O GOVERNO DO SENHOR E O GOVERNO DO HOMEM

 

Sermão pelo Rev. J. Lopes Figueredo

"Escolheu Moisés homens capazes de todo o Israel
e os constituiu por cabeça sobre o povo".


(Êxodo 18;25)

                        Moisés, por ordem divina, escreveu a Lei ou a Torá como é chamada pelos israelitas, ou Pentateuco, como é chamada ainda hoje (palavra de origem grega que quer dizer cinco livros). Efetivamente, Moisés somente escreveu os cinco primeiros livros do Antigo Testamento, a saber Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deutoronômio.

                        É útil termos informação sobre a data em que foram escritos tais livros e sobre as razões que influíram para que eles tenham a atual designação. É tradicionalmente admitido que Moisés escreveu tais livros durante o período de tempo compreendido entre a saída do Egito, com os filhos de Israel, e a chegada à margem esquerda do rio Jordão, onde Moisés morreu, não lhe tendo sido permitido entrar na terra de Canaã. É geralmente aceito que a perseguição dos filhos de Israel pelo deserto e a elaboração dos livros de Moisés tenha ocorrido no final do século 13 antes de Cristo.

                        Todos os cinco livros da Torá têm sua designação em hebraico, mas essa designação somente é conhecida pelos estudiosos dessa língua. O primeiro livro, por exemplo, é chamado Bereshit.

                        Prevaleceu na designação dos livros de Moisés os vocábulos gregos que lhes foram atribuídos por ocasião da primeira tradução da obra do hebraico para o grego. Essa tradução foi realizada por setenta sábios da Alexandria nos séculos 3 e 2 antes de Cristo. Israelitas, gregos e, provavelmente, estudiosos de outras origens, em número de setenta, foram incumbidos de traduzir a Torá para o grego. Passou a chamar-se Pentateuco em grego e as cinco divisões que a constituíam receberam nomes gregos correspondentes aos nomes hebraicos.

                        Os nomes recebidos na língua grega foram Gênesis, Êxodo, Levíticus, Arithmós e Deuteronômio.
- Gênesis, todos sabemos, quer dizer origem.
- Êxodo quer dizer saída
- Leviticus é derivado do nome  masculino Levi, um dos filhos de Jacob, o qual deu origem à tribo dos levitas, que não teve direito a qualquer área de terra, na ocasião da partilha, porque os levitas já gozavam de situação privilegiada, pois eram os únicos incumbidos do ofício sacerdotal. O livro trata particularmente da regulamentação do culto.
- Número, recebeu esse nome porque trata da numeração (realização censitária) do povo de Israel por duas vezes, durante sua peregrinação: uma vez no Sinai e outra vez às margens do rio Jordão.
- Deuteronômio significa outra lei. Nele estão repetidas leis constantes dos outros livros, mas de modo diferente. Em vez de Jehovah falando através de Moisés, agora é o próprio Moisés, na primeira pessoa, que expõe a legislação a ser obedecida pelo povo. É uma espécie de atualização ou de modernização daquilo que figura nos livros anteriores.

                        Literalmente, o nome  Moisés significa aquele que foi tirado das águas, um nome que lhe foi atribuído, com toda a probabilidade, pela filha do Faraó, por ter ele sido salvo da corrente das águas do rio Nilo, às quais fora lançado, em uma cestinha, pela própria mãe, que usou desse recurso para impedir que seu filho fosse morto pelos Egípcios.

                        Por desígnio da Providência Divina Moisés foi salvo das águas por aqueles mesmos que tinham interesse em destruí-lo. Foi educado na corte do Faraó e preparado para a extraordinária missão de salvar o povo hebreu do jugo egípcio.

                        Já vimos o que significa o nome de Moisés no sentido literal. No sentido espiritual, Moisés representa o Senhor na fase em que teve de tornar-se Divina Verdade quanto ao Seu Humano. Moisés representa também, a Lei Divina, isto é, a iluminação pelo Senhor, segundo lemos no livro Arcanos Celestes nº 6753.

                        Compreende-se, assim, que Moisés tenha sido escolhido pelo Senhor para governar num grau finito o povo de Israel, assim como Ele, Senhor, a genuína Lei, a própria Divina Verdade, governa todo o universo por Ele criado no plano infinito.

                        Devemos notar, em nosso raciocínio, que não há governo sem lei. As sociedades, mesmo as que se dizem materialistas, são governadas por suas leis civis. As organizações altruístas e filantrópicas são governadas por leis morais e as dispensações religiosas obedecem às leis espirituais e celestiais que lhes são reveladas por Deus.

                        Na nossa lição da Palavra, Moisés, ainda inexperiente, foi aconselhado por seu sogro, Jetro, a escolher homens tementes a Deus, homens verdadeiros e honestos, que pudessem julgar e aplicar justiça. Não havia, ainda organização entre os hebreus e, se havia, era muito deficiente, pois eles peregrinavam pelo deserto. Aqueles homens julgariam as causas de menos importância e submeteriam ao juízo de Moisés as de importância relevante. Tal idéia foi extremamente proveitosa, pois sua aplicação resolveu da maneira mais satisfatória a realização do trabalho de que ele estava incumbido.

                        O sentido espiritual de alguns versículos de nossa lição, contido nos nºs 8683 e seguintes do livro Arcanos Celestes nos permitirá compreender melhor os ensinamentos da Palavra ocultos nos versículos da lição (versículos 13 a 27 do capítulo 18 do Êxodo).

                        Lemos no versículo 13: “No dia seguinte sentou-se Moisés para julgar o povo; o povo estava em pé diante de Moisés desde a manhã até o por do sol”. “Desde a manhã” significa o que é eterno. “Moisés sentou-se para julgar o povo” significa a disposição da Divina Verdade, que procede do Senhor em relação àqueles que estão na Igreja Espiritual num estado de verdade sem o bem. “E o povo estava sentado diante de Moisés” significa a obediência em concordância com a Divina Verdade, representada por Moisés. Consequentemente, “ficar em pé diante dele” significa consultar a Divina Verdade, esperar uma resposta dela e agir de acordo com ela, isto é, obedecer. “De manhã até a tarde” significa em cada estado, o que é fácil entendermos, porque “manhã” e “tarde” representam estados espirituais. Na outra vida, como sabemos, os períodos de tempo correspondem a estados de espírito.
Diz-nos o versículo 16: “E lhes declare os estatutos de Deus e Suas leis” significa que daquela fonte (Moisés) eles eram ensinados sobre a verdade e sobre o bem.

                        Também no versículo 23: “Todo este povo tornará em paz ao seu lugar” significa que aqueles que são da Igreja Espiritual poderão evolucionar para o bem e alcançá-lo.

                        O versículo que nos serve de texto diz: “Escolheu Moisés homens capazes de todo o Israel”. Isto significa a escolha da verdade que atrairá o bem para a ela unir-se, entre aqueles que estão na Igreja Espiritual.

                        O tema deste sermão é o governo do Senhor e o governo do homem. Entretanto, devemos lembrar-nos de que existe também o governo executado pelos anjos, principalmente no segundo céu (céu espiritual). O que logo nos ocorre ao raciocinarmos sobre isso é que tudo se reduz ao governo único exercido pelo Senhor, porque os governos realizados pelos homens e pelos anjos são aparentes. Aparência necessária, porque as criaturas são julgadas pelas obras que praticam e, se não apresentarem a execução de obras, não haverá parâmetro para julgamento.

                        Os governos executados pelos homens nas terras são diferentes dos governos executados nos céus, porque lá os governos variam de acordo com as qualidades dos anjos que compõem cada sociedade, e as sociedades, embora apresentem características iguais, variam de uma para outra e variam ainda mais quando elas pertencem a planos diferentes. Sabemos, pelos Escritos, que há três céus (céu celestial ou do 3° grau, céu espiritual ou do 2° grau e céu natural ou do 1° grau) distribuídos em dois reinos (reino celestial e reino espiritual).

                        O governo no reino celestial do Senhor é denominado Justiça, porque todos os anjos que lá habitam estão, pelo Senhor, no bem do amor do Senhor e tudo o que se faz segundo esse bem se chama Justiça. Esse governo é exercido diretamente pelo Senhor. Nenhum anjo discute lá sobre a autenticidade desse governo, porque todos têm consciência de que o Senhor é o Verdadeiro e Único Governador e a alegria deles consiste em viverem sob a égide do Senhor.

                        O governo no reino espiritual do Senhor é denominado Juízo, porque os anjos que habitam este reino estão no bem do amor ao próximo e tudo o que lá se faz segundo esse bem se chama verdade, porque a verdade pertence ao Juízo. O Senhor também governa os anjos que habitam o reino espiritual, mas o faz indiretamente através da Verdade que alimenta o amor ao próximo de que esses anjos são veículos. Eles ocupam diversos cargos e administram suas sociedades segundo as leis existentes. Nas coisas duvidosas, são todos esclarecidos pelo Senhor.

                        Se, voltando a pensar em nosso mundo, nos convencermos de que os usos que praticamos não são trabalho nosso e sim exclusivamente do Senhor; se admitirmos que não temos mérito algum no bem que executamos nas diversas atividades em que tomamos parte; se nos dispusermos a amar e honrar as pessoas pelos usos que elas executam e não pelas suas riquezas ou dons de persuasão; se o trabalho que executarmos for feito como um ato de amor para com o nosso próximo; então estaremos verdadeiramente aptos a executar trabalhos da importância dos que foram cometidos a Moisés neste mundo, bem como dos que são atribuídos aos anjos nos céus. Amém.

Lições : Êxodo 18; 1 a 26
              Céu e Inferno 387 a 390

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CI 387 a 390
As funções dos anjos nos céus

387.     As funções nos céus não podem ser enumeradas nem descritas em particular, mas pode-se dizer alguma coisa em geral, porque elas são inúmeras e, além disso, variadas segundo os deveres das sociedades; cada sociedade tem, com efeito, um dever a cumprir, porque as sociedades, distribuídas segundo os bens, são igualmente distribuídas segundo os usos, porque os bens em todos os habitantes dos céus são bens em atos, que são usos. Lá, cada um presta um uso, pois o reino do Senhor é o reino dos usos.

388.     Há nos céus, como nas terras, um grande número de administrações, porque há atividades eclesiásticas, civis e domésticas. Já falamos sobre as atividades eclesiásticas no céu nos nºs. 221 a 227 deste livro; sobre as atividades domésticas e sobre habitações e moradas nos nºs. 183 a 190; sobre as atividades civis nos nºs. 213 a 220; e sobre os casamentos nos nºs. 366 a 386. Por aí se vê que há um grande número de funções e de administrações dentro de cada sociedade celeste.

389.     Todas as coisas no céu foram instituídas segundo a Ordem Divina, que é observada em toda a parte pelos anjos por meio das administrações: os mais sábios administram as coisas do bem comum ou do uso comum; os que são menos sábios administram as coisas do bem particular ou do uso particular e assim por diante... A cada função é adjunta uma dignidade conforme à dignidade do uso. O anjo, porém, não atribui a si próprio a dignidade, mas a atribui ao uso inteiramente. Como o uso é o bem que ele faz e todo bem vem do Senhor, ele a atribui inteiramente ao Senhor. Aquele, pois, que pensa na honra para si e não para o uso, não pode exercer função alguma no céu, porque ele volta as costas ao Senhor, pondo-se em primeiro lugar e pondo o uso em segundo lugar. Quando se diz uso, entende-se também o Senhor, porque o uso é, como acaba de ser dito, o bem, e o bem procede exclusivamente do Senhor.

390.     Daí se pode concluir quais são as subordinações nos céus, a saber, que elas são subordinações ao uso, que cada um ama, estima e honra, e portanto subordinações às pessoas que executam tais usos, pelo valor desses usos. Mas a pessoa é amada, estimada e honrada enquanto ela não atribuir o uso a si própria, mas ao Senhor somente, porque, quanto mais ela é sábia, tanto mais os usos que executa alcançam o seu alvo, que é o bem. O amor, a estima e a honra espirituais são simplesmente o amor, a estima e a honra ao uso praticado pela pessoa: a honra da pessoa é proveniente do uso. A prática do uso sem amor ao Senhor e ao próximo nada é.