OS ADVENTOS E A REVELAÇÃO


Sermão pelo Rev. Norbert H. Rogers


“Disse-vos estas coisas por parábolas. Chega, porém, a hora em que vos não falarei mais por parábolas, mas abertamente vos falarei acerca do Pai”.

(João 16,25)

O Senhor falava com Seus discípulos a Seu próprio respeito. Tratava especialmente da relação entre Seu Humano e Seu Divino, que parecem ser diferentes, mas entretanto são inteiramente um; falava também de Seus mandamentos e de Seu Amor Infinito, da severa tentação que tinha de sofrer e da morte porque devia passar antes de deixar o mundo; falava ainda sobre o Espírito Santo e a Sua Segunda Vinda.
Os discípulos achavam as Suas palavras muito difíceis de compreender. Com efeito, dificilmente poderiam fazer uma idéia sobre elas. E o Senhor, percebendo a sua dificuldade, lhes dizia que acreditassem no que estava dizendo. Dizia-lhes que embora tivessem que passar por muitas tentações e dúvidas por causa delas, e embora fossem implacavelmente perseguidos por aqueles que O odiavam, deviam orar sempre, pedindo força e sabedoria, em Seu nome, para que pudessem, por fim, alcançar a plenitude da alegria. E, nas palavras de nosso texto, lhes dizia ainda que, embora lhes falasse em parábolas naquele momento, viria o tempo em que lhes revelaria as coisas Divinas de forma clara — pois pelo “Pai” é significado o Divino do Senhor.
Em outros lugares da Palavra se diz que o Senhor tornou a verdade conhecida de seus discípulos aberta e claramente (Mateus 13). Aí se diz que lhes era dado conhecer os mistérios do reino do céu, porque podiam ver com seus próprios olhos, isto é, podiam ver as verdades com a visão de seu entendimento. Mas às outras pessoas os mistérios celestes eram mantidos encobertos porque não podiam ver o que era verdadeiro. E por isso era necessário que o Senhor lhes falasse em parábolas, cuja verdadeira significação não aparecia sendo, por conseguinte, expressões obscuras de que dificilmente se poderia tirar um conhecimento claro das coisas espirituais.
Entretanto o nosso texto mostra que o Senhor falava também a Seus discípulos em parábolas. Fazia-lhes, porém, a promessa de que no futuro falaria abertamente. É assim evidente que as coisas Divinas eram misteriosas também para eles — que ainda não as compreendiam.
Pelo fato dos discípulos amarem a verdade mais efetivamente do que as outras pessoas, e a procurarem com mais ardor, o Senhor podia dar-lhes conhecimentos em maior abundância e mostrar-lhes a sua significação mais claramente do que aos outros. Não obstante, eles ainda não estavam aptos a compreender claramente a Divina Verdade; razão pela qual o Senhor não a revelava (a eles) em sua plenitude, mas a escondia nas expressões obscuras das parábolas, para não perturbá-los com conhecimentos demasiado profundos da verdade.
Esta afirmação pode, à primeira vista, parecer um pouco estranha; pois não era justamente a falta de conhecimentos e de entendimento da verdade, a razão do mundo estar em tal estado de maldade e de infelicidade? Não era por esta razão que os maus espíritos puderam alcançar tão grande poder sobre as mentes dos homens, e que ninguém podia escapar à sua dominação por mais que o desejasse? E não era essa uma das principais razões da vinda do Senhor ao mundo para tornar, uma vez mais, conhecidas dos homens as verdades espirituais e Divinas, e por meio delas vencer o poder dos infernos e dar aos homens a liberdade de se regenerarem, se o quisessem? Em resumo, não era o conhecimento e o entendimento da verdade exatamente tudo o que havia de mais necessário, no momento, para habilitar os homens a curar-se de suas feridas espirituais e receber a vida e as bênçãos do Céu?
Como, então, se diz que o Senhor conservava, propositadamente, fora do alcance dos homens, o conhecimento e o entendimento da verdade, falando-lhes sempre por parábolas? Por que se diz que a razão d’Ele assim proceder era impedir que os homens fossem feridos pela verdade?
A realidade, porém, é que o Senhor falava em parábolas não para impedir que os homens conhecessem e entendessem a verdade, mas para que pudessem chegar a conhecê-la e entendê-la tanto quanto eram capazes de fazê-lo, e da maneira que lhes era possível empregá-la em sua regeneração.
O caso é semelhante ao que se passa com um faminto. Quando uma pessoa está prestes a morrer de fome, não se lhe pode dar imediatamente uma alimentação forte e abundante, pois o seu organismo está, então, demasiado fraco para digerir esse alimento, de modo que em vez de fortalecer-se com ele, seria, ao contrário, imensamente prejudicado. Nessas circunstâncias, o alimento poderia até ser a causa imediata de sua morte. O melhor que se pode fazer por uma pessoa em tal estado, é dar-lhe pequenas porções de alimento (muito simples), tendo muito pouco poder nutritivo. Esse alimento sendo facilmente digerível, não sobrecarregará o organismo combalido, e ao mesmo tempo dará aos diversos órgãos do corpo a oportunidade de que necessitam para ir, gradualmente, desempenhando novamente as suas funções. Dessa forma, o organismo todo irá se fortalecendo para poder, depois, digerir alimentos mais substanciais e mais abundantes. E assim se restituirá o vigor ao faminto e ele poderá se dedicar outra vez às diversas atividades da vida.
Quando o Senhor veio ao mundo, os homens estavam quase morrendo por não terem mais verdades com que se alimentar espiritualmente. Estavam, por assim dizer, em estado de extrema carência quanto à verdade. O Senhor, portanto, não podia revelar-lhes verdades claras com abundancia, porque tais verdades seriam demasiado fortes para eles e não os auxiliariam de modo algum; mas, ao contrário, tornariam a sua situação pior do que antes. O Senhor tinha, primeiro, que acostumá-los ao conhecimento e uso da verdade. Tinha que fortalecer e desenvolver as suas mentes para que pudessem receber e entender, depois, a Divina Verdade em uma forma clara.
Por esta razão era necessário que lhes revelasse a verdade numa forma relativamente simples — por assim dizer, de uma maneira fácil de digerir —, isto é, por meio de parábolas. Estas escondiam parcialmente a verdade, como que obscurecendo e adoçando a sua ofuscante radiação e força esmagadora, enquanto que ao mesmo tempo tornava possível aos homens verem alguma coisa da verdade, na medida em que eram capazes de percebê-la e procurá-la.
Ademais, é um princípio de educação muito conhecido que o conhecimento daquilo que ainda não sabemos nos vem somente por meio do que já conhecemos; de modo que a completa compreensão de elementos fundamentais deve ser alcançada antes de se empreender estudos mais avançados. Por exemplo, quando uma pessoa inicia sua instrução, não adianta ensinar-lhe as complexidades da trigonometria ou do cálculo diferencial, pois não poderia compreender coisa alguma desses estudos superiores. Precisa aprender primeiro a soma, a subtração e as demais operações fundamentais da matemática, para poder depois compreender outras mais complicadas. Começando assim pela simples aritmética, o estudante vai gradualmente progredindo no conhecimento dois ramos mais adiantados e mais complexos da matemática, que poderá então compreender e aplicar.
Acontece o mesmo com as outras espécies de conhecimentos. E assim acontece também com o conhecimento e entendimento da verdade. Ninguém pode, subitamente, alcançar o conhecimento de toda a Divina Verdade em sua forma mais clara; é indispensável que se comece pelas verdades mais simples e fundamentais. Além disso, ninguém pode começar a aprender mesmo as verdades mais simples, a não ser que elas se ajustem, por assim dizer, aos conhecimentos obtidos anteriormente, isto é, a não ser que os conhecimentos que já possui sejam o meio pelo qual se aprenda a significação e o uso da verdade.
Os conhecimentos que todos os homens possuem são conhecimentos naturais que pertencem ao mundo. São estes os conhecimentos fundamentalmente já sabidos que devem ser usados na aprendizagem dos conhecimentos espirituais que ainda não se sabe. Com efeito, os Escritos nos ensinam que “sem uma idéia das coisas do mundo, o homem nada pode pensar absolutamente” (A. C. 2520).
É o que ocorre hoje em dia. E ainda foi pior quando o Senhor veio ao mundo. Pois naquele tempo não havia conhecimentos das coisas espirituais entre os homens; não se sabia mesmo que houvesse verdades espirituais. É esta mais uma razão do Senhor só falar em parábolas.
Assim fazendo, o Senhor usava os conhecimentos e as idéias naturais que os homens tinham, para poder lhes dar alguma idéia das verdades concernentes às coisas espirituais e Divinas. Por exemplo, os homens tinham alguns conhecimentos a respeito da mostarda, mas nada sabiam, absolutamente, a respeito do céu e da regeneração. E assim o Senhor lhes disse na parábola que o Céu era semelhante à semente da mostarda. Por essa parábola eles podiam formar uma idéia da verdade de que, no começo da regeneração, as coisas do Céu são tão pequenas que mal chegam a ser alguma coisa, mas que, com o desenvolvimento da regeneração, elas aumentam em número e importância até encher toda a mente.
Acontecia o mesmo com as outras parábolas e, na realidade, com tudo o que o Senhor dizia e fazia. Parecia que tudo isso se referia a coisas naturais, entretanto, é claro que tinham uma outra significação mais profunda. Pensando sobre as coisas que o Senhor dizia e fazia — tentando descobrir qual era a significação oculta dessas coisas — os homens eram não somente levados a obter alguma idéia a respeito das coisas espirituais, mas também a desenvolver as suas mentes de modo a poder conhecer e entender a verdade em uma luz mais clara.
Esse desenvolvimento da mente até se tornar apta a aprender claramente a Divina Verdade revelada, leva muito tempo. E para a raça humana, em geral, o desenvolvimento de um estado mental apropriado à recepção de uma revelação racional da Divina Verdade, sem perigo de profanação, requer muitas gerações. Por esta razão, quando o Senhor estava no mundo, Ele não podia falar senão na forma obscura das parábolas, mesmo a Seus discípulos. Por esta razão também, Ele fez saber nessa ocasião que Ele viria novamente, indicando que Sua Segunda Vinda devia ser no Espírito de Verdade (João 14). E ensinou que, nesse tempo, não precisaria mais falar em parábolas, pois poderia, então, mostrar claramente todas as coisas aos homens, mesmo as verdades mais ocultas, porque as suas mentes estariam convenientemente desenvolvidas e preparadas pelas parábolas e pela obediência às Suas palavras.
Falando da primeira vinda do Senhor, o Evangelho de João diz: “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a Sua glória como a do Unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade” (cap. 1,14). Isto é uma expressão obscura como a das parábolas; entretanto a sua significação só pode ser referir ao fato da Divina Verdade da Palavra ser revelada aos homens pela vinda do Senhor ao mundo. De fato, nos dá a impressão de que a revelação da Divina Verdade dada naquela época constitui a vinda do Senhor em essência e em realidade.
O corpo de carne e osso que o Senhor assumiu no mundo pode parecer completamente diferente das parábolas que Ele pregou; entretanto não o é, pois aquele corpo também pode ser chamado uma parábola, visto como apresenta alguma coisa Divina numa forma natural. Por meio dele o Senhor se fez conhecido dos homens, exatamente como Ele fez em relação à Divina Verdade a Seu respeito, que deu a conhecer por meio de parábolas. Assim as parábolas escondiam a plena luz da Divina Verdade; conquanto a fizessem aparecer aos olhos dos homens, assim também faziam o corpo natural do Senhor que escondia a plena glória de Seu Divino, quando entretanto a revelava. Além disso, é pelas verdades reveladas na Palavra que chegamos a ter conhecimento do Senhor e de Sua vinda. Por elas, mesmo não O tendo visto com os olhos naturais, podemos formar uma idéia d’Ele como Ele se mostrou aos homens. Nós O vemos naquelas verdades, e por elas sentimos a Sua presença em nós. De modo que Ele, realmente, vem a nós nas verdades de Sua Palavra.
Estas considerações nos habilitam a compreender porque o Senhor Se chama a Verdade, e porque fala de Sua nova vinda como sendo a do Espírito da Verdade. Isto nos permite compreender também o que significado pelas palavras escritas em um dos volumes dos Escritos da Nova Igreja: “Este Livro é o Advento do Senhor” (Hic Liber est Adventus Domini). Pois em Sua Segunda Vinda não foi mais necessário o Senhor usar parábolas, isto é, esconder o conhecimento d’Ele mesmo por trás de coberturas naturais. Ele pode agora mostrar claramente aos homens as coisas Divinas concernentes a Ele para que sejam vistas e compreendidas. Assim, para vir outra vez, Ele não teve necessidade de um corpo natural como aquele de que serviu para fazer a Sua primeira vinda. Agora Ele pôde se aproximar dos homens e Se tornar conhecido deles numa nova revelação racional da Divina Verdade, em que o Seu Poder e a Sua Glória são claramente manifestados.
Esta nova e clara Revelação da Divina Verdade, que é o Segundo Advento do Senhor, foi feita por meio de Emanuel Swedenborg, o servo fiel do Senhor, a quem Ele preparou desde a primeira infância para esta função especial, e inspirou com Seu Espírito, de modo que coisa alguma do que ele escreveu nos livros comumente chamados Os Escritos, provinha dele mesmo, mas do Senhor unicamente. E quando nós, tendo sido preparados pelas parábolas do Antigo e do NT, nos tornamos aptos a apreender as verdades reveladas nos Escritos, então o Senhor vem novamente a nós; então se cumpre em nós a promessa de nosso texto: “Chega, porém a hora em que vos não falarei mais por parábolas, mas abertamente vos falarei acerca do Pai”.
Amém.

•   1ª Lição:     Marcos 4, 26-41
•   2ª Lição:     João 16, 15-28
•   3ª Lição:     A. C. 2520