A Casa de Deus

Sermão pelo Rev.Elmo C.Acton

"Este povo diz: Não veio ainda o tempo, o tempo em que a casa do Senhor deve ser edificada. Veio, pois, a palavra do Senhor, pelo ministério do profeta Ageu, dizendo: É para vós tempo de habitardes nas vossas casas estucadas, e esta casa há de ficar deserta? Ora pois, assim diz o Senhor dos Exércitos: Aplicai os vossos corações aos vossos caminhos. Semeais muito, e recolheis pouco; comeis, mas não vos fartais; bebeis, mas não vos saciais; vestis-vos, mas ninguém se aquece; e o que recebe salário, recebe salário num saco furado"

(Ageu 1:2-6).

Ageu profetizou no ano 520 a.C., quase vinte anos depois de judeus voltarem do cativeiro na Babilônia e quatro anos antes da dedicação do segundo templo. No ano 586 antes de cristo, Nabucodonosor subiu e atacou Jerusalém. Após um longo cerco, conquistou a cidade e a incendiou. O templo construído por Salomão foi completamente destruído pelo fogo e só restaram o grande altar e os fundamentos, feitos de pedra, mas em ruínas. Como castigo pela rebelião, Nabucodonosor levou o povo cativo e o estabeleceu na Babilônia.
Lá, numa colônia às margens do rio Chebai, eles desfaleciam no cativeiro e viam diminuir as esperanças de um dia retornarem à pátria, de restaurarem sua cidade querida, Jerusalém, e novamente oferecerem sacrifícios no altar. Mas seus espíritos eram reanimados e seus anseios eram sustentados pela voz dos profetas, especialmente a de Ezequiel. Este profetizava que, se o povo permanecesse fiel ao Senhor, seriam novamente assentados em sua terra e veriam restaurados o templo e o culto. Jeremias, também, profetizava que o cativeiro teria um fim após setenta anos.
No ano 537, Ciro, rei da Pérsia, conquistou a Babilônia e, no mesmo ano, fez um decreto permitindo que os judeus voltassem à Judéia e reconstruíssem Jerusalém e o seu templo.
Assim, após cinqüenta anos de cativeiro muitos voltaram à Judéia e Jerusalém. Fizeram reparos nos alicerces do templo e reedificaram o grande altar de pedra, mas pararam aí. e então passaram a se dedicar às suas próprias necessidades: construíam casas para ele mesmos e, por causa da seca, da falta de mantimento e da situação econômica debilitada, não retomaram mais a obra de restauração do templo. Alguns, apegando-as a uma interpretação literal da profecia de Jeremias que falava em setenta anos, diziam que "Não veio ainda o tempo, o tempo em que a casa do Senhor deve ser edificada". E uma tal condição prevaleceu por quase vinte anos.
Ageu, com a ajuda de outro profeta, Zacarias, pôs um fim nesse estado. Ele pregava que a seca, a fome e a pobreza do país eram resultado de eles terem negligenciado a construção do templo. Censurava o povo por construir belas moradas para si mesmos, enquanto a casa do Senhor ficava deserta. Profetizava que, se primeiro eles reconstruíssem a casa do Senhor, teriam o suficiente para comer, beber, vestir e onde habitar, e a glória do templo reconstruído seria maior que a daquele edificado por Salomão.
O povo deu ouvidos às palavras de Ageu e Zacarias, e, quatro anos depois, no ano 516, o novo templo estava sendo dedicado.
Esta história, em seu sentido moral, ensina que, se a pessoa, nos afazeres de sua vida, provê primeiro o que importa ao Senhor e à igreja, todas as outras coisas seguirão de acordo com o que for melhor para seu bem eterno. Pode não se tornar rica ou poderosa, pode não obter posições de honra e dignidade, mas até as coisas naturais e materiais de sua vida serão supridas de forma a prover a melhor base para a felicidade eterna da pessoa nos céus. Este é mesmo ensinamento que o Senhor mais tarde proferiu: "Buscai primeiro o reino de Deus e a Sua justiça e todas essas coisas vos serão acrescentadas" - comida, bebida e moradia.
Já no sentido espiritual, esta história trata da necessidade de se organizar e se pôr em ordem a vida do homem natural, suas afeições e pensamentos, obras e palavras de acordo com a verdade da Palavra, de forma a torná-la receptiva da vida espiritual que emana do Senhor desde os céus. Especificamente, ensina que, após a vitória na tentação, deve haver reordenação da vida natural pela verdade do bem que está no homem interno.
No primeiro estágio da regeneração, estágio esse que se chama reforma, a vida do homem é ordenada pela verdade da Palavra atuando de fora, por assim dizer; este é o "primeiro templo". Neste estágio, as coisas relativas a ele mesmo e ao mundo, e as coisas que se relatam ao Senhor e à igreja são como se paralelas umas às outras. O homem então emprega seu tempo e sua reflexão ora a umas, ora a outras. E isto continua até que ele, se regenerado, veja que esta é uma situação impossível - não pode continuar servindo a dois senhores - pois que na realidade os amores de si e do mundo têm domínio. Isto o conduz a um estado de tentação - ele é levado cativo para sua Babilônia, perde todo o deleite com as coisas espirituais e da igreja e se sente miserável e desalentado. Mas, se anseia voltar aos primeiros tempos, quando de fato sentia prazer com a verdade da Palavra e a vida da verdade, e se fielmente se compele a viver de acordo com a verdade, será liberto de tal prisão. Surgirão um novo rei e um novo reino e o livrarão do domínio de seu amores egoísticos e mundanos. Neste estado, o homem interno está aberto para o influxo procedente do céu. O homem é agraciado com uma nova vontade e um novo entendimento, e volta a sentir um prazer novo com as verdades da vida espiritual.
Mas, para que o deleite do homem interno possa ser assim transmitido à mente externa, precisa haver uma reorganização da vida do homem natural, e essa reordenação é comandada pelo interior, vinda de uma nova percepção da verdade espiritual. Esse novo estado da regeneração é comparado ao novo templo que é reconstruído, no qual a glória é maior do que antes.
O estado do homem é assemelhado ao da terra assolada. Após a luta, é necessário que haja uma nova habitação em sua mente na qual o Senhor possa mora com ele. Após a tentação há conjunção com o Senhor por causa do bem e da verdade que se uniram na pessoa que venceu e superou a luta. A vitória nas lutas espirituais prepara os meios para que os amores do homem interno sejam liberados e venham estabelecer uma ordem nova na mente e na vida do homem externo. Esses são os frutos da vitória; para alcançá-los, o homem deve, como por si mesmo, buscar uma nova ordem de vida em seus pensamentos, seus sentimentos e também em suas atitudes e obras, incluindo seus hábitos e sua vida diária.
Quando chegamos à conclusão que certos males estão atacando e destruindo nosso prazer com as verdades espirituais; quando vemos que certas coisas estão afetando nosso contentamento com a vida e as afeições relativas à Igreja e lutamos contra tais coisas para que elas não mais nos infestem, somos propensos a relaxar os esforços e esperar passivamente a volta ao antigo deleite. Mas a conjunção não está vitória, e sim na união do bem e do vero que seguem a vitória. A conjunção aqui mencionada existe quando o bem do homem interno se alia à verdade do externo, e a verdade no externo é a ordem da vida.
Seja por exemplo o mal de se desprezar os outros em comparação a si próprio. A pessoa que reconhece que isso é um mal, descobre que tem esse mal em si, e assume que deve lutar contra isto como pecado contra Deus. Ela pode combater esse mal e vencê-lo, de sorte que, em seu pensamento interno, se torne humilde e não mais se considere acima dos outros ou melhor do que os outros; ao mesmo tempo, em sua vontade interna, passará a querer bem ao próximo e apreciar suas qualidades e seus usos em relação a ela própria e aos outros. Mas essa mudança no modo de pensar e de sentir não dará, por si mesma, àquela pessoa o prazer genuíno: ela terá de expressar essa mudança interior em forma de palavras e obras, palavras sinceras que mostrem de fato apreciação dos usos do próximo e, quando possível, obra que beneficiem esses usos.
Toda vitória na tentação deve ser seguida por uma reordenação da vida do homem externo, para que os frutos da vitória possam ser concedidos pelo Senhor. Se não for assim, então, ainda que haja a libertação do mal, o retorno do cativeiro, a obra não estará completa. Será como quando eles voltaram da Babilônia: estavam em suas terras, mas ali havia fome, sede e pobreza. Não havia a morada preparada para o Senhor. Assim também nós: podemos mudar nossa condição interior quando superamos nossas falhas espirituais, mas ainda sentiremos, nos externos da mente, a falta de prazer para com as coisas espirituais, a sequidão de sentimentos, o desânimo, a desesperança e a falta de verdadeira alegria espiritual. Precisamos, portanto, reordenar nossa vida externa; organizar nossos hábitos, nosso modo de agir e de falar; preparar, no plano natural de nossa vida diária, morada adequada para o Senhor conosco.

A glória da primeira casa - o templo construído antes da vitória na tentação espiritual - é a ordem da vida do homem, ordem a que ele se impõe pela obediência às verdades da Palavra que atuam como que de fora. Essa ordem é destruída quando os males do homem e os seus amores egoísticos se tornam ativos e passam a governar sobre ele.
Mas a glória da segunda casa é a ordem do homem externo, quando ele vence e supera os amores infernais, permitindo que sua vida seja estabelecida pelos amores e percepções do homem interno de acordo com a forma do céu, forma que vem do Divino Humano do Senhor.
"Veio, pois, a palavra do Senhor, pelo ministério do profeta Ageu, dizendo: É para vós tempo de habitardes nas vossas casas estucadas, e esta casa há de ficar deserta? Ora pois, assim diz o Senhor dos Exércitos: Aplicai os vossos corações aos vossos caminhos. Semeais muito, e recolheis pouco; comeis, mas não vos fartais; bebeis, mas não vos saciais; vestis-vos, mas ninguém se aquece; e o que recebe salário, recebe salário num saco furado" (Ageu 1:2-6).

Amém.


Lições: Ageu 1; AC 4574.