: “Eu conservei em Israel sete mil; todos os joelhos que não se dobraram a Baal e todas as bocas que não o beijaram”.

                        Nas passagens que registram esses dois incidentes, o Senhor fala à Sua Igreja em época de crise de fé, como a que existe no mundo de hoje, objetivando guiar a Igreja para uma perspectiva melhor. Uma apreciação realista do mundo em que hoje vivemos, no terreno da cultura e da religião, pode levar-nos à conclusão de que, no ocidente, esse mundo é, ao mesmo tempo, pagão e hebreu-cristão, prevalecendo acentuadamente a cultura hebraico-cristã, embora, no plano materialista, a tradição pagã influa largamente nos valores, objetivos e práticas dos homens modernos. E se nós apreciarmos esse mundo de hoje à luz dos Escritos, podemos concluir que ele está cheio de males. Tudo isso está compreendido em nossos textos.

                        Baal representa os amores do eu e do mundo; o culto de Baal representa a adoração dos amores e das coisas do homem natural. Jezabel, que levou da cidade de Tiro para Israel o culto de Baal, representa o mal que deseja destruir a Palavra do Senhor, representada por Elias. Especificamente, Jezabel representa aqueles que afirmam a salvação pela fé somente, aqueles que separam a caridade da fé. Eliseu, o profeta que sucedeu a Elias, representa o sentido espiritual da Palavra.

                        Quando consideramos a crise de fé que existe no mundo de hoje, voltamos nossa atenção para o fato de ser tão pequena ainda a Nova Igreja atual e como são implacáveis as forças que a combatem. Isso pode levar-nos ao desânimo de pensar que ela não terá forças para sobreviver num mundo que se afigura completamente hostil à implantação da fé e das verdades pregadas por sua doutrina.

                        Mas, se nós nos encontrarmos nesse estado, o Senhor desviará nossas mentes do desespero e da auto-piedade, assegurando-nos com as palavras ditas a Elias: “Conservei em Israel sete mil; todos os joelhos que não se dobraram a Baal e toda boca que não o beijou” e também com as palavras de Eliseu  ao criado: “Não temas, porque mais são os que estão conosco do que os que estão com eles”. Com tais palavras o Senhor nos assegurou que a vitória no final estava do nosso lado.

                        É fácil para nós presumirmos que estamos sozinhos contra o mal; que todos fora da Igreja são animados somente pelos amores do eu e do mundo e que todos os seus atos visam a alcançar o poder, o prestígio e a riqueza mundanos. Não é assim. Há, no mundo, milhares de homens e mulheres, somente conhecidos pelo Senhor, que não se submetem aos amores do eu e do mundo; que não entraram em conjunção com esses amores pela afeição e, portanto, não os cultuam; homens e mulheres que serão regenerados pelo Senhor senão neste mundo, pelo menos no mundo espiritual.

                        O que pensamos ser pequena é a igreja específica que nós vemos e à qual pertencemos, onde se reconhece o Senhor e se vive na caridade espiritual, de acordo com as verdades da Palavra. Mas esta é apenas uma parte da igreja universal do Senhor. Somos ensinados que a igreja universal do Senhor é distribuída por todo o mundo e é constituída por todos aqueles que reconhecem o Divino, vivem de acordo com sua religião e numa espécie de caridade. Seus membros autênticos são apenas conhecidos pelo Senhor, único a saber quem pertencerá verdadeiramente à Sua Igreja espiritual. Há pessoas más no mundo, mas também há milhares e milhares delas que pertencem à igreja universal: homens e mulheres que não têm a Palavra e não conhecem o Senhor como nós, mas acreditam em um Deus, obedecem à Sua vontade segundo compreendem e praticam uma caridade simples.

                        O Senhor está em conjunção com eles, ainda que diretamente, através do amor, da caridade e da obediência que eles demonstram. A igreja universal é, então, a força através da qual o Senhor está trabalhando para estabelecer Seu reino, mediante a crença em um Deus que revela Sua vontade aos homens e, ainda, mediante a crença na religião, na santidade do casamento, na moralidade, no decoro, na honestidade, na decência e na justiça. Devemos agradecer ao Senhor por nos dar esses aliados invisíveis para a batalha destinada a estabelecer o Seu reino na terra.

                        A igreja do Senhor, distribuída pelo mundo, tem a forma humana. À vista do Senhor ela se apresenta como se fora um homem, no qual a igreja específica é representada pelo coração e pelos pulmões, através dos quais a vida do Senhor flui para o resto do corpo, que representa a igreja universal. Portanto, a igreja específica e a igreja universal são interdependentes. Se necessitamos da igreja universal como suporte, ela também necessita de nós como fonte de sua vida.

                        Se nos fosse perguntado como a fé a vida da igreja específica poderiam sobreviver, a resposta seria que a fé e a vida dessa igreja podem aumentar agora neste mundo, dependendo do Senhor, que tudo pode. O poder do mal e do negativismo é realmente grande e parece fortalecer-se cada vez mais. Se estamos, porém, do lado da verdade do Senhor, quaisquer que sejam as aparências, “aqueles que estão conosco estão em maior número do que aqueles que estão com eles”. Temos outro aliado invisível no céu angélico, que está sempre pronto a preservar e proteger aquilo que pertence à Igreja do Senhor nas nossas mentes e corações. E os Escritos abrem nossos olhos para verem essa verdade, tal como fez Eliseu, que representa o sentido espiritual da Palavra, quando, com sua prece, conseguiu que os olhos de seu criado fossem abertos, para ver os exércitos angélicos do Senhor.

                        Nossa necessidade é de termos uma verdadeira perspectiva para vermos o mundo em que vivemos. Grande como ele é, o mal que nele existe é apenas uma parte do conjunto e, se olharmos apenas para essa parte, distorceremos a compreensão do todo. Como o criado de Eliseu, podemos encher-nos de medo e gritar: “Ai, meu  Senhor que faremos?”, dada a nossa incapacidade de ver os exércitos angélicos do Senhor. Mas, se virmos esses exércitos, nos capacitaremos de que a Igreja é do Senhor e não dos homens; nos convenceremos de que o Senhor preservará e protegerá o que há de verdadeiro em Sua Igreja, como tem feito até agora; e compreenderemos que nós, por nós mesmos, não podemos, com nossa prudência humana, responder pela continuação da Igreja; pois somos simples instrumentos do Senhor. Se nos dedicarmos fielmente aos usos que o Senhor põe diante de nós, Ele preservará e protegerá a Igreja, desde que nós a respeitemos. Ele preservará Sua Igreja agora e no futuro como fez no passado, mantendo secretamente em Israel os sete mil que não se ajoelharam diante de Baal nem o beijaram.

                        Também, no íntimo de cada criatura humana, o Senhor mantém secretamente os sete mil que não se ajoelharam diante de Baal nem o beijaram. Na mente de cada criatura, o Senhor armazena as relíquias do bem e da verdade, bem como as coisas derivadas dessas relíquias: inocência, amor, caridade, piedade e misericórdia. Essas relíquias não são corrompidas pelos amores do eu e do mundo, porque são ocultas no interior da mente, e não se apresentam , até que as coisas externas e mundanas tenham sido devastadas. Conservadas as relíquias, elas são os degraus iniciais de nossa ascensão para a vida espiritual. Quando começamos nossa regeneração, com a ajuda do Senhor, elas são os instrumentos de nosso progresso. Em presença dessas relíquias, os céus trabalham pela nossa salvação e o Senhor estabelece o Seu reino em nossos corações.

                        Tanto a Igreja quanto o membro da Igreja necessitam passar pela experiência dos estados de dúvida e até de desespero, e esses estados podem ser bastante agudos, se  isso for necessário para que alcancemos um genuíno amor pelo Divino do Senhor e pelas verdades espirituais da Igreja. Tais estados devem levar a criatura humana até aquele espírito quebrantado que constitui o sacrifício a Deus e o reconhecimento de que todo o amor e toda verdade vêm d’Ele. São estados de sofrimento a princípio, mas a confiança no Senhor tudo vence e eles são transformados em bençãos celestiais posteriormente.

                        Por outro lado, devemos rejeitar os estados de autopiedade e de desânimo, porque são estados negativos e ninguém pode prestar usos sob tais influências. Lembremo-nos de que a vida da religião é constituída pela prática de usos.

                        É bom lembrar, ainda uma vez, que a Igreja é do Senhor e, por isso, Ele a preservará e protegerá, tranferindo para nós, com Seu influxo, os usos que devemos praticar em Seu Nome, para que a vida do céu se manifeste na terra. O mérito desse trabalho, entretanto, é inteiramente do Senhor, como já acentuamos. Compete-nos aceitar essa verdade com humildade de espírito.

                        Nesse estado de humildade, que representa um progresso espiritual, já não nos cabe perguntar se o Senhor será bem sucedido na implantação de Sua Igreja na terra. O que devemos perguntar é se temos a paciência, a fé e a perseverança necessárias para partilhar de Sua ação vitoriosa. Se estivermos ao lado do Senhor vitorioso, se o nosso espírito estiver preparado para ver os exércitos angélicos do Senhor e perceber que eles são mais numerosos do que os exércitos adversários convencendo-nos, assim, da invencibilidade do Senhor, então seremos também vitoriosos, conduzidos pela mão poderosa de nosso Deus.

Amém.

 

Lições : 2 Reis 6;8 a 23
              1 Reis 19;1 a 18
              Doutrina da Escritura Sagrada nº 105

 

                                                                        Adaptação de J. Lopes Figueredo              

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DOUTRINAS DA NOVA JERUSALÉM SOBRE A ESCRITURA SANTA

AS IGREJAS DA TERRA CORRESPONDEM A UM CORPO HUMANO

 

                        Diante do Senhor, o céu universal é como um homem e assim também é a igreja universal. Que eles aparecem efetivamente como um homem pode ser visto no livro Céu e Inferno (nºs. 59 a 86). Nesse homem, a Igreja onde a Palavra é lida e o Senhor é reconhecido constitui o coração e os pulmões (é a igreja específica). O coração corresponde ao reino celestial e os plumões correspondem ao reino espiritual. Todos os outros membros e vísceras desse homem vivem por aquelas duas fontes de vida para o corpo e (esses membros e vísceras) correspondem a todos na terra que tem alguma espécie de religião, cultuam um Deus e vivem corretamente. Os que constituem os membros e vísceras subsistem e vivem pela conjunção do Senhor com o céu e com a Igreja por intermédio da Palavra. A Palavra na Igreja (específica), ainda que existindo comparativamente entre poucos, é a vida para os demais órgãos, vida que vem do Senhor através do céu, tal como a vida para os membros e vísceras de todo o corpo vem do coração e dos pulmões.