A Divina Providência nos Últimos
Adaptação de um sermão do Rev.Keneth Stroh
"E até mesmo os cabelos da vossa cabeça estão todos contados"
(Mateus 10:30).
O Senhor nos ensinou que Ele tem cuidado até pelas menores coisas da vida humana. Seu governo Divino, embora seja universal, é também das coisas mais singulares, dos menores detalhes da vida. Os nossos próprios fios de cabelo estão todos numerados pelo Pai Celestial.
Mas nem sempre é fácil para a pessoa enxergar e aceitar o fato de que todas as coisas estão sob o governo Divino. A causa principal dessa dificuldade que temos se deve a que não podemos ver a Divina Providência de frente. O homem não entende como a Providência do Senhor pode governar todas as coisas enquanto permite a existência de coisas que destroem a vida humana. Não sabe por quê as coisas acontecem diferentemente de uma pessoa para outra. Nas vicissitudes da vida, nos acontecimentos infelizes, nas circunstâncias negativas, a pessoa não vê, conscientemente, essa operação da Divina Providência.
Assim, muitos têm caído no erro de negar a providência do Senhor, atribuindo os acontecimentos externos a causas meramente naturais, à prudência ou à falta de prudência da parte do homem. E parece que é assim mesmo. Pois a sorte e a adversidade assaltam as pessoas imparcialmente, quer sejam boas, quer sejam más, sem distinção de sexo ou idade. Alguns buscam a explicação para isso em hipotéticas vidas passadas, admitindo a idéia da reencarnação, levados que são pelo anseio de entender as causa das coisas do mundo natural.
É compreensível que haja tais dúvidas e que o homem não veja a operação da Providência no momento em que ela está acontecendo. Pois, dizem as Doutrinas Celestes, se o homem pudesse ver claramente em sua vida diária o Senhor operando e dispondo todas as coisas, ele iria ou seguir passivamente as disposições da Providência - e nesse caso perderia toda a sensação de liberdade e vida própria - ou iria reagir contra a vontade de Deus, tentando interferir nas operações Divinas para alterar os acontecimentos a seu critério, assim combatendo e negando a Deus.
Em qualquer caso, o homem perderia sua liberdade e não poderia mais, sem essa aparência de liberdade, se deixar preparar para a vida no céu. E assim os propósitos da Divina Providência se veriam frustrados.
Por isso é que o Senhor ordenou que, conquanto a prudência e a ação do homem nada façam, ainda assim o homem deve sentir que é livre e que as coisas estão sob sua ação e sua prudência. O homem pensa que é ele quem governa a vida e determina seu futuro. E mais, o Senhor determinou, em outra lei, que o homem não deve sentir ou perceber a operação da Divina Providência nos eventos externos da vida diária, pelo menos enquanto estão se realizando; ou seja, o homem não pode ver de frente a ação da Divina Providência.
Entretanto, é vital para o bem eterno e espiritual do homem que ele conheça e reconheça a ação da Providência a fim de que livre e conscientemente se submeta ao seu governo. Depois dos eventos passados, o homem pode olhar para trás e procurar enxergar a ação da Providência divina em todas as coisas que aconteceram, como elas tiveram de ser como foram e como não poderiam ter sido diferentes. Pois é permitido ao homem ver a Providência como pelas costas e reconhecer o seu governo soberano.
Por isso é importante que nós saibamos que, a despeito de todas as aparências em contrário, o Senhor organiza e dispõe todas as coisas de nossas vidas, até as que são mais externas e menores. E isto nos foi dito no claro ensinamento da letra, quando Ele falou: "E até mesmo os cabelos da vossa cabeça estão todos contados" (Mateus 10:30).
Os cabelos, sendo as coisas mais externas, têm apenas alguma coisa de vivo, participando somente em pequeno grau da vida do homem. Assim, eles representam as condições e os acontecimentos da vida natural que nos envolvem em nossa vida diária. Como os cabelos, esses eventos e vicissitudes da vida nos cercam e constituem a estrutura de nossas vidas, embora não façam, realmente, parte de nosso ser. Não são a causa real de nossa felicidade ou infelicidade.
Todavia, essas condições e eventos externos da vida são da maior importância para nós, porque constituem o meio no qual podemos agir, reagir e viver para escolher a qualidade de nossa vida eterna. O propósito da Divina Providência é levar as pessoas para o céu, e esse propósito se completa quando a pessoa permite que o Senhor introduza nela a vida do céu. E o poder do Senhor em realizar isto está nos últimos, isto é, nas condições, fatos e acontecimentos que fazem parte da vida humana neste mundo. Se não fossem os eventos, fatos, circunstâncias e condições da vida natural, tomadas como base de nossa experiência, o Senhor não poderia moldar nosso espírito para a vida eterna.
Portanto, para que se realize o Seu propósito de amor em relação ao homem, o Senhor coordena e dispõe todas e cada uma das coisas da vida de uma maneira tal que elas propiciem as melhores condições de preparação para o homem. Todos os eventos externos são oportunidades ou de escolha ou de preparação para o homem. E todos os que reconhecem isto não devem ficar perturbados diante de tais eventos ou circunstâncias, mas devem considerá-los como instrumentos ou meios de preparação para a vida eterna, caso não fosse assim o Senhor não consentiria que tais coisas existissem.
O homem não pode governar os fatos da vida. Pode, sim, olhar à frente e, com prudência, procurar, como se fosse por si mesmo, prover o melhor possível. Mas realmente não pode saber ou dispor o futuro. Se o fizesse, deixar-se-ia levar por seus amores naturais, deixar-se-ia confundir por sua ignorância acerca da vida eterna e assim aniquilaria toda a possibilidade de vir a ter uma existência feliz na eternidade.
Mas a coisa mais admirável da Divina Providência é que o Senhor dispõe cada evento da vida de um modo tal que este afete a vida não de uma pessoa somente, mas de todos os homens ao mesmo tempo, fazendo sair dali uma oportunidade de contribuir para o bem eterno de muitíssimas outras pessoas e, até, de todas as pessoas no universo, tanto no mundo natural quanto no mundo espiritual.
O governo dos homens pode criar leis que sirvam, durante certo tempo, ao bem coletivo e beneficie um grande número de pessoas, às vezes até significando o sacrifício ou prejuízo de alguns. Mas é somente o governo do Senhor que pode moldar todas as coisas da vida de uma maneira tão sábia que cada uma delas contribua para o bem eterno de todos e cada um dos indivíduos, seja homem, seja mulher ou criança neste mundo, como também cada anjo no céu.
A sabedoria com que o Senhor prevê, provê e governa todas as coisas foi explicada nas Doutrinas pela ilustração: "É como uma flecha lançada com um arco: se desde que, ao partir, se desviasse do alvo, por pouco que fosse, à distância de uma ou de várias milhas o desvio seria imenso; assim seria se o Senhor, a cada momento, mesmo no menor, não dirigisse os estados das mentes humanas" (DP 202).E também no Salmo: "Tu conheces o meu assentar e o meu levantar; de longe entendes o meu pensamento. Cercas o meu andar, e o meu deitar, e conheces todos os meus caminhos. Sem que haja uma palavra na minha língua, eis que, ó Senhor, tudo conheces".
Por isso é que não existem coisas tais como o acaso, o acidente e a sorte: todas essas coisas foram, são e serão previstas e providas pelo Senhor; são apenas sinais do governo Divino, de Sua vontade ou de Sua permissão. As circunstâncias e os acontecimentos felizes são de acordo com Sua Vontade, que é toda Amor para com a criatura humana. Mas os eventos infelizes são, não de Sua vontade, mas de Sua permissão.
Porque há também as leis da permissão, ou seja, quando o Senhor apenas permite que os infernos interfiram na ordem e assim causem danos à vida humana, não que o Senhor Se agrade disso, mas que, não podendo absolutamente evitar que ocorram, por causa da liberdade dada à raça humana e ao influxo infernal, Ele os permite, mas tão somente se de tais infortúnios Ele puder tirar benefícios maiores para a salvação do homem.
Esses benefícios que o Senhor faz sair dos males permitidos, como têm em vista o bem eterno de todos nós, na maioria das vezes não se manifestam aos nossos olhos naturais. Nossa mente externa ou natural está unicamente no plano dos efeitos, sem ver a causa e o propósito das coisas. Daí é que nos pode vir a perturbação e a dúvida à mente natural, presa no plano limitado dos meros efeitos maléficos da desordem infernal. Mas, mesmo aí, nossa mente pode ser esclarecida e vir a saber e crer, mesmo sem ver, que mesmo os males que nos sucedem estão sob o governo misericordioso da Divina Providência.
Enquanto estivermos neste mundo, jamais poderemos compreender bem como o Senhor dispõe todas as coisas. Repetindo o que disse o salmista, este conhecimento é maravilhoso demais para nós. Mas, pelas verdades das Doutrinas, podemos ver racionalmente que é assim que o Senhor governa todas as coisas do universo. Pois podemos saber que Ele é onipresente e que Ele é o mesmo nas maiores e nas maiores coisas. Está igualmente presente com anjos e homens, no céu e na terra, com velhos e crianças, com sábios e simples.
Também podemos saber que Ele é onisciente, que Ele sabe todas as coisas de eternidade a eternidade. A vista Divina não é limitada como a do homem. Não existe o tempo para o Infinito, embora o Infinito esteja presente em todos os tempos. Por isso, todo o futuro está no presente para o Senhor. Portanto, sendo capaz de prever, desde a eternidade, o que o homem será, Ele também provê para que as coisas sucedam de modo a que delas possa tirar o melhor proveito para a vida eterna do homem, ainda que com algum dano inevitável à sua vida material, vida que é transitória e finita. É como vimos no Salmo: "Os Teus olhos viram o meu corpo ainda informe, e no Teu livro todas estas coisas foram escritas; as quais iam sendo dia a dia formadas, quando nem ainda uma delas havia" (139:16).
E igualmente podemos saber que Ele é onipotente, que Ele tem poder nas grandes e nas pequenas coisas, e que de todas elas Ele tira um bem para o homem que se dispõe a ser salvo. Ele é o Todo-poderoso até nas menores coisas da vida.
A presença do Senhor no universo é como a presença da alma no corpo. Sua Providência atua, portanto, desde as coisas mais universais até as coisas mais singulares, até a menor de todas elas, tendo cada uma delas sob o Seu governo, cada uma delas contada, numerada e disposta segundo o Seu Divino Amor e a Sua Divina Sabedoria. É por isso que Ele, só, pode cuidar, a cada instante, das maiores até as menores coisas da vida humana. E esse cuidado para com todas as coisas e todas as pessoas de Sua criação é o zelo de Sua terna misericórdia, sempre operando para o melhor bem possível de cada um, na eternidade.
Possamos nós, então, maravilhados e agradecidos, contemplar as obras do Senhor. "Não se vendem dois pardais por um ceitil? e nenhum deles cairá em terra sem vosso Pai. E até os cabelos de vossas cabeças estão todos contados. Não temais pois: mais valeis vós do que muitos passarinhos" (Mat.10:29-31).
Amém.
Lições: Salmo 139; Lucas 21:5-18. DP 59