O ANTAGONISMO ENTRE O ORGULHO E A HUMILDADE

Sermão pelo Rev. B. David Holm

 

O fariseu, posto em pé, orava de si para si   mesmo desta forma: Ó Deus, graças Te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros, nem ainda como este publicano; jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de tudo quanto ganho.


(Lucas 18:11 a 13)

 

                        Na parábola de nosso texto está exposta a essência do orgulho humano e também a essência da verdadeira humildade - orgulho do fariseu e humildade do publicano. Esses dois atributos da mente humana estão em total oposição e, por isso, um não pode associar-se ao outro. Onde houver orgulho, a humildade será destruída, e onde existir humildade, não haverá espaço para o orgulho. Sendo assim, a parábola pode levar cada um de nós a fazer a seguinte pergunta, dirigida a si mesmo: Qual desses atributos é meu amor dominante?
Para termos uma idéia clara sobre o assunto, devemos preliminarmente saber que o orgulho aqui focalizado significa o sentimento de superioridade ou o estado preconceituoso que resulta do descontrolado amor do eu. Esse estado tem um sentido completamente negativo. Ele destrói nossa vida espiritual, pois repele Deus e remove o céu de nossos corações.
Num outro sentido, devemos compreender que o auto-respeito precisa ser considerado como um dos princípios da ordem. Ninguém pode ser um instrumento nas mãos do Senhor, se não tiver auto-respeito, pois seria então incapaz de preparar-se para executar os usos que o Senhor lhe atribuir. Esse auto-amor disciplinado não pode ser confundido com o "orgulho" do nosso texto.
No que se refere à humildade, ela é um dom proporcionado pelo Senhor, ao contrário do orgulho, que tem sua origem no inferno. No íntimo de cada um de nós se trava uma luta mortal entre esses dois adversários, vencendo aquele a que nós nos aliarmos. Permitiremos que o orgulho desordenado reine em nossa mente ou pediremos ao Senhor que instile em nossos corações a verdadeira humildade?
A humildade é o fator essencial em todo o culto, e sem ela não há adoração ao Senhor. O orgulho, ao contrário, nos afasta do Senhor e impede que recebamos o influxo Divino. O coração humilde é alimentado pelo amor vivificante do Senhor, e o coração orgulhoso é cheio do amor ressecado do eu. O publicano de nosso texto tipifica o coração cheio de humildade, e o fariseu representa o coração ressecado pelo orgulho. O publicano disse: "Ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador". O fariseu, por seu lado, orava em pé, demonstrando superioridade e descrevendo as virtudes  de que se julgava possuidor.
As palavras finais do Senhor indicam que somente a prece do publicano foi aceita: "Digo-vos que este (o publicano) desceu justificado para sua casa, e não aquele (o fariseu).
Quando nos comportamos como o fariseu, pensamos que somos superiores aos outros. Comentamos as faltas das pessoas que conhecemos e até das que não conhecemos, e jamais queremos tomar conhecimento das nossas próprias faltas, ocultando-as para que não sejam conhecidas.
Como já vimos, o publicano do texto significa aqueles que se encontram no estado de verdadeira humildade. Alcançamos esse estado quando percebemos a natureza terrível de nossos males interiores. Então nos sentimos em condições de inferioridade para aproximar-nos do Senhor e pedimos que Ele seja misericordioso conosco. Tomamos consciência de nossos males hereditários e atuais e percebemos que nada somos por nós mesmos. Em tais ocasiões usamos as mesmas palavras do publicano: "Deus, tem misericórdia de mim, pecador". É o estado da verdadeira humildade, aprovado pelo Senhor.
Enaltecendo as virtudes de que se julgava possuidor, o fariseu dava graças a Deus porque não era como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros, nem era igual ao publicano que estava próximo a ele. Desprezava o publicano pela insignificância que ele aparentava. Quantas vezes aconteceu conosco proceder como o fariseu da parábola? Sem percebermos, e às vezes propositadamente, procuramos exaltar nossas qualidades e diminuir as virtudes dos outros. Não é essa a verdadeira fonte do orgulho e do preconceito?
Se tivermos a infelicidade de adotar tal atitude de superioridade e de desprezo pelos outros, deveremos orar continuamente ao Senhor, pedindo Sua ajuda para livrar-nos de tal situação. Evitando tais males como pecados contra Deus, estaremos cooperando com o Senhor no trabalho de nossa regeneração.
O orgulho, que se apresenta sob as formas de arrogância, prevenção e preconceito, tem sua origem no amor do eu. Esse amor desordenado é o amor dominante de cada pessoa antes da regeneração. Ele encontra, em nossa mente, um sócio que se chama amor da própria inteligência e é constituído por um exagerado senso de auto-suficiência. A integração dos dois sócios é explicada nos Escritos, onde é classificada como o casamento do mal e da falsidade ou casamento do orgulho com o amor da própria inteligência. (Divina Providência nºs. 206 e 208).
Todos estão sujeitos a mergulhar, pelo menos ocasionalmente, no amplo oceano do orgulho, porque todos nascem com o amor do eu e outros males hereditários. Não se pode, entretanto, julgar os outros em tais circunstâncias, porque desconhecemos a origem de suas falhas. Além disso, algumas pessoas parecem humildes, mas interiormente são cheias de orgulho, enquanto outras parecem superiores e altaneiras, sendo, entretanto, interiormente humildes.
Uma das primitivas formas de orgulho é assumir o mérito do bem que praticamos e da verdade que nos orienta. É o comportamento comum da criatura humana desde a infância. Esse orgulho conspira constantemente contra nosso esforço de regeneração. Temos, entretanto, o conforto de saber que o Senhor remove gradualmente tal orgulho meritório e o substitui pela humildade, que faz com que atribuamos todo mérito ao Senhor.
Antes da regeneração, exigimos que nos seja creditado o mérito pelo bem que fazemos e pela verdade que aplicamos. À proporção que progredimos no caminho da regeneração, pelo aprendizado da Doutrina, concluímos que todas as coisas boas e verdadeiras são do Senhor, e que tudo o que fazemos e pensamos segundo o nosso proprium tem origem no hereditário mau com que nascemos e nas doutrinas espúrias que aceitamos. Assim, antes da regeneração, nossas preces não são dirigidas ao Senhor, mas a nós mesmos, pois então acreditamos que a fonte do bem e da verdade está em nossa mente. Isto é confirmado pelo nosso texto quando diz que "o fariseu, estando de pé, orava de si para si mesmo". Devemos prevenir-nos contra isso em nossas preces. Somente quando oramos com humildade, podemos ser ouvidos pelo Senhor, pois, como já vimos, a humildade é o fator essencial em todo processo do culto e da prece.
Quando damos graças ao Senhor por sermos Seu instrumento no bem que praticamos e sentimos que esse bem pertence a Ele, estamos sendo regenerados. Então, agimos segundo o nosso interno e nos voltamos para o céu e para o Senhor. Quando procedemos assim, nossa atitude está despida de qualquer orgulho e então podemos alcançar o estado de verdadeira humildade. É um estado de gratidão e de submissão diante do Senhor.
Não é demais insistirmos em mostrar a oposição entre os dois estados: o de orgulho e o de humildade. Cada pessoa que se regenera sente a luta entre esses dois estados. Às vezes, ela se incha de orgulho pela importância que supõe ter, mesmo durante o período de regeneração. Outras vezes, ela se dá conta de sua total dependência do Senhor e se humilha diante d'Ele. Esses exemplos mostram que os opostos se revezam segundo a situação mental da pessoa. É a luta entre o céu e o inferno, que tem como campo de batalha a mente da criatura humana.
As Doutrinas Celestes da Nova Igreja mostram as verdades profundas que funcionam como armas de combate aos males do orgulho. Devemos estudá-las e aplicá-las no combate a esses males que vulneram a nossa alma. Somente assim poderemos tornar-nos humildes e apresentar-nos ao Senhor como voluntários destinados à prática de Seus usos.
Uma perigosa forma de orgulho é alguém supor-se dotado de grande inteligência. Quando o amor da própria inteligência, a que já aludimos, faz ninho em nossa mente, ficamos convencidos de que somos superiores às pessoas com quem trabalhamos ou com quem convivemos. Julgamo-nos com a faculdade de ridicularizar aqueles cujas idéias estão em desacordo com as nossas. Entretanto, os Escritos nos ensinam que, quanto mais uma pessoa se persuade de sua superioridade intelectual, tanto mais se torna espiritualmente alienada (Diário Espiritual 4662).
Outro tipo de orgulho semelhante ao anterior é o preconceito. Não é difícil perceber que o preconceito tem origem numa presunção de superioridade. Pessoas, grupos, nações e raças desprezam outras pessoas, grupos, nações e raças, segundo o preconceito da superioridade de que se julgam dotados. À luz dos Escritos não há lugar para tal sentimento, pois cada pessoa é criada pelo Senhor para exercer um uso especial no Macro Homem que forma o céu.
Os tipos de orgulho que mencionamos são alguns dos inúmeros existentes, pois as variedades desses tipos são proporcionais às variedades de pessoas, grupos, nações e raças. Admitir, porém, que esse perverso sentimento possa destruir as Leis da Ordem que governam o universo é o mesmo que negar a obra do Criador, de Quem procede a vida que nos anima. Como contrapartida ao orgulho, o Senhor põe no coração dos homens a humildade, que lhes possibilita compreenderem suas limitações e reconhecerem sua dependência. Os humildes não exageram suas possibilidades e evitam os preconceitos e vaidades. Eles se sentem gratificados por realizarem, num universo de usos, a parte que lhes é atribuída pelo Senhor.
O orgulho, como acabamos de ver, é um dos mais sutis inimigos da espécie humana, e todos nós somos vulneráveis a seus ataques. Ele destrói nossa vida espiritual, pois repele Deus e remove os céus de nossos corações. Devemos lutar contra ele com todo o poder que o Senhor nos confere ao apelarmos para o Seu auxílio. O orgulho e a humildade não podem viver lado a lado em nossos corações. Devemos, sempre que formos atacados pelo orgulho, dirigir-nos ao Senhor e pedir-Lhe que nos conceda a verdadeira humildade e a força de que necessitamos para expulsar nosso perigoso inimigo.
Se agirmos com a humildade que nos for concedida, o Senhor certamente nos ajudará a vencer o inimigo, de acordo com a promessa contida em Isaías 57:15 : "Porque assim diz o Alto, o Sublime, que habita a eternidade, o qual tem o nome de Santo: Habito no alto e santo lugar, mas habito também com o contrito e abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos e vivificar o coração dos contritos".

Amém.

Lições : Lucas 18: 9 a 14
CI 555 a 557

Adaptação de J. Lopes Figueredo   

 

 

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