Batalhas Espirituais

Um sermão pelo Rev. Thomas L.  Kline

“E Jesus, cheio do Espírito Santo, voltou do Jordão e foi levado pelo Espírito ao deserto; e quarenta dias foi tentado pelo diabo, e naqueles dias não comeu coisa alguma; e, terminados eles, teve fome”.

(Lucas 4:1,2).


Por que as coisas ruins acontecem em nossas vidas? Recentemente, uma pessoa fez um comentário, dizendo que, quando observava as vidas de todos os seus amigos, parecia-lhe que todo mundo que conhecia estava passando por algum grande problema ou grande dificuldade em suas vidas, agora ou num passado recente. Podia ser uma doença, uma morte na família, dificuldades maritais ou aflição emocional. Mas parecia-lhe que todos tinham algum grande problema a enfrentar. Diante disso, uma outra pessoa fez outro comentário, bem pessimista, dizendo que se preocupava não com as pessoas que tinham grandes problemas em suas vidas, mas com aqueles que não tinham enfrentado ainda uma crise séria. Sua apreensão era que estas ainda acreditavam que a vida era calma e livre de problemas, e teriam logo essa inocência arrebatada. Mas nem todos nós encaramos crises. E, para alguns de nós, as dificuldades com que lidamos na vida são abertas e públicas; para outros, são mais pessoais e confidenciais.
Mas, voltando, à pergunta: Por que as coisas ruins acontecem? Um livro recentemente editado, que está entre os mais vendidos, é intitulado: Quando coisas ruins acontecem a pessoas boas. E um outro, também entre os mais vendidos, se inicia com o pensamento, “a vida é difícil”.
Às vezes, quando um fato grave acontece, nós podemos explicá-lo raciocinando que as coisas más são uma parte necessária de nossa jornada espiritual; é parte desse “fogo purificador”, que nos faz pessoas mais fortes. Quando algo de ruim acontece, há uma lição a ser aprendida, uma vitória a ser obtida. Isto vem de que a vida que conduz ao céu envolve não somente a alegria e o conforto, mas também o que nos causa dor e ansiedade da tentação espiritual. A tentação  espiritual é parte de nosso crescimento espiritual.
Mas, às vezes, coisas tão graves e ruins acontecem nas vidas de pessoas que esta explanação não parece ser suficiente. Uma pessoa disse assim, sobre a morte de um ente querido: “se houver alguma lição que eu deva aprender com algo tão trágico assim, seria melhor para mim não aprender”. Há uns eventos de proporção verdadeiramente trágica: a morte inesperada de uma pessoa querida, uma doença terrível e dolorosa, o distúrbio e a depressão emocionais, a dissolução de um casamento, o abuso, a fome e a miséria.
Se nós nos contentarmos em acreditar que, de algum modo, o Senhor permite ou mesmo faça com que tais coisas aconteçam para que nós possamos aprender alguma lição importante sobre a vida, nós acabamos ficando com uma idéia terrível e negativa a respeito de Deus. Aliás, alguém comentou tal idéia, afirmando que “Deus deve ser um mau professor, para usar uma tragédia como meio de ensinar uma lição”.
Assim, há uma verdade muito importante, dada nas doutrinas da Nova Igreja, que nos ajuda a compreender as tragédias: Não é apenas para que possamos aprender algo novo sobre a vida que as coisas más e os infortúnios terríveis são permitidos pelo Senhor. Tais coisas acontecem simplesmente porque nós estamos no meio de uma grande guerra entre o céu e o inferno. O fato é que vivemos no meio de um campo de batalha de uma guerra grande, e essa guerra está ocorrendo exatamente agora. É uma guerra espiritual; é a guerra espiritual entre o céu e o inferno. É a guerra que o próprio Senhor veio à terra lutar. E, às vezes, nós ou nossos amigos e entes queridos, somos vítimas inocentes dessa batalha terrível.
Imagine uma guerra física onde há um bombardeio; uma bomba cai e explode bem perto de nós; sofremos ferimento, dor e o aflição, não por causa de alguma coisa que tenhamos feito, mas porque há uma batalha em andamento e o bombardeio nos atingiu. Pois a mesma coisa acontece num nível espiritual. Os infernos infligem dor e desordem sobre todos nós, e nós sofremos. Pensemos numa criancinha que sofre de uma doença incurável. A doença, sua dor e seu sofrimento, vêm do inferno. Esse sofrimento nada mais é que a manifestação física do ódio, da raiva e do vingança do inferno. E essa criancinha tem uma doença tão dolorosa não porque tenha cometido algum pecado, nem porque seus pais pecaram, nem porque tenha de aprender alguma lição (embora possa haver, sim, alguma lição a ser aprendida naquilo). Mas essa criança tem essa doença simplesmente porque os infernos são realmente poderosos e não desejam outra coisa senão causar a dor e o sofrimento. Todas as coisas ruins – físicas, mentais e espirituais – são, portanto, um resultado dessa grande batalha entre o céu e o inferno.
Dissemos, acima que nós somos, muitas vezes, vítimas inocentes que estão neste campo de grande batalha espiritual. Mas esse pensamento pode nos causar uma sensação de desamparo. Sendo assim, é melhor rever a nossa condição e considerarmos que, em vez de “vítimas inocentes” que estão um campo de grande batalha espiritual, é mais exato dizer que somos, realmente, “soldados”, soldados que foram convocados pelo Senhor para tomar parte na batalha.
Somos soldados que vivem no campo da grande batalha, e fomos chamados a lutar no nome do Senhor. Este é um dos conceitos mais importantes que precisamos conservar em mente, a respeito de nossas vidas, porque nos dá uma visão que é cheia de esperança e de propósito. Estamos no meio de uma grande guerra;  basta olhar ao nosso redor, no mundo, e também dentro de nós mesmos, para ver essa guerra. Somos soldados com uma missão específica nessa grande batalha entre o céu e inferno. Mesmo aquela criancinha doente, é um soldado, convocada pelo exército do Senhor.
Assim, quando uma coisa ruim nos acontecer – seja uma doença maligna, seja uma morte terrível – devemos permanecer passivos? Devemos nos sentir como vítimas desamparadas? Ou devemos, antes, nos empenhar ainda mais, com confiança no Senhor, para não sermos derrotados?
Podemos e devemos, sim, lutar, mesmo quando alguma coisa terrível já tiver acontecido. Por exemplo, se uma criança morre, como podemos nós nos sentir vitoriosos, sem deixar que os infernos nos derrotem com essa morte que eles causaram? Eis aqui um ensinamento chave: nós lutamos essa batalha espiritual como um indivíduo, mas as conseqüências de nossa vitória, mesmo pequena, serão globais. Em outras palavras: quando nós, como indivíduos, lutamos as batalhas espirituais contra os infernos e vencemos, nós estamos ajudando milhões incontáveis de pessoas, em todo o mundo, que são atacadas por aqueles mesmos infernos. Quando alcançamos vitória sobre um inferno em particular, estamos diminuindo a potência daquele inferno, não apenas para nós mas para todos os outros que também combatem contra ele.
Sendo assim, quando uma tragédia acontece (mesmo a morte de uma pessoa querida), nós podemos ainda lutar contra os infernos que causaram a morte. E fazemos isto prosseguindo em nossa jornada espiritual do novo nascimento, afastando os males como pecados contra Deus, vivendo a Palavra do Deus, não desanimando nem perdendo a esperança e a fé nEle. Nesta batalha, lutamos por todos os nossos irmãos e amigos, e por isso não podemos esmorecer; lutamos por todo o reino do Senhor, agora e nas gerações futuras.
Mas, alguém poderia perguntar: Por que a vida não pode ser livre da dor, do sofrimento, e do aflição das tentações? Por que nossa vida não pode ser apenas fácil e agradável? Para responder essas questões, é útil fazer essas mesmas perguntas em relação à vida do Senhor Jesus Cristo. Por que não poderia a vida do Senhor, quando estava na terra, ser apenas de paz e tranqüilidade? Por que Ele teve que sofrer tentações contínuas, que, como os Escritas dizem, duraram do começo até o fim de Sua vida? Por que Ele teve que começar Seu ministério sendo tentado pelo diabo, após passar quarenta dias num deserto? Por que teve que sofrer a dor e a angústia terrível da paixão na cruz?
Ao fazermos essas perguntas com relação à vida do Senhor, a resposta é óbvia: Porque Ele não veio aqui para ter uma vida de paz e de alegria, mas veio com uma missão a ser realizada: lutar contra os infernos; lutar em favor de gerações e gerações de homens, mulheres e crianças; lutar por todos nós. Sua vida tinha um propósito, uma finalidade maior do que Seu próprio bem-estar e Sua tranqüilidade.
O mesmo é verdadeiro em relação a todos nós: estamos aqui para nossa própria regeneração; estamos aqui por uma causa (uma batalha, realmente) que é maior do que nós mesmos. E, algumas vezes, essa causa envolve a dureza da dor e das tentações. Então, qual de nós não está disposto a enfrentar perigos, se a nossa vitória puder beneficiar toda a raça humana, em toda a terra?
Isto não significa, todavia, que nossas vidas serão flageladas com tragédias a cada momento. Pois há muitos momentos de alegria, felicidade e paz em nossas vidas. Jesus disse que nosso jugo seria suave e nosso fardo seria leve. Mesmo assim, precisamos não perder de vista o motivo por que nós estamos aqui. Precisamos ter em mente uma noção mais de “guerra” do que de um estado mentalmente “pacífico”, no nível espiritual.
E se realmente entendermos a nossa condição no mundo, podemos saber por que existe, freqüentemente, tanta dor e tanto sofrer em nossas vidas e nas vidas daqueles que estão à nossa volta. Um campo de batalha não é um lugar de repouso e calma, assim como o campo da batalha espiritual. Mas o Senhor nos dá, pelo menos, um repouso, um oasis de tempos em tempos, um descanso de nossa batalha, para nossa refrigério, para a restauração de nossas forças. Todavia, batalhar é nossa finalidade principal na vida.
Neste contexto, é útil pensar em alguns dos ensinamentos dos Escritos sobre a tentação  espiritual. Em primeiro lugar, aprendemos que a tentação espiritual é um ataque dos infernos contra algum amor bom que temos. Se você alcançar algum amor novo e bom em sua vida, esteja certo de que esse amor será logo atacado pelos infernos. Mas se você se queixar: “Por que, toda vez que eu tenho algum amor novo em meu coração, esse amor é desafiado?”, então você ainda não compreendeu a finalidade de sua vida aqui. Há uma batalha acontecendo, por isso a tentação espiritual é algo que você pode esperar por certo.
Outra questão, para a qual encontramos ensinamento nos Escritos, é: “As tentações que ainda estão por vir serão mais fáceis ou mais difíceis?” A resposta é: serão provavelmente mais severas. Mas se, diante disso, seu raciocínio for: “Não é justo que eu tenha batalhas cada vez maiores à medida que envelheço”, então, você ainda não compreendeu o por quê de sua vida  aqui. Porquanto você foi chamado para ser um soldado espiritual. Assim, à medida que se fortalece e fica mais experiente, o Senhor lhe dará desafios maiores, batalhas mais difíceis para lutar, porque os soldados experientes e fortes são os mais necessários em algumas frentes das batalhas, pois serão, ali, os mais eficazes. O Senhor está nos preparando para coisas grandes.
Há, ainda, outros ensinamento que diz que, na tentação, há extremo desespero e profunda angústia. Então, não espere facilidade na luta. Não existe essa coisa de tentação espiritual “mais fácil”. Por isso é que, às vezes, você sente que está realmente “perdendo” a guerra durante a tentação. Mas se, novamente, sua mente ficar perguntando: “Por que minhas lutas são tão difíceis? Será que as coisas não poderiam ser mais fáceis para mim?”, então, você ainda não compreendeu por que está aqui.
Quando Jesus começou Seu ministério terreno, foi batizado por João no rio Jordão e foi para o deserto, por quarenta dias, onde foi tentado pelo diabo. Teve fome e sede, uma forma tão grande que foi tentado pelo diabo transformar pedras em pão. Mas Sua fome era imensa: era a fome da salvação de toda a raça humana.  O diabo O levou ao pináculo do templo e sugeriu que Se jogasse abaixo. Ele foi tentado a duvidar de Seu próprio poder de conservar a raça humana. Finalmente, o diabo O tentou do alto de uma grande e elevada montanha, mostrando-Lhe todos os reinos do mundo. Tudo aquilo Lhe seria dado se Se curvasse ao diabo e o adorasse. Mas o Senhor repreendeu o diabo e venceu todas aquelas tentações. E, no fim do relato, encontramos as palavras que dizem que “o diabo O deixou por algum tempo”. Porquanto as tentações deviam continuar. Deviam continuar até à paixão da cruz, a última tentação do Senhor. E por Sua vitória contínua, completa e definitiva nas tentações, o Senhor pôde operar a nossa redenção.
Conservemos, pois, em nossas mentes, a Sua vitória como emblema de força em nossas vidas,  para que possamos, com o poder do Senhor, enfrentar nossos desafios com uma atitude consciente e positiva, sabendo que teremos lutas, sim, mas Ele nos dará toda coragem e toda força de que necessitarmos para, em Seu nome, sermos também vitoriosos.

Amém.

Lições: Salmo 91; Lucas 4:1-15,
Leitura das Doutrinas: Arcanos Celestes 6829; 1690