Amor aos filhos

Sermão pelo Rev.Louis B.King

"Há três espécies de amor que constituem as coisas celestes do reino do Senhor: amor conjugal, amor pelos filhos e amor à sociedade. O amor conjugal é o principal de todos os amores, porque tem dentro de si o fim do uso maior, que é a propagação da raça humana e, dessa maneira, o reino do Senhor do qual é a sementeira. O amor aos filhos vem em seguida, sendo derivado do amor conjugal; e depois vem o amor à sociedade"

(AC 2039).

Neste texto, vemos três expressões do amor ao Senhor. A mais elevada é o amor conjugal, porque é a recepção íntima e recíproca do próprio amor do Senhor. Desse amor, o mais sublime de todos, nasce o amor aos filhos, que visa à proteção e à educação daqueles que o Senhor criou para suprir o Seu céu, constituído pela raça humana. O último nesta série é o amor mútuo, que implica em amar o bem nos outros porque esse bem é o Senhor, como Ele é recebido pelo ser humano.
O amor conjugal é o supremo de todos os amores humanos porque ele é o céu mesmo. O céu não é um lugar apenas - é um estado da mente ou uma conjunção íntima de bem e verdade. O amor conjugal, que só pode ser alcançado pela vida de regeneração, é essa conjunção de bem e verdade que se chama céu.
O amor aos filhos nasce do amor conjugal porque todo amor quer dar frutos; no fruto está a semente que conduz o seu uso. Por conseguinte, o amor maior tem dentro de si o desejo de procriar filhos para perpetuar e aperfeiçoar o céu.
Esses dois amores, o amor conjugal e o amor pelos filhos, foram inscritos por Deus nas almas de todo ser humano (Am.Con 402). E como estão nas almas, eles fazem um esforço para se manifestarem no corpo. Nesse sentido, nessa intenção de se manifestar no corpo, esses amores são idênticos tanto nos indivíduos bons quanto nos maus. Mas o fato é que o amor conjugal e o amor pelos filhos não terminam no corpo. Eles precisam subir do corpo para a mente racional, onde se tornarão verdadeiramente humanos. A mente racional do homem é que faz a qualidade do amor, tornando-o agradável, se conforme a ordem, ou nocivo, se contrário à ordem. O amor está dentro da ordem quando considera o seu uso.
Na alma, o amor conjugal é um esforço inconsciente e constante de estabelecer um estado celeste dentro do homem. No corpo, o amor conjugal é sentido como o amor sexual. Então, é a mente racional que, coordenando o amor, transforma-o num amor casto entre o homem e uma mulher para regenerá-los, a ambos, juntamente.
Por outro lado, o amor pelos filhos, que nasce do amor conjugal, está presente nas almas humanas como um esforço inconsciente de gerar descendência. Esse esforço é comum e o mesmo nas almas de todos os indivíduos. No corpo, o amor aos filhos é o que se chama "storge", que também parece ser o mesmo tanto nos bons quanto nos maus indivíduos (VRC 431). Portanto, é a mente racional, que está no meio do caminho entre a alma e o corpo, que faz o amor pelos filhos se tornar um amor natural ou espiritual.
Esse amor aos filhos, quando é espiritual, considera o uso dos filhos. Busca sua proteção e educação tendo em vista o uso para o qual os filhos foram criados. Se, porém, nosso amor aos filhos fica centrado no amor mesmo, nós os amaremos apenas porque eles podem promover nossas ambições e refletir nossas características pessoais. Nós os amaremos porque eles complementam e aperfeiçoam nosso ego, ou porque realizam nossas cobiças frustradas, ou porque refletem nossa inteligência e capacidade.
O problema dessa qualidade egoística do amor é que, quando os filhos deixam de responder às nossas pretensões, quando eles deixam de cumprir nossos objetivos egoísticos, então a natureza má desse amor se manifesta - e se transforma num esforço de competir, evitar e até destruir os filhos. Por esta razão, devemos ter como princípio a verdade de que o amor de si não deve interferir de forma alguma com a lei da progenitura no casamento (AC 2039).
No mundo espiritual, Swedenborg encontrou muitos exemplos de amor natural e espiritual pelos filhos. Ele escreveu: "Vi pais no mundo espiritual que olhavam com ódio e como se fossem fúrias para crianças que se lhes apresentavam à vista, e até com uma ferocidade tal que eles as teriam matado, se o pudessem; mas quando se lhes diziam, por artifício, que eram seus próprios filhos, imediatamente seu furor e sua ferocidade cessavam, e eles os amavam perdidamente" (AmCon 407). "Foi-me mostrado também que alguns se gloriavam no grande número de filhos, e que levavam os filhos consigo aonde quer que fossem... Mas foi dito também que os brutos, até os piores, todos têm amor para com seus filhos, e que isto não é sinal de que exista algum bem neles" (AC 1272).
É um fato bem conhecido que todo amor contém em si sua própria sabedoria. Daí se segue que, na medida em que desejarmos educar nossos filhos para um uso genuíno, na mesma medida o Senhor nos dará sabedoria para realizar isso. Os pais representam o Senhor diante dos filhos; e aí está a grande responsabilidade, que é a de serem dignos dessa confiança através de suas vidas, uma vez que as crianças são profundamente influenciadas pelo exemplo, mais do que pela instrução. Nada há de mais importante para influenciá-las do que a esfera de amor conjugal, de amor ao Senhor e de confiança em Sua Divina Providência.
O hábito familiar de cultuar ao Senhor implanta nas crianças relíquias poderosas. E quando chegar a ocasião em que eles transferem sua confiança infantil que depositam nos pais para o Senhor, eles devem ter recebido a instrução de que existe uma Lei Divina, Lei que é suprema, acima dos homens. e que não pode ser infringida sem conseqüências infelizes.
Todo membro da Nova Igreja deve viver na esfera do amor conjugal, não importa se ele encontrou ou não seu par conjugal nesta vida. Isto é assunto da Divina Providência. A esfera de amor conjugal pode existir e existe potencialmente no amor que a pessoa cultiva pelo casamento como instituição sagrada para o uso de um céu composto pelo gênero humano; pelo casamento entre o amor e a sabedoria em cada um e entre duas pessoas de sexos opostos, a ponto de serem uma só. E dentro dessa esfera de amor conjugal, que se aperfeiçoa e marcha passo a passo com a regeneração, está o amor aos filhos. Com quem não tem seus próprios filhos, esse amor se manifesta no amor às crianças em geral, pelo apoio à preservação e à educação delas, pelo esforço de promover tudo o que se pode fazer em prol das instituições que protegem nossas crianças e jovens.
Na Palavra, vimos a história de Hannah; ela fez um voto ao Senhor: se Ele lhe desse um filho, ela o consagraria ao serviço do Senhor. E assim ela fez, entregando Samuel ao Senhor.
O espírito com que Hannah ofereceu seu filho a Deus é a imagem do amor espiritual aos filhos - um amor que quer subordinar o orgulho da posse ao amor do uso. Hannah abriu mão de ter Samuel para que este fosse deixado sob as guardas de Eli, o sumo sacerdote do Senhor.
Ora, Eli representa o bem e a verdade Divinos que instruem em toda educação para o uso. Como pais, devemos fazer também como Hannah, e dedicar nossos filhos a uma esfera de bem e verdade ao serviço do Senhor, isto é, conduzi-los sob a vigilância do Bem e Verdade da Palavra. Dessa forma, compreenderemos que é esse bem e essa verdade que guiam nossos filhos ao reconhecimento do Senhor.
Visto que o amor conjugal e o amor dos filhos são amores interiormente ligados (AmCon 385), segue-se um não pode existir sem o outro, assim como as necessidades do marido e da esposa são intimamente relacionadas com as exigências da família. As esferas de amor mútuo são interligadas com a afeição dos pais e a resposta positiva dos filhos, porque o amor conjugal é a forma mais elevada de amor ao Senhor, e a maior expressão do amor conjugal se realiza na procriação, na proteção e na educação dos filhos.
Muitos sacrifícios pessoais e muita renúncia são necessários para cumprirmos nossas obrigações nesse uso. Há tantas exigências de nosso tempo, nossa energia, nossa paciência, compreensão, entendimento, carinho etc., que, muitas vezes, vemos que elas achamos que elas superam nossa capacidade. E há ocasiões em que o marido e a esposa precisam lutar com toda coragem que o Senhor lhes deu para descobrirem um pouco de ânimo e alguma felicidade em cada um dos sucessivos estados, para não se deixarem abater pela dureza desses aparentes sacrifícios.
Mas, como acontece sempre, com todo uso que é cumprido vem o contentamento íntimo; e é aí que as pessoas podem encontrar a coragem e a inspiração para continuarem a caminhada. Só deixamos de encontrar esse contentamento e esse deleite se nos deixarmos levar pela insatisfação e pela falta de confiança na Divina Providência. E todavia, se refletirmos, veremos que mesmo a adversidade pode-nos servir como um meio poderoso de nos aproximarmos mais, o marido da esposa e vice-versa, e cada um de nós do Senhor, em nosso amor e confiança n`Ele.
Não há deleite maior do que esse que se associa ao amor aos filhos. E, o que é interessante e de acordo com a sabedoria Divina, o amor aumenta em relação aos netos. Porque os anjos cercam continuamente as crianças com uma esfera de inocência que pode ser sentida pelos pais. A afeição infantil, que é sem restrições, a completa dependência e a completa confiança que eles têm em relação aos pais, a agradável sinceridade com que exprimem seus pensamentos, servem como uma inspiração que nos faz voltarmo-nos para nosso Pai Celestial. "Em verdade, em verdade vos digo, qualquer que não receber o reino do céu como menino, de maneira nenhuma entrará nele".
E quando as crianças crescem, o amor aos filhos não cessa. Porque, assim como o amor conjugal aumenta em perfeição por toda a eternidade, o amor aos filhos se aprofunda cada vez mais. Esta é a razão pela qual os anjos celestes, por causa de sua vontade de serem conduzidos em tudo pelo Senhor, têm o amor mais terno pelos filhos. Por isso o Senhor nos ordenou: "Deixai vir a Mim as criancinhas, e não as impeçais, porque das tais é o reino de Deus... E, tomando-as em Seus braços, impôs-lhes as mãos, e as abençoou". Amém.


Lições: I Samuel 1 a 3, partes
Mateus 18:1-14
C.L. 405