O Desejo pela Nova Igreja

Sermão pelo Rev. Kurt H. Asplundh
adaptado pelo Rev. Cristóvão R. Nobre

 

O último capítulo do Apocalipse, em seus versículos finais, nos faz um convite: "Vem!". "O Espírito e a Esposa dizem: Vem!. E quem ouve diga: Vem!"


(Apoc. 22:19).

 

Estas palavras expressam um anseio, um desejo profundo e urgente pela vinda do Senhor e pela instauração de Sua Igreja. Devemos orar para que a Nova Igreja venha, a Santa Cidade desça e se torne real, tanto em nossos corações quanto no mundo à nossa volta, pelos meios da Divina Providência, até que seja finalmente estabelecida em todas as nações da Terra.
A resposta que o Senhor dá a este desejo é: "Certamente, cedo venho". O sentido destas palavras não tem relação com o tempo, mas com a infalibilidade, a certeza. "Vir cedo" significa que o Senhor certamente virá (AR 944). Esta é a resposta às nossas orações. É a promessa da certeza de que a Nova Igreja descerá e existirá de fato onde quer que exista no mundo o anseio por ela.
Mas, quando olhamos à nossa volta, que realidade enxergamos? É certo que a Igreja ainda não foi recebida no mundo. A Nova Igreja é pequena em número. E às vezes as pessoas se perguntam por que, sendo seus ensinamentos tão claros e tão verdadeiros, falando diretamente ao racional do indivíduo, mesmo assim são tão poucos os que a aceitam? Muitos, ao observarem o crescimento lento da Nova Igreja, ficam desanimados ou preocupados.
No entanto, podemos entender melhor a razão para que essa lentidão se verifique no crescimento da Igreja quando consideramos a nossa própria aceitação, o crescimento da vida da Nova Igreja dentro de nós mesmos. Pois, não é verdade que as Doutrinas Celestes parecem ter pouco progresso na mudança de nossas vidas?
Se quisermos que a Nova Igreja cresça, devemos fazer com que isto aconteça primeiramente dentro de nós mesmos, cada um de nós. Para isso, devemos aprender a amar suas verdades e "estimá-las acima de qualquer bem do mundo" (AE 444). Isto é ilustrado na parábola que diz que o reino dos céus é "semelhante a um mercador que buscava boas pérolas e, achando uma pérola de grande valor, foi e vendeu tudo quanto tinha, e a comprou" (Mateus 13:45,46). A pérola que ele descobriu era-lhe preciosa mais do que qualquer outra posse. Para obtê-la, dispôs-se a vender tudo quanto tinha.
Essa "pérola de grande valor" é a afeição espiritual pela verdade. Quantos de nós estarão dispostos a renúncias para obtê-la? "Vender o que se tem" é abrir mão do amor de si, substituindo-o com o amor pela verdade.  Temos nós amor pelo bem e verdade da Igreja acima de qualquer outro bem do mundo?  Estaremos dispostos a renunciar às coisas que agora valorizamos e guardamos na vida como tesouros em nossas vidas, se assim a verdade da Igreja o exigir? O amor mesmo pela verdade é descrito na parábola pelo grande anseio do mercador para possuir a pérola de grande valor (AE 444:10).
Amar a verdade mesma e estimá-la acima de qualquer outro bem do mundo não apenas um pensamento abstrato. Tem aplicações definidas e práticas. Significa viver de acordo com a verdade, sacrificando talvez as coisas da vida que podem parecer boas aos nossos próprios olhos. Isto implica em que teremos de ser honestos conosco mesmo, sem nos permitir ilusões ou sonhos vãos, visões grandiosas a nosso próprio respeito. Isto implica em afugentar o desejo insidioso de saborear nossos pecados secretos. Implica em abandonar a tendência de engrandecer nossos próprios atos, exagerar a importância do que fazemos, a fim de impressionar os outros. Implica proibir a nós mesmos de escapar das responsabilidades a nós confiadas por meio de desculpas enganosas e raciocínios do falso.
É isto que significa amar a verdade e estimá-la acima de qualquer outro bem do mundo! E muito mais que isso. Num sentido positivo, significa desejo vivo e real de aprender a verdade; significa dedicar tempo e esforço para nossa instrução espiritual, ainda que isso custe abrir mãos de outras coisas boas que o mundo nos oferece. Se não temos tempo para ler a Palavra, como iremos conhecê-la e amar suas verdades?
Amar a verdade acima de tudo o mais não quer dizer, porém, que devamos impor essa verdade nos outros, nem que devamos transmiti-la de forma displicente e inadequada, nem onde isto não foi solicitado. Entretanto, devemos falar da verdade quando a ocasião se nos apresentar, e recusarmo-nos a seguir a multidão para falar ou fazer o mal.
Certa vez os discípulos se queixaram do Senhor a respeito das palavras que, como eles disseram, eram "duro discurso". Muitos judeus voltaram atrás porque não podiam aceitar essas doutrinas. Assim, também, há duros discursos nas Doutrinas Celestes que podem causar hesitação nas pessoas e talvez fazer com que voltem atrás. As pessoas que se ofenderam com as verdades do Senhor e voltaram atrás não foram chamadas de volta; o Senhor não foi atrás delas, porque não podia mudar as verdades de modo a satisfazer tais pessoas.
A verdade freqüentemente requer de nós atitudes novas e práticas novas, e por isso a recebemos com dificuldade, porque temos agido até então de forma contrária ao que a verdade ensina. Mudar atitudes e práticas é mudar a vida.
É por esta razão, e não por outra, que as Doutrinas da Nova Igreja não são facilmente recebidas. Não é porque não possa ser compreendida; não é porque é profunda; não é porque, necessariamente, seja mal explanada pelos seus ministros, mas simplesmente porque é contra coisas opostas que já tínhamos antes aceitado. Por conseguinte, a Igreja cresçe vagarosamente dentro de nós. Como é, então, que iremos querer que o crescimento externo aconteça de forma  diferente?
Toda esta dificuldade em fazermos com que a Nova Igreja se estabeleça dentro de nós é vivamente representada na imagem do Apocalipse, em que uma mulher envolta pelo sol gritava para dar luz. A mulher significa a Nova Igreja, a Noiva e a Esposa do Cordeiro. O filho homem que ela deu à luz significa a doutrina da Nova igreja. O nascimento doloroso significa a resistência que existe contra as Doutrinas Celestes.
Na mesma imagem viu-se um grande dragão vermelho que procurava destruir o Menino quando nascesse. Sendo frustrado em seu intento, o dragão passou a perseguir a Mulher.
Note-se que o dragão é uma espécie de serpente com asas, combinando as faculdades de rastejar e de voar. Os pássaros, na Palavra, significam os conhecimentos, porque têm a faculdade de voar. O dragão também, por essa faculdade, significa aqui os conhecimentos. Como dragões voando com suas asas, os conhecimentos têm a faculdade de se elevarem a si mesmos sobre a terra, mas preferem permanecer rastejando como serpentes. Tudo isto descreve o homem que permanece natural e sensual em atitudes, a despeito dos conhecimento espirituais que possui. Poderia se erguer acima de si mesmo, do mundo e de seus amores, mas prefere se arrastar nos sentidos e ambições da vida corporal e terrena.
Quando entendemos espiritualmente, "o grande dragão vermelho significa todos aqueles que são meramente naturais e sensuais pelo amor de si e que, no entanto, tem algum conhecimento da Palavra... pensam que são salvos pelos conhecimentos à parte da vida" (AE 714).
Muitas vezes os membros da Nova igreja aplicam os ensinamentos sobre o dragão do Apocalipse à precedente Igreja Cristã, com seus dogmas de salvação pela fé só, enquanto deixam de refletir que essa característica do dragão se aplica exatamente às semelhantes atitudes que estão presentes em cada um de nós.
O dragão atacou a Mulher e ao seu Filho. Isto significa o ataque à Nova Igreja. Não precisamos procurar muito nas doutrinas da Igreja Cristã para ali encontrarmos ataques e aposição à doutrina da Nova Igreja. Mas devemos admitir que esses ataques à Nova Igreja vêm, muitas vezes, de nós mesmos, de nossas ações contrárias às verdades espirituais. E aqui está, portanto, o nosso campo de combate. Ouçamos o que dizem os Escritos a este respeito (AE 714:6):
"Os sensuais que se entendem pelo dragão são aqueles que não vêem coisa alguma pela luz do céu, mas somente pela luz do mundo e, por esta luz unicamente, quando são inflamados pelo fogo do amor e de si e do orgulho, podem daí falar sobre coisas Divinas e raciocinar pronta e claramente sobre elas. Todavia, são incapazes de ver se tais coisas são verdadeiras ou não, chamando-as verdades porque se imbuíram delas desde a infância pelos mestres ou pregadores, e depois pela doutrina, tendo-se em seguida confirmado por algumas passagens da Palavra entendidas não interiormente. Como nada enxergam sob a luz do céu, eles não vêem as verdades, mas, em lugar delas, falsidades, a que chamam verdades...  Sendo tais, esses não amam outra coisa senão a vida corporal e mundana. E como os prazeres e as cobiças dessa vida têm sua sede no homem natural, os interiores deles são imundos e tomados por males de toda espécie, os quais fecham o caminho para o influxo de luz e calor do céu. Conseqüentemente, eles são interiormente diabos e satanases, por mais que possam parecer espirituais e cristãos por sua fala...".
Muitas vezes assumimos algumas verdades de que nos imbuímos há muito tempo e fechamos os olhos e as mentes para um entendimento mais interior da Palavra.
As Doutrinas da Nova Igreja nos foram dadas pelo Senhor para nos salvar dos enganos do amor de si e do mal, e por isso os infernos são contrários a que recebamos tais doutrinas.  O ataque do dragão é sutil, mas são ameaças internas à Igreja. Os infernos jogam com os males humanos do orgulho, amor do mundo, preguiça, lascívia, amor de si e outros. Esses amores são as armas do dragão. Se forem insinuados no homem e o homem se deixar levar por eles, acabarão por fechar, definitivamente, a recepção do influxo celeste no homem.
Será que daí não podemos ver as razões por que a Igreja cresce lentamente, e por que a mulher foi levada ao deserto e lá teve de esperar um tempo, dois tempos e metade de um tempo?  Porque, enquanto houver combate entre os amores  do homem e as Doutrinas Celestes, a Igreja estará somente com uns poucos. No plano do indivíduo, a Igreja estará implantada apenas em algumas áreas de nossas vidas, mas está oculta ou retirada de muitas outras áreas ou estados.
Nosso desejo é que o Senhor entre em nossas vidas, para mudá-las e conformá-las cada vez com Sua imagem e segundo a Sua semelhança. "Quem ouve diga: Vem!". Oremos para que a Igreja seja estabelecida em nós.
"O Senhor está presente em cada homem, urgindo para que seja recebido. Sua primeira vinda, que se chama manhã, é quando o homem O recebe, o que acontece quando o homem o reconhece como Seu deus, Criador, Redentor e Salvador.  A partir desse tempo, o entendimento do homem começa a ser iluminado nas coisas espirituais, e ele avança cada vez mais na visão interior. E quando ele recebe esta sabedoria do Senhor, ele avança da manhã para o dia, e este dia dura nele até à velhice, mesmo até à morte, e após a morte ele entra no céu e vai para o Senhor mesmo; e lá, embora tenha morrido velho, é restaurado à manhã de sua vida, e os rudimentos da sabedoria nele implantados no mundo natural aumentam pela eternidade." (VRC 746).
Lutemos para afastar para longe de nós todos os empecilhos que estiverem impedindo a recepção do Senhor; e permanecemos fiéis e pacientes, com a esperança certa do estabelecimento da Igreja entre muitos. Porque, se na resposta ao convite a que venha, o Senhor nos diz: "Certamente cedo venho",  a resposta a nossos desejos pelo estabelecimento da Nova Igreja é certa. "Ora vem, Senhor Jesus".

Amém.

Lições: AE 714:2,3
Apoc. 12:1-8,13,14