O CEGO DE JERICÓ

Sermão pelo Rev. Karl Alden

"O cego Bartimeu, ouvindo que era Jesus de Nazaré, começou a clamar e a dizer:
Jesus, filho de David, tem misericórida de mim".

(Marcos 10;47)

                   Bartimeu vivia num mundo de trevas. Para ele não havia nuvens obscurecendo o céu, não havia manhãs plenas de luz, não havia crepúsculos dourados, não havia vales cheios de lírios nem montanhas coroadas de verde. Não podia apreciar a graça das artes nem ser estimulado por idéias derivadas do sentido da visão. Era cego e ficava junto dos caminhos esmolando.

                   Naquele dia, ele estava junto da estrada que ia de Jericó para Jerusalém, a mesma estrada em que um infeliz viajante fora assaltado por ladrões e depois socorrido pelo bom samaritano. Essa estrada tem uma significação importante porque liga duas cidades de altitudes bem diferentes. Jerusalém está a mais de 840 m acima do nível do mar, enquanto Jericó se encontra em uma depressão que se situa a 390 m abaixo do nível do mar.

                   Jerusalém está assentada sobre uma colina e não pode ser escondida. Jerusalém representa a Igreja. David a escolheu para capital de seu reino e Salomão, seu filho, ali construiu o templo. Era o centro do culto do Deus Único no mundo antigo. Enquanto esteve no mundo, o Senhor fez até Jerusalém sete viagens memoráveis. Depois da destruição da cidade no ano 70 de nossa era João viu uma nova cidade descendo de Deus pelo céu, à qual deu o nome de Nova Jerusalém e que é a Nova Igreja.

                   Jericó repousa numa planície ao norte do Mar Morto. Naquele tempo, era coberta de luxuriante vegetação, de onde lhe veio o nome de "cidade das palmeiras". Jericó foi a primeira cidade a opor resistência às hostes de Josué e é bem conhecido o milagre que resultou a destruição de suas muralhas. Jericó era o símbolo do amor sensual do eu e representa os males que devem ser afastados de nossa conduta em primeiro lugar.

                   Quando passou por Jericó, naquela ocasião, o Senhor estava fazendo a Sua última e memorável jornada que terminaria com a sua crucificação. Ele disse, então, aos discípulos: "O Filho do homem será entregue aos principais sacerdotes e aos escribas; condená-lo-ão à morte e o entregarão aos gentios. Hão de escarnecê-lo; cuspir n'Ele, açoitá-lo e matá-lo; mas depois de três dias ressuscitará".

                   Era, pois, ao lado da estrada de Jericó a Jerusalém, que leva das profundidades às alturas, que leva do sensual à cidade de Deus, que estava assentado e mendigando o cego Bartimeu. Essa estrada representa, espiritualmente, o caminho que todos devemos trilhar para alcançarmos, finalmente a cidade santa e dali a ressurreição. Por outro lado, a cegueira de Bartimeu representa a vida da criatura não reformada, porque a cegueira espiritual é ignorância e falsidade; o seu portador é incapaz de alcançar a luz da verdade.

                   Todos, pois que ainda não começaram a jornada da regeneração são, de certo modo, cegos, porque a falta de percepção os mantém afastados da verdade. O Senhor diz, no capítulo 3 de João, que "aquele que não nascer de novo, isto é, não regenerar-se por intermédio da verdade, não pode ver o reino de Deus" e, portanto está em trevas.

                   Bartimeu, apesar de representar aqueles que não conhecem as verdades da Palavra, tinha uma faculdade que funcionava bem. Ele podia ouvir, e o ouvido representa a obediência. Quando o Senhor, cercado por Seus discípulos e seguido por uma grande multidão, aproximou-se, Bartimeu sentiu que alguma coisa fora do comum estava acontecendo, e, quando lhe disseram que era Jesus de Nazaré que passava por ali, sentiu uma grande esperança. Se tudo o que havia ouvido a respeito de Jesus era verdade, então uma pessoa cega podia ser ajudada por Ele e esse raciocínio o fez exclamar: "Jesus, filho de David, tem misericórdia de mim". Embora muitas pessoas tentassem obrigá-lo a calar-se, ele clamava cada vez mais "Filho de David, tem misericórdia de mim". Jesus, parando disse que o chamassem. Bartimeu, lançando de si a capa, levantou-se de um salto e foi ter com Jesus, que lhe perguntou: "Que queres que Eu te faça? " Ele respondeu: "Mestre, que eu recupere a vista". Então, Jesus lhe disse: "Vai, a tua fé te salvou". Bartimeu teve sua visão aberta e seguiu Jesus estrada afora.

                   Notemos que Bartimeu lançou de si a capa que o cobria antes de ter a visão aberta. É somente quando despimos as roupas velhas, que representam os erros da vida terrena e as aparências deste mundo, e nos apresentamos ao Senhor em nossa nudez e sinceridade, que podemos ter nossa visão espiritual aberta. Então seremos regenerados, nasceremos de novo, e passamos a usar vestimentas que representam as verdades que recebemos do Senhor.

                   As roupas são as verdades ou as falsidades que vestem os propósitos da criatura humana. A presteza com que Bartimeu despiu sua roupa velha representa um estado de humildade que todos nós devemos aceitar se quisermos ir ao encontro do Senhor. Se quisermos ser instruídos, se quisermos ser reformados, teremos de despir as roupas que representam as falsidades para nos apresentarmos ao Senhor.

                   Nós vivemos na época da Segunda Vinda do Senhor, mas se julgarmos a cegueira do mundo resultante do desconhecimento dos Escritos da Nova Igreja, que constituem essa Segunda Vinda, ficaremos admirados da vastidão de tal cegueira. Sentimos compaixão da cegueira de Bartimeu, mas pensemos, por um momento, na cegueira daqueles que não vêem que há um Único Deus e que esse Deus é o Senhor Jesus Cristo, Pai, Filho e Espírito Santo, Criador do céu e da terra, o Redentor e Salvador do mundo.

                   Quão grande é a cegueira daqueles que vêem na letra da Palavra somente a "letra que mata" e não vêem "o espírito que vivifica", isto é não vêem a luz e a alegria existentes nos ensinamentos da Nova Jerusalém descendo de Deus pelo céu, como lemos no capítulo 21 do Apocalipse.

                   Nos quatro Evangelhos são referidos casos de sete homens que foram curados de cegueira por Jesus, isto é, que ficaram em condições de ser regenerados pelos conhecimentos ministrados pelo Senhor. Mas, quem pode contar o número de pessoas que continuam em cegueira espiritual, aguardando a passagem da verdade ao longo da estrada da vida?

                   Em todas as épocas, houve criaturas cegas que foram levadas a ver a luz, houve Bartimeus cegos com o desejo de, ao ouvirem a voz do Senhor, despirem as velhas vestimentas de uma fé superada e se apresentarem ao Salvador, para que Ele lhes desse a visão das novas coisas espirituais. Essas criaturas viram a verdade. A luz brilhou no interior de suas mentes e daí por diante seguiram o caminho do Senhor: o caminho de Jericó a Jerusalém; o caminho que leva das profundezas doentias do amor do eu para as alturas rejuvenecedoras do amor ao Senhor; o caminho que leva da cidade da ignorância e da falsidade para a cidade da sabedoria e da verdade.

                   Na nossa época, nós da Nova Igreja temos o privilégio de sermos incluídos entre aqueles que viram a luz da nova revelação do Senhor nas obras teológicas de Emanuel Swedenborg. Swedenborg nos diz, em várias passagens dessas obras, que ele nada escreveu de si mesmo, mas que tudo o que escreveu foi determinado pelo Senhor. Temos o privilégio de possuir essas obras, mas isso não basta. É preciso que ouçamos a passagem do Senhor perto de nós; é preciso que abandonemos os erros e falsidades representados pela nossa velha roupagem; é preciso que nos apresentemos ao Senhor em nossa inocência e sinceridade; é preciso, fundamentalmente, que tomemos conhecimento de Suas verdades, através da leitura da Palavra e dos Escritos, e que as ponhamos em prática na nossa vida diária.

                   Desde a época da Primeira Vinda do Senhor até hoje, pesa sobre Seus discípulos e seguidores uma grande responsabilidade, a qual é, ao mesmo tempo, uma fonte inesgotável de júbilo para aqueles que a puderam aceitar. Essa responsabilidade é representada pelas palavras do Senhor em Mateus 5;14 e 16: "Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte... Assim, resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus".

Amém.

Lições:
Marcos 10;47
Apocalipse Explicado 239

 

Adaptação de J. Lopes Figueredo

 

O CEGO ESPIRITUAL
Apocalipse Explicado (239)

 

                   Aqueles que não vêem, isto é, que não compreendem as coisas em que acreditam, são cegos. Também são cegos aqueles que desconhecem ou não têm compreensão da verdade pelo entendimento. Em consequência, eles são incapazes de aperfeiçoar a vida por meio das coisas pertencentes à fé, pois o entendimento é o caminho da vida do homem; o homem não se torna espiritual a não ser pelo entendimento. Todos os que estão no céu vêem as verdades com o entendimento e, assim, as recebem; mas não recebem aquilo que não vêem com o entendimento. Se alguém lhes diz que devem ter fé, mesmo que não vejam ou compreendam, eles se voltam dizendo: "Como pode ser isso? Eu creio naquilo que vejo ou compreendo, mas sou incapaz de acreditar naquilo que não vejo ou não compreendo. Aquilo que não é visto ou compreendido pode constituir falsidades que destruirão minha vida eterna". São, também, cegos aqueles que estão na doutrina da fé só, e julgam que podem ser justificados por essa fé sem a prática das obras da caridade.

                  

 

 

 

 

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