Justiça, a Vestimenta Nupcial

Sermão pelo Rev. Cristóvão R. Nobre

 

E eu, João, vi a santa cidade, a nova Jerusalém, que de Deus descia do céu,
adereçada como uma esposa ataviada para o seu marido.

Apocalipse. 21:2

Estamos celebrando hoje o aniversário do estabelecimento da Nova Igreja do Senhor, que ocorreu no dia 19 de junho do ano de 1770.  Naquele dia, o Senhor concluiu no mundo espiritual a obra do juízo e da organização de um novo céu, a morada que Ele fora preparar. Terminada essa obra, Ele em seguida enviou Seus apóstolos a todos os cristãos a fim de lhes anunciar o evangelho de que o Senhor Deus Jesus Cristo reina, e que Seu reino durará para sempre. Era o começo de uma Nova Igreja no céu e na terra. Cumpria-se, assim, o que João previra no Apocalipse: “E vi um novo céu, e uma nova terra. Porque já o primeiro céu e a primeira terra passaram, e o mar já não existe”. Apoc. 21:1.
A criação de uma nova terra não é formação de um outro globo terrestre, como se pensa, mas o estabelecimento de uma nova Igreja no mundo natural, visto que a primeira Igreja já não poderia durar mais. A primeira Igreja cristã chegava ao seu fim, deixando de existir espiritualmente a partir do momento em que não existia mais a fé genuína no Senhor e o verdadeiro amor ao próximo entre os seus membros.
Portanto, esse estabelecimento de uma Igreja nova na terra era absolutamente necessário para que fosse restabelecida para a humanidade a idéia justa de Deus e o conhecimento da vida eterna. Por meio de uma vida de acordo com esse conhecimento é que o homem poderia ser regenerado e feito cidadão dos céus.
O texto que lemos do Apocalipse fala especificamente de como se dá, pois, o estabelecimento dessa Nova Igreja na terra. Uma Igreja é instaurada por Deus quando a fé e o amor genuínos são recebidos na vida.  É isto que foi representado pela visão que João teve, da descida de uma cidade magnífica, uma cidade que vinha de Deus através céus.
João viu essa Igreja nova de duas formas: uma cidade e uma noiva. Como se sabe, a cidade, na Palavra, sempre representa a Igreja quanto à sua doutrina: Samaria representava a Igreja Israelita, Jerusalém representava a Igreja Judaica e, depois, a Igreja Cristã primitiva; Sodoma representava uma Igreja inteiramente pervertida pelo mal; Babilônia uma Igreja devastada pelo amor de dominar, e assim por diante, sendo a qualidade da cidade sempre de acordo com o estado espiritual da Igreja que ela representa.
Como aqui se tratava de uma Igreja nova, instaurada pelo Senhor no lugar da primitiva Igreja Cristã, por isso a Jerusalém aqui vista não era uma cidade terrena, mas uma Jerusalém nova, que descia do céu, e que foi chamada de Nova Jerusalém, nada tendo a ver com a Jerusalém antiga. Porque era uma Igreja inteiramente nova, apesar de ser a mesma Igreja Cristã; uma doutrina celeste, apesar de ser a mesma doutrina já ensinada na Letra da Palavra. Essa  doutrina celestial é que foi aqui vista e representada em forma de uma cidade.
Mas, para se referir à conjunção que essa Igreja nova tem com o Senhor, ela foi também vista como uma noiva preparada para as suas núpcias, o encontro com seu noivo e marido.
Duas coisas foram, por conseguinte, aqui referidas: a doutrina da Igreja (vista como cidade) e a conjunção dessa Igreja com o Senhor (vista como uma noiva preparada para as bodas).
Sabendo o seu significado, reflitamos sobre essa magnifica visão de uma cidade edificada de ouro e pedras preciosas, adereçada como noiva no dia de suas núpcias, ornamentada para seu marido.
Estar vestida como uma noiva significa estar vestida de uma vestimenta adequada para as bodas, a vestimenta nupcial. A Igreja é vista assim quando que seus membros estão preparados em suas vidas para serem conjuntos ao Senhor.
Em Mateus 22 (8 a 14), lemos uma parábola a respeito da preparação para as bodas: “ Então diz aos servos: As bodas, na verdade, estão preparadas, mas os convidados não eram dignos. Ide, pois, às saídas dos caminhos, e convidai para as bodas a todos os que encontrardes.  E os servos, saindo pelos caminhos, ajuntaram todos quantos encontraram, tanto maus como bons; e a festa nupcial foi cheia de convidados. E o rei, entrando para ver os convidados, viu ali um homem que não estava trajado com veste de núpcias.  E disse-lhe: Amigo, como entraste aqui, não tendo veste nupcial? E ele emudeceu.  Disse, então, o rei aos servos: Amarrai-o de pés e mãos, levai-o, e lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá pranto e ranger de dentes.  Porque muitos são chamados, mas poucos escolhidos”.
Essa veste nupcial é a mesma veste de que a Igreja, como noiva, estava vestida. Sendo a Igreja um conjunto de pessoas em quem existe a Igreja individual, ela está assim revestida quando as pessoas que dela fazem parte estão revestidos em seu viver dessa mesma veste nupcial. Ou antes, se alguém está vestido da vestimenta nupcial, estará nessa Igreja. E se não estiver, não poderá permanecer nela.
Mas, o que é essa veste nupcial, que nos faz ser parte dessa Igreja e estarmos assim preparados para as núpcias?  O revestimento nupcial do espírito é a vida de acordo com a doutrina, uma vida em justiça, como lemos no mesmo Apocalipse: “E foi-lhe dado que se vestisse de linho fino, puro e resplandecente; porque o linho fino são as justiças dos santos”.  Apoc. 19:8. Por conseqüência, estar sem a veste nupcial é pretender estar na cidade santa sem levar uma vida pautada pelo que é justo e reto. Este foi o caso daquele homem na parábola, que, ao invés de regozijo,  foi excluído da comunhão e se viu em trevas e angústia.
A veste nupcial da noiva a faz preparada para as núpcias, o encontro com seu noivo e marido. A justiça na vida nos faz parte da Igreja e aptos a sermos conjuntos espiritualmente com o Senhor.
João, faz uma referência a si mesmo aqui, dizendo: “Eu, João, vi a santa cidade”, porque a pessoa dele aqui também simboliza algo. “João” representa o amor ao Senhor. Isto pode ser visto claramente pelo que é dito a respeito dele, a saber, que ele era o discípulo a quem Jesus amava, não porque Jesus não amasse aos outros, mas sim porque João, representando o amor, era símbolo daquilo que o Senhor mais ama na sua Igreja: o amor verdadeiro, a caridade entre os irmãos, ao afeição espiritual benevolente para com o seu semelhante. É isto a coisa mais importante de uma Igreja; é mais importante e mais desejável do que a própria fé, representada por Pedro, ou as obras simplesmente, representadas por Tiago. Assim, é João quem vê a cidade, representando que é o amor no cristão que o faz apto a conhecer, perceber e receber a Igreja espiritual.
“João” representa, pois, o bem do amor ou o bem da vida (AR 879), quer dizer, o bem que é exercitado e praticado nos atos e nas palavras do dia a dia. Quando um cristão exercita o amor para com o seu semelhante, ele tem em seu coração esse essencial vivo representado por João, e esse essencial tem a percepção da Doutrina, pelo que diz: “Eu, João, vi a santa cidade”. Quando isto acontece, a justiça reveste os seus atos externos, e ele é uma Igreja em seu estado nupcial, preparada para ser conjunta a Deus.
Amigos, neste sentido, esta mensagem do Apocalipse adquire uma importância vital para nós. Queremos nós ser salvos? queremos de fato ser conjuntos ao Senhor? queremos ser verdadeiramente cristãos, fiéis no falar e no agir? Então precisamos urgentemente aprender a amar nosso irmão, a exercitar nosso amor para com ele através de nossas palavras, nossos pensamentos, nossos atos, nossas intenções; precisamos examinar a cada dia nosso comportamento e nossa atitude para com nosso semelhante.
Nosso falar e nosso viver têm de ser um testemunho de amor sincero para com o próximo. Temos de ser irrepreensíveis no que falarmos e fizermos, para que o Senhor nos faça irrepreensíveis também em nossos corações e mentes.
Se nossas palavras e nossos atos não puderem ser provas vivas disso, então é porque não estamos ainda revestidos dessa veste nupcial, mas somos como intrusos na boda, cobertos com capa de falsidade e fingido amor, em vez da veste nupcial da justiça. Um dia, mais cedo ou mais tarde, o descaso, o desamor ou o desprezo que então tivermos pelos semelhantes será manifestado e nós mesmos nos afastaremos da esfera celestial, porque os céus respiram o amor ao próximo e o desejo sincero de prestar usos.
A Palavra nos admoesta, em toda parte, que nós seremos julgados pelas obras que tivermos praticado e não pela crença que professamos. E seremos um dia examinados não só quanto as coisas grandes, mas também nas mínimas coisas. No dia de nosso juízo final, teremos de prestar contas de cada palavra fútil tivermos aqui proferido, cada ato doloso, cada pensamento maldoso, cada sentimento rancoroso nutrido no coração, cada gesto de má fé, cada desejo de ofender, e ainda mais, cada olhar de desprezo, cada virar da face por indiferença, cada franzir de nariz por superioridade e por arrogância. Tudo, absolutamente tudo que fazemos aqui, fica gravado para sempre na memória interior de nosso espírito, e um dia essa memória se abrirá diante de uma grande congregação. Cada registro ali existente haverá de ser visto claramente, como a roupa que vestimos, apresentado à luz de um Sol espiritual cujo brilho é sete vezes maior.
Não nos iludamos, irmãos: seremos expostos, como que revirados pelo avesso, e apareceremos no mundo dos espíritos tal qual realmente tínhamos sido aqui nos interiores. Se feito algum mal por ignorância, isto não nos será imputado. Se tivermos falado algo e magoado alguém sem querer, não será considerado, pois que não houve intenção.
Mas se tivermos feito o mal de propósito, ou mesmo se tivermos feito o bem por algum interesse egoístico, ou se tivermos pronunciado palavras verdadeiras e aparentemente bondosas, mas com intenção malévola de ferir o irmão, como os que falam por indiretas, ou por insinuações caluniosas, isto aparecerá claramente à vista em nossos externos. Agir clandestinamente para causar contenda, falar às ocultas para espalhar discórdia e inimizade, tudo isto se conhecerá perfeitamente na luz, porque, como se diz em Lucas 12:2  “...nada há encoberto que não haja de ser descoberto; nem oculto, que não haja de ser sabido. Porquanto tudo o que em trevas dissestes, à luz será ouvido; e o que falastes ao ouvido no gabinete, sobre os telhados será apregoado”. Esta manifestação dos interiores de nossa vida foi representada pela abertura do livro da vida, pelo qual seremos julgados, como lemos: “E vi os mortos, grandes e pequenos, que estavam diante de Deus, e abriram-se os livros; e abriu-se outro livro, que é o da vida. E os mortos foram julgados pelas coisas que estavam escritas nos livros, segundo as suas obras”. (Apoc. 20:12).
Assim, se nossos atos e palavras tiverem sido interiormente maus, isto é, por intenção má, nossa pretensa justiça será pior que trapos de imundícia, quer dizer, gazes e tecidos cheios de sangue e pus com se revestiam a ferida dos leprosos. No dia de nossa prestação de contas,  seremos como aquele homem que foi encontrado sem a veste nupcial. Porque está dito: “E não entrará nela coisa alguma que contamine e cometa abominação e mentira, mas só os que estão inscritos no livro da vida do Cordeiro” (Apoc. 21:27)
Irmãos, a nossa responsabilidade é tremenda. É realmente muito séria. Conhecemos com profundidade a implicação de uma palavra ferina que pronunciamos, um gesto rude, uma atitude grosseira ou de soberba que às vezes temos, e muitas vezes não damos importância nenhuma a isto. Mas se sabemos que a coisa é assim, mais responsáveis ainda nos fazemos, e, portanto, menos complacência haverá em nosso julgamento final. Porque com a medida que tivermos medido, nos medirão também. E se nós, de propósito confirmado, tivermos feito o mal, estaremos nos distanciando não só do irmão a quem odiamos, mas de toda a congregação dos anjos nos céus. Não podemos abraçar os céus e escoicear um irmão; beijar os anjos e dar cotoveladas no semelhante ao nosso lado. Louvar a Deus com os lábios e chicotear o próximo com língua de víbora.
Nossa veste espiritual é, nada mais nada menos, que o revestimento externo de nossas intenções e pensamentos. A qualidade de nossa roupa espiritual é decorrente do tipo de sentimentos e idéias que conservamos. A veste nupcial é, então, o revestimento externo de uma conduta de amor verdadeiramente cristão. Nosso espírito se veste daquilo que nosso pensamento pensa e se nutre do que a nossa vontade deseja. No dia de nossa partida para o plano espiritual, dependendo de nossa vida aqui, estaremos vestidos ou de linho finos, a vestimenta dos santos e assim preparados para as bodas ou, ao contrário, estaremos andrajosos e malcheirosos, fingindo sermos cristãos, lobos cobertos com peles de ovelha.
Nossa morada na vida eterna está sendo edificada agora mesmo. E nossa sorte está sendo determinada por nós mesmos. A cada instante que passa, mais perto chega o dia de enfrentarmos nosso juízo. Mais urgente se faz, por conseguinte, refletir sobre nossas atitudes, examinar nossos pensamentos e intenções e suplicar fervorosamente ao Senhor auxílio para sermos urgentemente reformados e regenerados.
A mensagem das Doutrinas Celestes, pregada na Nova Igreja, nem sempre é alegre e agradável de se ouvir. Na verdade, na maioria das vezes, ouvimos coisas duras que desagradam, porque as Doutrinas Celestes têm a finalidade não de nos iludir sobre nosso real estado espiritual, mas sim de nos fazer conscientes de nossas carências e dos meios de mudança para que alcancemos a vida eterna, já que este plano natural é a preparação para a eternidade. Por isso as Doutrinas Celestes nos lembram muitas vezes que somos mortos, para que desejemos a vida.  E não há vida eterna sem a morte do que é mortal. Não há paz verdadeira sem luta e vitória. Não há cura sem a dor e o amargo do remédio.
Muitas pessoas, diante dessa mensagem, voltam atrás e procuram conforto em outras doutrinas, outras igrejas e outros cultos, cuja mensagem é mais branda, por prometem salvação imediata, sem lutas, transformação de caráter apenas superficial, sem tentação, uma caminhada suave, sem fadiga e bênçãos e milagres de Deus sem comprometimento de nossa parte para com os Seus Mandamentos.  São doutrinas que estão oferecem água com açúcar para curar uma gangrena espiritual.  Infelizmente, vários de nossos irmãos se deixam seduzir pelos enganos dessas doutrinas e vão atrás de soluções miraculosas, ao invés de encararem de frente sua responsabilidade com a regeneração ensinada somente na Nova Igreja.
Irmãos, ao nos prepararmos para a Santa Ceia, façamos um exame sincero de nossas vidas.  Permitamos que o Espírito de Deus nos mostre claramente os acertos que precisamos fazer em nossas vidas.  Busquemos um concerto com nosso Senhor e um compromisso real com Ele de nos esforçamos no caminho de nossa regeneração. Roguemos a Ele que a Sua justiça brilhe através de nossas obras, para que sejamos testemunhas fiéis e verdadeiras dEle, para que não venhamos a ser cortados da congregação celeste.  Supliquemos ao Senhor coragem para mudarmos aquilo que em nós precisa ser mudado. Forças para trabalharmos, enquanto é tempo, na vinha de nossa regeneração espiritual. Tomemos a resolução firme e afastarmos os males como pecados contra Ele, porque só havendo amor genuíno em nossos corações e justiça em nossos atos é que estaremos preparados na Igreja para a vida do céu.
Praticar a justiça é, antes de tudo, não querer aos outros aquilo que não queremos para nós.
É abstermo-nos de magoar, de desprezar ou de ofender nosso semelhante, porque, quando o fazemos, estamos ofendendo ao próprio Deus. Não há justiça onde não há compromisso com mudança e com a transformação de nossas vidas.
A mensagem foi dada. Saibamos dar ouvidos à exortação, pois a finalidade da pregação é a salvação de nossas almas. Um pregador da Palavra na Nova Igreja  tem compromisso com a verdade que possa mostrar o perigo e, em seguida, indicar o caminho da salvação.  Mesmo quando isto não agrada aos ouvintes. Pensemos nisso. E que Deus nos abençoe, que nossos atos estejam revestidos da justiça e não haja em nossa boca mal algum. “E disse-me: Não seles as palavras da profecia deste livro; porque próximo está o tempo. Quem é injusto, faça injustiça ainda; e quem está sujo, suje-se ainda; e quem é justo, faça justiça ainda; e quem é santo, seja santificado ainda. E, eis que cedo venho, e o meu galardão está comigo, para dar a cada um segundo a sua obra. (Apoc. 22:9-12). Amém.

Lições: Apoc 21:1,2,27.
Mat. 22:12,14
AR 896