Apercebidos

Sermão pelo Rev. Cristóvão Nobre,
baseado em sermão do Rev. Kenneth O.Stroh

"Portanto, estai vós também apercebidos; porque virá o Filho do homem à hora que não imaginais" (Lucas 12:40).

Todos nós somos exortados a estarmos vigilantes e preparados para a hora em que o Senhor vier. Esta preparação deve ser feita pelo homem, como por si mesmo, e, todavia, deve reconhecer que é feita por Deus.
A necessidade de nos prepararmos para a coisas que virão é um princípio da ordem da Divina Providência em relação ao mundo, a igreja e ao céu. Toda coisa criada existe como um resultado de preparação. Cada coisa é parte de uma série infindável de conseqüências, cada parte visando a novas coisas. E cada coisa nova depende das que a precederam; daí vem sua existência e sua qualidade.
Podemos ver a preparação para a vinda do Senhor ao mundo e para o estabelecimento da Igreja Cristã na aparente reforma da Igreja Judaica, na reconstrução do templo em Jerusalém, no avanço do conhecimento promovido pelos gregos, na obra de João Batista, a "voz do que clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor". E quando o próprio Senhor glorificou o Seu Humano e o fez Divino, enviando os discípulos para pregarem o evangelho do reino, tudo já estava preparado para a instauração de uma nova igreja, a Igreja Cristã.
A Nova Igreja foi prevista e provida pelo Senhor desde a criação. Pode-se dizer que todas as coisas, desde a eternidade, contribuíam para que se realizasse a mais excelente de todas as revelações, e para a formação da Jerusalém Celeste entre aqueles que a podem aceitar e amar, e viver as suas verdades.
Mas é evidente que o Senhor quer salvar não apenas a humanidade em geral, mas cada homem e cada mulher em particular. O propósito íntimo da Providência Divina é que cada pessoa tenha um lugar especial no céu. Para isto, as Doutrinas Celestes proclamam a vinda perpétua do Senhor para todos aqueles que O receberem. E aqueles que dão ouvidos a essa proclamação são comparados aos "homens que esperam o seu Senhor, quando houver de voltar das bodas, para que, quando vier e bater, logo possam abrir-lhe". Esses habitam no Senhor, que está nos céus, e o Senhor habita neles. E Ele "os fará assentar, e, chegando-se, os servirá".
Portanto, é de suma importância que a pessoa reconheça a necessidade de estar assim preparada para a vinda do Senhor. Ela pode ter prazer em pensar que possui os conhecimentos da Nova Igreja ou que faz para de uma sociedade que defenda as verdades espirituais da Nova Jerusalém. Entretanto, deverá saber que, ainda que seja conveniente e bom ser membro da sociedade da Igreja, isto não garante de modo algum a recepção do Senhor. Porque a Nova Igreja deve ser uma igreja interna. E assim como alguém não pode se dizer membro de uma organização antes que esteja preparado para aceitar as responsabilidade que estão de acordo com sua capacidade, da mesma forma, só podemos entrar na igreja interna, a igreja real, se estivermos dispostos e formos capazes de assumir as responsabilidades de uma vida espiritual verdadeira. E isto requer preparação.
O Senhor disse: "Estai vós apercebidos"., isto é, preparados. E Sua doutrina indica que esta preparação deve ser dupla. A Divina Providência opera sem cessar para assegurar a cada pessoa a possibilidade de sua salvação; essa obra da Providência é feita de uma tal maneira, que a pessoa não pode sentir sua ação e mal a pode compreender. No entanto, ela deve fazer o que lhe compete nessa preparação, caso contrário não poderá ser salva. Deve seguir o Senhor, dispor sua vida de um modo tal que sirva aos propósitos do céu mais do que aos de si somente; deve cooperar com o Senhor. Quando o Mestre agir, o homem deve reagir positivamente. E embora a salvação seja obra do Senhor, só, ainda assim a pessoa deve responder à voz do Senhor inteiramente como se a salvação dependesse dela mesma, todavia reconhecendo que, se pode fazer algo, é pelo Senhor. É só dessa maneira que se pode abrir a porta ao Senhor e entrar no curso da Divina Providência, de sorte que o Senhor possa vir como o Noivo da igreja, e os homens e mulheres da igreja possam ser como noiva preparada para seu marido, para o Senhor em Seu Humano glorificado.
O primeiro meio para esse propósito é a aquisição de conhecimento da Palavra, porque é pelo conhecimento que a pessoa entra num estado capaz de receber o Senhor. O conhecimento adquirido da Palavra faz elevar o entendimento humano; podemos comparar aos degraus da escada que Jacob viu em seu sonho, escada que, posta na terra, atingia o céu; nela os anjos subiam e desciam, enquanto o Senhor JEHOVAH ficava no alto. De fato, os conhecimentos abrem o caminho do influxo pelo qual o Senhor concede a bênção da salvação. E sem a luz do conhecimento não podemos ver o caminho; o homem fica em trevas e como um que dorme espiritualmente.
Contudo, o conhecimento da verdade não garante a salvação: somente ilumina o caminho que vai dar à salvação. E o caminho é a vida de penitência dos males e de regeneração. Implica lavar e limpar a mente e o coração, tirar os males dos atos de diante dos olhos do Senhor, evitar as cobiças do mal e viver a vida da caridade e do uso. Porque o homem que assim prepara sua vida é como aquele a quem o Mestre encontrou vigiando. A esse homem o Senhor proverá, gradativamente, uma vontade nova e celestial, um entendimento novo da verdade, para que nele a obra da regeneração pode ser cumprida e ele possa ser preparado para o céu. Tal pessoa é como aquele que tem os lombos cingidos e a candeia acesa: seus interiores são receptivos do calor celeste que é o bem do amor, e desfruta da iluminação e percepção espirituais provenientes das verdades da fé que o Senhor lhe concedeu. Para os que estão nesse estado o Senhor pode fazer todo bem; e, como Ele disse, "os fará assentar, e, chegando-Se, os servirá".
O desejo do Senhor é conceder essas bênçãos celestes a cada homem. Mas cumpre notar que homem algum pode jamais receber tudo o que o Senhor tem a oferecer: seria como um pequeno cálice para receber o oceano. O homem se prepara para a recepção de Deus e para a conjunção com Deus especialmente ao viver de acordo com a ordem Divina; e as leis da Ordem são todos os mandamentos de Deus, expostos na Palavra. Na verdade, só o Senhor pôde cumprir todos os mandamentos, tornando-Se Ele mesmo, quanto ao Seu Humano, receptáculo da plenitude da Divindade. Mas como Ele é infinito, Ele pode vir em plenitude para cada homem, fazendo seu cálice transbordar. E o grau da plenitude de Deus é limitado somente pela preparação do homem para recebê-Lo.
"Estai vós também apercebidos; porque virá o Filho do homem à hora que não imaginais". Estas palavras do Senhor são literalmente verdadeiras, pois nenhum de nós sabe a que horas o Pai Celestial virá para nos chamar para Si mesmo. Alguns entrarão na vida espiritual ainda na infância, outros no auge da juventude, outros na maturidade e outros atingirão a meia idade ou a velhice, antes que chegue a hora de sua chamada. Realmente, os caminhos da Divina Providência são insondáveis.  Entretanto, a medida de nossa preparação não é só o grau da regeneração, mas especialmente nossa boa vontade para recebê-Lo. De Sua parte, o Senhor não se retira de ninguém nem deixa de conceder Seu favor Divino a homem algum. Por isso, se o homem está na inocência, ou seja, no desejo sincero de querer ser guiado pelo Senhor, ele não precisa ter receio algum da morte ou da perdição, pois o Senhor disse: "Não temais, ó pequeno rebanho, porque ao Pai agradou dar-vos o reino".
É verdade que muitas pessoas não completam sua preparação para o céu enquanto estão neste mundo. Mas, se aqui se elas tiveram um pouco que seja de disposição para estarem preparadas, com sinceridade, então a obra será continuada e completada no mundo espiritual. Porque o aspecto admirável neste assunto é que a preparação para o céu é apenas o começo de uma obra que continuará eternamente. O Senhor vem de novo para os anjos em cada um de seus novos estados de recepção d`Ele, e cada estado novo traz novos deleites e um aumento de felicidade e paz.
Em algumas parábolas do Novo Testamento, encontram-se  expressões semelhantes que dão a idéia de que o Senhor está ausente: (Mt 21:33) “Ouvi, ainda, outra parábola: Houve um homem, pai de família, que plantou uma vinha, e circundou-a de um valado, e construiu nela um lagar, e edificou uma torre, e arrendou-a a uns lavradores, e ausentou-se para longe”.   (Mt 25:15)  “E a um deu cinco talentos, e a outro dois, e a outro um, a cada um segundo a sua capacidade, e ausentou-se logo para longe”.
Esta aparência de que o Senhor foi para longe, ausentou-se, é a sensação que temos de estamos sós e dependentes apenas de nossas próprias ações. Esta aparente ausência de Deus é absolutamente necessária, porque precisamos nos sentir livres para sermos e fazermos o que quisermos. Esta é nossa liberdade espiritual.  Estamos nesta com a finalidade de escolher qual será nossa vida futura, e essa escolha tem de ser feita no livre.
Quando, porém, não está apercebida, a pessoa abusa dessa situação de liberdade, acreditando que Deus ignora o que ela faz. Ele está ausente, pensa. E por causa dessa aparência de que Deus não presta atenção, ela faz pouco caso de sua vida espiritual, ignora a justiça, se esquece do amor. É como, na parábola, os lavradores maus espancando os servos e matando o filho. Verdades e bens são assim maltratados e violentados na mente da pessoa que age motivada apenas pelo seu egoísmos e pelos valores materiais, em detrimento do amor a Deus e para com o próximo, em detrimento de sua regeneração.
Em Seu infinito amor o Senhor quer se conjuntar com todos, tantos os que estão longe quanto os que estão perto d`Ele, para lhes dar livremente as Suas bênçãos e fazê-los felizes. Por isso o Senhor está continuamente preparando os anjos para uma recepção interior sempre crescente de Sua vida e Sua bem-aventurança. E também está continuamente preparando para o céu todos os homens e mulheres que, por afeição da verdade e do bem, submeterem suas vidas à direção de Sua Doutrina e se esforçarem para fazer a Sua vontade.
A preparação é uma obra essencialmente Divina, da misericórdia do Senhor, mas requer a ação livre e ativa do homem. Por isso o Senhor confortou os Seus discípulos, como também nos conforta a todos com estas palavras de confiança: "Não se turbe o vosso coração... Na casa de Meu Pai há muitas moradas: se não fora assim, Eu vo-lo teria dito. Vou preparar-vos lugar. E se Eu for e vos preparar lugar, voltarei para vós, e vos receberei em Mim mesmo, para que onde Eu estiver, estejais vós também. E sabeis para onde Eu vou, e conheceis o caminho". "Eu sou o caminho, a verdade e a vida". Amém.

Lições: Isaías 40:1-11, Lucas 12:32,48. AC 9763.