O JUGO SUAVE DE JESUS

Sermão pelo Rev.C.R.Nobre

 

"Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o Meu jugo, e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração;
e encontrareis descanso para as vossas almas.
Porque o Meu jugo é suave e o Meu fardo é leve"

Mateus 11:28-30.

Não há convite mais amável do que este, em que Jesus oferece descanso para a alma cansada e oprimida. Estas palavras, plenas de mansidão, alcançam profundamente o coração daquele que, atribulado pelas aflições, busca alívio para sua alma.
O Senhor Jesus é a Misericórdia mesma. Ele contempla todos os seres humanos com uma compaixão infinita, desejando conceder-lhes todo o bem que seus corações forem capazes de receber.
Há dias em nossa vida em que nos sentimos assim, cansados e oprimidos. Ainda conservamos a fé nas verdades da Palavra Divina e conhecemos o caminho que devemos percorrer, mas interiormente nos sentimos fatigados, sem nenhum ânimo para continuar seguindo em frente. Falta-nos energia e disposição para enfrentarmos as tantas lutas que esta vida nos apresenta. Frieza e apatia é só o que nos resta. Parece que é o fim de nossa caminhada e que nada mais há a fazer, nada mais é necessário, nada mais importa. Os ideais da vida espiritual, as belezas da vida eterna de que nos fala a Palavra, tudo isso fica parecendo sonhos distantes, apagados no infinito e estranhos ao mundo onde nos encontramos. O caminho para o céu, então, parece-nos dificílimo.
Fases assim, de pessimismo, melancolia e apatia são comuns à vida espiritual e portanto temos de encará-las com realismo, porque fazem parte da regeneração. Os períodos de fadiga e de opressão do espírito fazem parte do que chamamos de "vicissitudes" da vida espiritual. São representadas pelas estações do ano, a saber, primavera, verão, outuno e inverno, e pelas partes do dia, manhã, meio-dia, tarde e noite. Porque dá-se no espírito humano semelhantes alternações de luz e calor, treva e frieza espirituais.
Cumpre lembrar que o Senhor não faz nem deseja que pessoa alguma passe por tais estados de enfraquecimento e desânimo. Assim como a terra, ao se voltar mais ou menos diretamente para o sol, causa a existência em sua superfície das diversas estações do ano, também o nosso espírito, ao se voltar para o Senhor ou para si próprio, cria para si as vicissitudes em que vão se sucedendo maior ou menor grau de vida espiritual. Isto se dá até com os anjos dos céus mais altos.
Ainda que não as produza, o Senhor, no entanto, permite as vicissitudes em nossa vida, pelo fato de que delas Ele pode tirar um bem maior, que é, como se sabe, uma alegria ainda mais intensa quando se volta o estado de luz e calor, permitindo que o ser humano possa perceber a diferença entre o que é viver pelo Senhor e viver por si próprio, ou entre a felicidade e a infelicidade. E assim o Bem que se recebe do Senhor pode ser mais bem apreciado e mais bem recebido no íntimo de cada um.
Uma razão, pois, pela qual não podemos deixar de experimentar esses estados de fadiga e abatimento do espírito, é que temos um próprio cuja inclinação hereditária é para o mal, ao qual ainda ajuntamos males e falsidades de nossa própria responsabilidade, chamados males ativos. Não há pessoa alguma que não tenha esse caráter de, regularmente, desviar-se do Senhor e cair em seus próprios interesses e amores. Por conseguinte, todos precisam da ação constante da Misericórdia Divina para desviá-los da queda em um mal pior. Uma outra razão para essas fases por que passamos vem de estarmos vivendo no mundo natural, onde estamos sujeitos a toda sorte de infortúnio e perturbação decorrentes das desordens que o mesmo ser humano trouxe sobre a natureza e sobre si mesmo.
Por causa da necessária liberdade espiritual, estamos, quanto ao nosso espírito, no meio de dois influxos. De um lado, o influxo procedente do Senhor através dos céus, influxo esse que recebemos como luz e calor espirituais, que constituem a nossa vida. E de outro lado, o influxo contrário, procedente dos espíritos infernais, que injetam na mente humana toda sorte de falsidade e inflamam em seu coração toda cobiça para o mal.
Há muitos que estão satisfeitos com a vida terrena e com os prazeres dos sentidos corporais; vivem para a busca da riqueza, da fama, das honrarias e desejariam, se fosse possível, viver perpetuamente nesse plano de existência. Esses não se consideram, absolutamente, cansados ou oprimidos interiormente. Conhecem apenas o cansaço físico ou mental ou, quando muito, alguma opressão externa que os priva dos prazeres em que vivem. Logo, não são esses que hão de atender ao convite do Senhor.
A pessoa que se entrega ao prazer das cobiças e se rende às falsidades que as desculpam vive sob o domínio dos maus espíritos. E os espíritos infernais não desejam outra coisa senão subjugar o homem e reduzi-lo a nada, para que eles sejam tudo através dele (ver AC 905). Assim, como não está sendo regenerada, tal pessoa vive numa relativa acomodação quanto aos seus interiores, ou antes, é morta espiritualmente, e só seu externo e seu natural vive, e unicamente em função da carne e do mundo.
Mas o caso é diferente com as pessoas que não se acomodaram assim com o mal, aquelas que pensam na vida eterna e um dia resolveram entregar-se à operação regeneradora do Senhor. Essas, que estão sendo criadas de novo pelo Senhor para serem Seus filhos, sofrem as lutas que se chamam tentações espirituais. "São dores do mental introduzidas pelos maus espíritos naqueles que estão nos bens e nos veros. Quando esses espíritos excitam os males que estão nos regenerados, nasce uma ansiedade que pertence à tentação. O homem não sabe donde [a ansiedade] vem, porque não conhece a origem" (NJDC 187).
Podemos dizer, portanto, que o convite do Senhor é digirido especialmente a estas, quando se sentem cansadas e oprimidas. O Senhor quer aliviar aqueles que se empenham na regeneração e se extenuam, portanto, pelas lutas espirituais. Nelas o Senhor está operando uma redenção particular, a qual consiste em subjugar e remover os maus espíritos que exercem domínio em sua mente. Enquanto esses espíritos não são removidos, a consciência da pessoa se aflige com a infestação que eles promovem ali. A consciência não se conforma mais com a presença do mal, e por isso se abate e se aflige, sentido a opressão que o mal provoca. Para essa pessoa, não há paz enquanto cada estapa da obra de redenção não for realizada com sucesso. É por estar assim em combate que ela sente, em sua alma, o cansaço e a opressão, o fardo pesado de seus pecados de que ela quer se livrar pela misericórdia do Altíssimo.
De fato, nosso espírito ou nossa alma parece que às vezes se cansa na caminhada que temos a fazer nesta vida. Não tanto por causa das lutas naturais ou terrenas, como são as aflições pertinentes à vida natural, mas por causa das lutas espirituais. Há, realmente, situações em que nos sentimos cansados e oprimidos espiritualmente, em especial quando nos vemos incapazes de transpor as dificuldades em nossa vida espiritual.
Por exemplo, quando não se vê resultado na luta contra determinado mal ou cobiça, que parece sempre retornar com força para destruir o bem que se está implantando em seu lugar. Ou quando se vê a injustiça triunfar sobre a justiça, os perversos prosperando e os bons perecendo. Ou quando a pessoa se vê sem resposta aos argumentos dos que a frontam com falsidades. Ou quando se vê impotente para mudar as circunstâncias ao seu redor ou para influenciar positivamente pessoas de atitude adversa. Ou quando se luta por ideais que parecem nobres e bons, e se que, apesar dos bons intentos, os esforços são infrutíferos.
Em situações assim, o espírito esmorece; falta-lhe ânimo e determinação para continuar a luta, pois há uma espécie de cansaço da vontade. E o espírito se tomado pelas dúvidas quanto aos fins de sua vida, se são mesmo válidos. Fica tentado a se render e esquecer os ideais que antes tinha formulado e que agora parecem tão distantes, imagens apagadas num horizonte cada vez mais longe. Quando pensa na vida celeste, esta lhe parece impossível e o caminho do céu inacessível. A esse abatimento da alma somam-se a angústia e as incertezas injetadas pelos maus espíritos; eles insinuam que a obra da regeneração fracassará para ela, e que o Senhor não poderá salvá-la.
Esses sentimentos são como um fardo pesadíssimo sobre as costas, e os pensamentos são como uma prisão angustiante de que não se vê saída. São situações a que todos nós estamos sujeitos. Não só por causa do mal existente em nosso próprio ser, mas também por causa do mal vindo de fora, não há como escaparmos dessas vicissitudes, enquanto vivermos neste mundo.
Foi a nós, então, que o Senhor Jesus dirigiu as palavras: "Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o Meu jugo, e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas. Porque o Meu jugo é suave e o Meu fardo é leve"
É importante notar que o Senhor nos chama para fazermos uma troca. Ele quer nos aliviar do jugo dos infernos, mas em troca nos submete ao jugo Divino: "Tomai sobre vós o Meu jugo". Quer nos tirar dos ombros o fardo pesado dos males e pecados, mas em troca nos dá o Seu fardo, que é leve. São dois fardos e dois jugos. Não existe meio termo: ou se está sob o jugo dos infernos ou sob o jugo Divino. Ou se carrega o fardo do pecado ou o fardo do Senhor.
É claro que o homem pode perfeitamente escolher guiar-se por si mesmo, tomar sobre si seu próprio jugo e não servir a ninguém senão a si próprio. Só que, ao fazê-lo ele estará, na realidade, submetendo-se ao inferno, ao qual está ligado e que então o dominará completamente. A verdade é que o homem não tem vida em si mesmo, mas a recebe do Senhor, seja através dos céus, seja através dos infernos. Se o homem quisesse sair dessa dependência, simplesmente desapareceria.
Que diferença há, então, para o cansado, em deixar um fardo e tomar outro? Ou que diferença há para o oprimido em se ver livre de um jugo e receber outro em seu pescoço? A diferença é a mesma que existe entre a vida e a morte. Porque, enquanto o domínio dos infernos é duro e cruel, o governo do Senhor é brando e quase imperceptível. Enquanto os infernos escravizam, o Senhor dirige, deixando o homem em inteira liberdade. Sobre este ponto, leiamos os AC 905: "A presença do Senhor traz liberdade... Quanto mais o Senhor está presente, mais livre é o homem, isto é, quanto mais o homem está no amor do bem e da verdade, mais livremente ele age. Tal é o influxo dos Senhor através dos anjos. Mas, por outro lado, o influxo do inferno através dos maus espíritos é forçado, impetuoso, esforçando-se para dominar; porque esses espíritos não aspiram outra coisa senão a completa subjugação do homem... Por isso, quando o Senhor está livrando o Homem do domínio e do jugo deles, levanta-se um combate; mas quando o homem é liberto, isto é, regenerado, então é conduzido pelo Senhor por meio do ministério dos anjos, tão brandamente, que nada existe de jugo ou de domínio, pois que então ele é conduzido por meio de seus deleites e sua felicidade, e é amado e estimado. Isto é o que o Senhor ensina em Mateus: "Meu jugo é suave e o Meu fardo é leve" (11:30), e é o contrário do estado do homem quanto está sob o jugo dos maus espíritos, os quais, como foi dito, consideram o homem como nada, e, se o pudessem, atormentá-lo-iam a todo momento"
"Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e Eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o Meu jugo, e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração; e encontrareis descanso para as vossas almas. Porque o Meu jugo é suave e o Meu fardo é leve". Quando cairmos no abatimento espiritual, no desânimo. na falta de esperança quanto à nossa felicidade futura, possamos nós dar ouvidos ao convite amoroso do Senhor Jesus, pois Ele está sempre presente conosco, querendo nos aliviar de todo sofrimento.
Pelo fato de estarmos neste mundo a fim de sermos preparados para a vida eterna, não podemos pedir que o Senhor afaste de nós as lutas, pois é por meio delas que seremos renovados espiritualmente. As lutas são necessárias, e mesmo quando nos voltamos para Ele, atendendo ao Seu doce chamado, não estamos livres da dor, da tristeza, da perturbação, pois são como fogo que purifica a prata ou que tempera e dá rigidez ao aço.
Todavia, com Ele nosso fardo será mais leve, fácil de carregar, pois é Ele, através de Seus anjos, quem, na verdade, o suporta e carrega por nós.
Saibamos recorrer à Palavra e aprendamos do Senhor, que é manso e humilde de coração, pois só assim encontraremos descanso para as nossas almas, descanso que existirá mesmo em meio às lutas e dificuldades, pois estaremos sendo por Ele sustentados na fé em Suas promessas, na confiança em Seu auxílio e na esperança de Sua salvação. Amém.
Lições: Mt. 11:25-30; Sal.119:137-144; AC 905.